A partilha de bens na ocasião do divórcio não necessariamente contará com a manifestação do Ministério Público quando se trata de um processo judicial, porque, em tese, essa questão diz mais respeito aos interesses dos pais (teoricamente maiores e capazes) do que aos das crianças que podem estar envolvidas.
No entanto, seja junto à Promotoria de Justiça ou no Direito Familiar, vemos que esse é um assunto que gera muitas dúvidas. Algumas pessoas sequer sabem qual é o regime de bens pelo qual se casaram, mas, no momento do divórcio, precisam buscar a informação para garantir que seus direitos sejam resguardados.
No entanto, seja junto à Promotoria de Justiça ou no Direito Familiar, vemos que esse é um assunto que gera muitas dúvidas. Algumas pessoas sequer sabem qual é o regime de bens pelo qual se casaram, mas, no momento do divórcio, precisam buscar a informação para garantir que seus direitos sejam resguardados.
Neste artigo, separamos algumas dúvidas que são comuns relacionadas à partilha de bens no divórcio e as respondemos. Confira!
1) É obrigatório realizar a partilha na ocasião do divórcio?
Se o casal não deseja fazer a partilha, existe a possibilidade de se divorciar, deixando a partilha de bens para outro momento. Mas, deve restar claro que isso influenciará o regime de bens de um futuro relacionamento, devendo ser aplicado o regime da separação obrigatória – ao menos até que se realize a partilha do casamento anterior.
Apesar de ser possível deixar a partilha para depois, a recomendação da maioria dos profissionais é de que ela já aconteça junto com o divórcio, para evitar complicações futuras.
2) Meu companheiro/a era casado/a sob o regime da comunhão parcial de bens, mas está separado de fato há 3 anos e adquiriu um imóvel nesse período. Vai precisar partilhar na ocasião do divórcio dele/a?
Há entendimento consolidado no sentido de que os efeitos do regime de bens do casamento cessam com a separação de fato[1]. Assim, o ex-cônjuge não teria direitos sobre o patrimônio recebido ou adquirido nesse período em que já estavam separados de fato, mesmo que o divórcio não tenha sido decretado oficialmente.
Isso porque, ocorrida a separação de fato, cada um dos cônjuges passa a agir isoladamente na prática do esforço para adquirir patrimônio e não faria sentido, pois, exigir a partilha de bens adquiridos durante a separação de fato. Além disso, busca-se evitar o enriquecimento ilícito.
É preciso lembrar, ainda, que quem está separado de fato pode constituir nova união (ainda que não tenha formalizado a separação anterior – conforme a situação apresentada) e, se a separação de fato não ensejar o fim do regime de bens da união anterior, há grandes chances de se causar uma confusão patrimonial, prejudicando os envolvidos.
3) Casa construída pelo casal no terreno dos sogros, como fica?
Sendo o regime da comunhão parcial, por exemplo, e se a casa tiver sido construída durante a união, com esforço comum, ela poderá ser partilhada, ainda que o terreno onde se encontre não seja de propriedade do casal. É uma situação difícil de comprovar e de regularizar na prática, por isso, o juízo pode eventualmente determinar uma indenização a ser paga por uma das partes, dependendo das circunstâncias do caso.
Em que pese as construções ou melhorias pertençam ao dono do bem, tal entendimento não inviabiliza a divisão de direitos sobre o imóvel construído pelos ex-cônjuges.
4) Como fica a partilha de um imóvel financiado?
Considerando o regime da comunhão parcial de bens (que é o mais comum) ou o da comunhão universal de bens (uma só massa patrimonial, em tese), se as partes começaram a adquirir um bem, por meio de financiamento, e se divorciam antes de terminarem as prestações, será preciso verificar o valor do bem (valor de mercado) e diminuir dele o valor das parcelas que ainda faltam. A diferença será o valor a ser partilhado pelo casal. Mas, sempre existe a possibilidade de realizarem um acordo, especialmente se tiverem a intenção de vender o imóvel e partilhar a quantia, ou se um deles ainda quiser permanecer com o bem.
Caso ainda haja parcelas em aberto, essa “dívida” se mantém. O financiamento permanecerá em nome de ambos, isso porque o divórcio e a partilha não têm o condão de alterar o contrato realizado com a instituição financeira. Caso somente um dos ex-cônjuges assuma as parcelas, terá direito de regresso em relação ao outro. Ou seja, poderá cobrar o valor que desembolsou. Caso um dos ex-cônjuges assuma o pagamento das prestações para ficar com a posse e propriedade do imóvel, isso deverá ser analisado para constar na partilha.
