Como advogados que lidam com divórcios e pais separados estão encarando o distanciamento, os acordos de guarda e a pensão durante a crise da covid-19.
Brittany Wong
05/30/2020
TAMO JUNTO
O coparenting já envolve muitos desafios sob circunstâncias normais. Mas tentar manter uma dinâmica de parentalidade sadia com seu ex durante uma pandemia global é duplamente difícil.
Stephanie Sinclair sabe por experiência própria. A escritora, que vive em um subúrbio de Phoenix, Arizona, tem dois filhos, de 12 e 9 anos, com seu ex. Quando a situação com o coronavírus começou a se complicar, no início de março, ela e seu ex tiveram ideias totalmente distintas sobre distanciamento social.
Stephanie Sinclair sabe por experiência própria. A escritora, que vive em um subúrbio de Phoenix, Arizona, tem dois filhos, de 12 e 9 anos, com seu ex. Quando a situação com o coronavírus começou a se complicar, no início de março, ela e seu ex tiveram ideias totalmente distintas sobre distanciamento social.
“Não foi fácil convencer meu ex a levar isso a sério”, ela comentou. “Ele achava que estava tudo sendo tremendamente exagerado. Tinha até levado as crianças a um parque superlotado. E ainda os estava levando à igreja, mesmo depois de o CDC e o governo americano terem recomendado o distanciamento social.”
Desde então, felizmente, a igreja passou a promover os cultos online. Sinclair, que tem a guarda conjunta dos filhos (ela e seu ex se alternam cuidando dos filhos por uma semana cada um, fazendo a troca toda segunda-feira) está levando o coparenting adiante da melhor maneira que consegue.
“Por sorte, nós dois trabalhamos com tecnologia, então estamos conseguindo trabalhar de casa e ficar com as crianças em casa durante a quarentena”, diz. “Neste momento, acho que temos que fazer o melhor que pudermos, só isso. Se a pessoa com quem você coparenta não é tão atenta para o perigo do vírus quanto você, isso é frustrante. Pessoalmente, venho tentando fazer minha parte e informar meus filhos, sem lhes meter medo.”
Sinclair tem a mentalidade correta na visão do advogado de divórcios Randall Kessler, de Atlanta, autor de “Divorce: Protect Yourself, Your Kids And Your Future”.
“Comporte-se bem, porque mais adiante você pode ser julgado pelo modo como lidou com esta situação”- RANDALL KESSLER, ADVOGADO DE DIVÓRCIOS EM ATLANTA
“Neste momento você precisa fazer todo o possível para ser compreensivo e flexível, adaptando-se ao que a situação exige”, ele disse ao HuffPost. “Já estamos vendo casos de interferência no tempo que os pais têm com os filhos: muitas vezes a pessoa que tem a guarda, que está no controle, não confia no outro para cuidar bem dos seus filhos e por essa razão não vem permitindo as visitas.”
E nada disso pode ser litigado no momento, destaca Kessler: os tribunais estão fechados.
“É por isso que volto à minha declaração anterior: comporte-se bem, porque mais adiante você pode ser julgado pelo modo como lidou com esta situação.”
“Comporte-se bem” foi a recomendação de todos os advogados de divórcio que consultamos. Mas se você divide o cuidado de seus filhos com o outro genitor deles, é provável que ainda tenha muitas dúvidas. Os acordos atuais de guarda dos filhos precisam ser seguidos à risca (mesmo que seu ex ache que eles estão com sintomas de covid-19)? Como fica a pensão alimentícia se um de vocês perdeu o trabalho? É recomendável colocar qualquer mudança no acordo de guarda por escrito?
A seguir, especialistas legais (que também praticam o coparenting) compartilham algumas dicas sobre a coparentalidade durante esta crise global.
