A morte bárbara de George Floyd em Minnesota, nos Estados Unidos, e as consequentes revoltas populares ao redor do mundo nos mostraram algo que, embora neguemos, também assola o Brasil: o racismo estrutural impregnado na sociedade.
Com chances 2,7 maiores de serem vítimas de homicídios em relação a brancos, a situação dos homens negros no país só não é pior do que a das mulheres negras brasileiras, maiores vítimas das estruturas de exclusão racial construídas ao longo de séculos de escravidão.
Com chances 2,7 maiores de serem vítimas de homicídios em relação a brancos, a situação dos homens negros no país só não é pior do que a das mulheres negras brasileiras, maiores vítimas das estruturas de exclusão racial construídas ao longo de séculos de escravidão.
A situação de pessoas na interseção raça negra, gênero feminino e em condição de vulnerabilidade socioeconômica chama a atenção e demanda ações urgentes.
Nesta linha, acadêmicos, formuladores de políticas públicas e de iniciativas que busquem mitigar vulnerabilidades têm dado especial atenção a este segmento. Insere-se nessa perspectiva o projeto Meninas na Ciência de Dados, capitaneado pela professora Karla Esquerre, da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
O programa realiza ações voltadas à formação de estudantes do gênero feminino de cinco escolas públicas soteropolitanas, através do ensino da estatística com base em problemas vinculados à realidade da comunidade onde vivem.
A população-alvo do projeto, meninas, majoritariamente negras, oriundas de comunidades carentes, foi escolhida por ser minoria na área científica, nas universidades e em posições de destaque na sociedade. A princípio, o projeto busca fortalecer as capacidades socioemocionais das participantes, com impactos positivos no desempenho acadêmico e diminuição da evasão escolar.
A longo prazo, busca-se diminuir assimetrias provenientes de suas condições de vulnerabilidade, fazendo com que elas tenham melhores oportunidades no mercado de trabalho e concorram a vagas nas universidades com maiores chances de aprovação.
O projeto teve início no primeiro semestre de 2019, por meio da aproximação da equipe da UFBA com as cinco escolas públicas contempladas. Nessa ocasião, a equipe pôde apresentar o ferramental inicial da estatística e análise de dados, capacitando as alunas a trabalharem em computadores e laboratórios de suas escolas.
Cerca de 500 estudantes participaram dessa etapa, das quais 27 foram selecionadas para a etapa seguinte, que ocorreu na UFBA, de forma a aproximar as estudantes do ambiente universitário. Práticas lúdicas pautaram essa fase, com o ensino de programação, práticas laboratoriais, elaboração de gráficos e de projetos de pesquisa.
Alguns resultados positivos já são visíveis. Após um ano de participação no projeto, as meninas, que antes se consideravam tristes e inúteis, passaram a se perceber como mulheres competentes e empoderadas, além de vislumbrarem carreiras até então desconhecidas por elas, como a de Engenharia Química, por exemplo.
O leque de interesses das participantes se expandiu, o que, por si só, já comprova a importância e relevância do projeto. Um protocolo de medição do programa, realizado em parceria com o Insper Metricis, permitirá a avaliação de impacto, permitindo expansão e reaplicação da iniciativa.
Projetos como o Meninas na Ciência de Dados, que contam com atores sociais em sua formulação e implementação, criam novas formas de alianças capazes de responder a questões locais de maneira inovadora, gerando valor não somente para os envolvidos, mas para a sociedade como um todo, já que lançam mão de novas soluções para começar a enfrentar problemas de origem complexa arraigados em nossa História.
Isabelle Daros Pignot é mestranda em Políticas Públicas no Insper.
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