Seja flexível
O momento atual é um território desconhecido para os pais e advogados, disse Alison L. Patton, advogada de família e mediadora, de San Diego. As rotinas foram para o espaço, praticamente da noite para o dia. As salas de aula das crianças agora estão em casa. Alguns pais estão desempregados, outros estão trabalhando de casa, e os que atuam em áreas como a saúde ou outros serviços essenciais estão encarando turnos de trabalho longos e imprevisíveis. Diante dessa turbulência toda, é ainda mais importante tratar seu ex com gentileza, aconselhou Patton.
“A não ser que você esteja lidando com um ex altamente conflitado, que precisa de regras e limites muito claros, o melhor durante a pandemia de covid-19 é se pautar pela flexibilidade e a cooperação, pelo bem das crianças e de sua própria sanidade mental”, diz Patton.
Agora não é o momento de brigar por causa de coisas pequenas ou repisar conflitos antigos.
“A maioria das crianças já está ansiosa e inquieta”, explica. “Se seus pais resolverem seus problemas e agirem como uma equipe unida, isso fará uma diferença positiva em como eles vão superar esta crise.”
Disponha-se a modificar a pensão alimentícia das crianças no caso de um dos pais ficar sem trabalho
Erin Levine, fundadora do site de assistência jurídica Hello Divorce, disse que muitos pais andam modificando seus acordos de pensão alimentícia devido à perda de emprego que atinge muitas pessoas. Se isso é algo que você precisa fazer, coloque por escrito qualquer acordo que você e seu ex fecharem por conta própria. Se não conseguirem chegar a um acordo, Levine aconselhou registrar uma moção junto a um tribunal para preservar o direito de modificar retroativamente o valor da pensão que você está pagando, a partir do momento em que você perdeu sua renda ou ela caiu.
Se você precisar ter essa discussão com seu ex, aborde o assunto com a maior boa vontade possível.
“Meu maior conselho é ser franco e adotar um tom de consideração especial quando estiver tendo discussões difíceis com seu ex”,aconselhou Levine. “Estamos todos passando por dificuldades no momento. Estamos todos tentando fazer o melhor possível. Quanto mais transparente e empático você puder ser, melhor será para todos.”
Pense duas ou até três vezes antes de enviar aquela mensagem raivosa
Kessler aconselha: talvez seja melhor não mandar aquela mensagem furiosa sobre a viagem que seu ex fez bem antes da situação do vírus ficar séria em seu Estado.
“Pense em como você exprime as coisas, como elas serão entendidas, como serão preservadas para litígios futuros”, diz o advogado. “Por mais que você possa ter razão, a outra pessoa também está sofrendo. Todos estamos. O medo do desconhecido causa estresse. Neste momento, a pessoa com quem você optou por ter um filho está precisando de sua ajuda e compreensão.”
Seja compreensivo em relação aos horários de seu ex
A professora de inglês Katie Mitchell tem dois filhos, de 7 e 10 anos, que vivem com ela durante o ano letivo e vão para a casa do pai em fins de semana alternados. Desde a chegada do coronavírus, eles mudaram um pouco a rotina: os pais mantiveram a rotina de ficar com os filhos em fins de semana alternados, mas estão dividindo igualmente os dias úteis que passam com seus filhos.
“Isso me dá a quinta e sexta-feira livres para colocar meu trabalho em dia, o que é realmente necessário para mim”, diz Mitchell, que vive no norte da Geórgia. “Essa flexibilidade vem sendo fundamental. Não é fácil trabalhar em casa e também supervisionar os estudos das crianças em casa. Com esse acordo, cada um de nós tem dois ou três dias por semana sem filhos para poder colocar nosso trabalho em dia, e as crianças não ficam muito tempo longe de nenhum de nós dois.”
Coloque por escrito qualquer coisa que mude no acordo de guarda de seus filhos
Como a vida profissional de muitas pessoas virou do avesso, alguns ex vêm concordando em modificar um pouco os arranjos previstos em seus acordos de guarda dos filhos. Se vocês estão modificando seu acordo de guarda, é uma boa ideia colocar isso por escrito, especialmente se você desconfiar que seu ex possa querer se aproveitar das modificações depois que a pandemia terminar.
“Eu recomendaria você pedir a seu mediador ou advogado para redigir uma estipulação simples declarando que as modificações adotadas durante a pandemia não representam um precedente e que têm prazo para terminar”, aconselha Patton. “Todo o mundo pode assinar esse documento agora, e ele será registrado quando os tribunais reabrirem. Ando fazendo isso para clientes que estão adotando mudanças movidas pelo bom senso e o desejo de cooperar, mas querem ter a certeza de que, quando a pandemia terminar, não vão enfrentar uma briga na justiça para voltarem para o esquema anterior.”
Se você e seu ex estiverem em desacordo sobre quem deve ficar com as crianças agora, sigam os termos definidos judicialmente. Mas se um de vocês contrair a covid-19, usem o bom senso
A advogada familiar Rebecca Long Okura, de Salt Lake City, contou que ouviu muitos pais perguntarem se podem se recusar a mandar seus filhos para a casa do outro pai neste momento (por exemplo, se estiverem preocupados com as práticas de distanciamento social seguidas na casa do outro).
“A resposta simples é que os pais precisam obedecer os termos definidos pelo juiz”, ela disse. “Mas os tribunais não ignoram o fato de que em alguns casos, obedecer a esses termos pode resultar em risco para os filhos. A maioria dos tribunais não está podendo julgar processos desse tipo neste momento, porque o sistema judiciário ainda está tentando formular sua própria resposta ao coronavírus.”
Isto dito, se você ou seu ex tiverem sido expostos ao covid-19, ajam de modo racional, mesmo que isso contrarie o acordo de guarda de seus filhos.
“Ninguém sabe o que os juízes vão dizer quando pais se recusarem a obedecer as ordens judiciais quando a situação é de alto risco na casa do outro pai ou há uma pessoa contaminada vivendo na casa. Mas acho que os juízes não serão intransigentes nesses casos de risco”, diz Long Okura.
Patton aconselhou: não corra o risco de expor seus filhos ao covid-19 só para seguir à risca o acordo de guarda.
“Se você e seus filhos tiverem sido expostos ao vírus, trate seu ex com consideração, compartilhe a informação com ele e, se possível, fique com as crianças em casa até ter a certeza de que eles não adoeceram nem são portadores do vírus”, diz ela.
Em tempos de crise como estes, abuse da comunicação com seu ex
Lindsey Light, professora universitária e mãe de filhos de 8 e 6 anos, geralmente está de acordo com seu ex em questões que dizem respeito à criação dos filhos. A mesma coisa se aplica agora: seu ex tem pai muito doente e avó ainda viva, de modo que entende bem a importância do distanciamento social. Ambos reconhecem a importância da comunicação constante entre as duas casas nestes tempos altamente estressantes.
“Trocamos mensagens de texto frequentes, e as crianças sempre puderam nos telefonar ou falar com a gente no FaceTime quando e quanto quisessem”, ela diz. “Eu encaminho a ele as mensagens que chegam da escola e até lhe mando uma cópia do horário que seguimos em minha casa. Também estamos de acordo quanto à importância de não assustar as crianças, falando do vírus o tempo todo ou falando disso com detalhes que são impróprios para a idade deles.”
Façam concessões agora e deixem para brigar mais para frente
Segundo Kessler, todos os advogados de família estão aconselhando seus clientes a fazer concessões, ser flexíveis, passar por este momento sem brigas e deixar as discussões para o futuro, se forem absolutamente necessárias.
“Pessoalmente, acho que a situação está evoluindo tão rapidamente que não há tempo para redigir um documento completo, negociado e memorializado sobre isso”, ele opinou. “Futuramente é possível que haja ‘cláusulas do corona’, prevendo o que deve ser feito em situações como estas em que não há escola, o esquema das férias entra em ação e dura até o final da pandemia ou outra situação. Mas neste momento, se os pais realmente precisam de advogados para brigar sobre o que fazer, eles estão com problemas. O momento agora é de cooperação.”
*Este texto foi originalmente publicado no HuffPost US e traduzido do inglês.
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