5) O que fazer quando um bem não constou/ foi ocultado da partilha durante o processo de divórcio?
Se o divórcio já foi decretado e o processo foi finalizado, uma alternativa seria ingressar com pedido de sobrepartilha.
A sobrepartilha é utilizada em caso de desconhecimento de uma das partes a respeito de determinado bem no momento da partilha, seja por má-fé da outra parte ou porque esse bem estava em lugar distante de onde o casal se separou. É válida nas ações de divórcio em que a separação e a divisão dos bens do casal já foram devidamente concluídas, mas, posteriormente, se descobre que a outra parte possuía bens que não entraram na divisão.
6) O outro cônjuge tem direito a bens recebidos a título de doação na ocasião do divórcio?
Se os bens, ou valores, foram recebidos a título de doação no regime da comunhão parcial de bens, eles não integrarão o patrimônio comum e não serão partilhados. Falamos sobre isso aqui: “Regime da comunhão parcial de bens – parte 1” (clique aqui).
Aí caberá àquele que recebeu a doação identificar a quantia e, se eventualmente adquirir algo com este valor, deixar claro que o bem está sendo adquirido com valores recebidos a título de doação.
No regime da comunhão universal de bens, por exemplo, será necessário verificar se há cláusula de incomunicabilidade na doação. Falamos sobre isso aqui: “Regime da comunhão universal de bens – parte 2” (clique aqui).
7) Como acontece a partilha de bens no caso de previdência fechada?
Acerca da previdência fechada, há entendimento do STJ (Superior Tribunal de Justiça)[2], no sentido de que ela faria parte das rendas excluídas dos bens comuns (art. 1659 do CC), tendo em vista que se enquadra em conceito semelhante a um benefício que não poderia ser desfrutado durante a relação.
Isso porque é um patrimônio “personalíssimo”, que possui característica de ter por objetivo ser utilizado na velhice – como um direito do trabalhador – e no qual o participante tem como determinar quem terá direito a ele em caso de seu falecimento. O mesmo não acontece no planos abertos, pois possuem maior liquidez e o saldo pode ser resgatado mais facilmente (são equiparados a investimentos).
Pode haver posicionamentos contrários, no sentido de que a previdência não deve ser considerada como “pecúlio”, por ser uma aplicação financeira, ao menos antes de se atingir a idade estabelecida no plano. Acreditamos, porém, que a maioria segue o STJ.
8) Pode-se exigir o pagamento de aluguel do cônjuge que permaneceu residindo no imóvel, até que se realize a partilha?
Se existe um bem que ainda não foi partilhado e um dos ex-cônjuges permanece residindo no local, há quem entenda que caberia o pagamento de aluguel até que se efetive a partilha, mas isso é algo que será analisado caso a caso.
É que há decisão do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que àquele que não usufruir o bem, caberá indenização, que poderá ser paga mediante pagamento de valor correspondente à metade do valor estimado do aluguel do imóvel, por exemplo [3].
Se você tem outras dúvidas sobre o assunto, pode entrar em contato conosco!
Arethusa Baroni
Flávia Kirilos Beckert Cabral
Laura Roncaglio de Carvalho
[1] REsp nº 40.785, RJ, Relator Ministro Menezes Direito, DJ de 05.06.2000; REsp nº 67.678, RS, Ministro Nilson Naves, DJ de 14.08.2000; REsp nº 140.694, DF, Relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 15.12.1997.
[2] RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. UNIÃO ESTÁVEL. REGIME DE BENS. COMUNHÃO PARCIAL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. MODALIDADE FECHADA. CONTINGÊNCIAS FUTURAS. PARTILHA. ART. 1.659, VII, DO CC/2002. BENEFÍCIO EXCLUÍDO. MEAÇÃO DE DÍVIDA. POSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. FUNDAMENTO AUTÔNOMO. 1. Cinge-se a controvérsia a identificar se o benefício de previdência privada fechada está incluído dentro no rol das exceções do art. 1.659, VII, do CC/2002 e, portanto, é verba excluída da partilha em virtude da dissolução de união estável, que observa, em regra, o regime da comunhão parcial dos bens. 2. A previdência privada possibilita a constituição de reservas para contingências futuras e incertas da vida por meio de entidades organizadas de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social. 3. As entidades fechadas de previdência complementar, sem fins lucrativos, disponibilizam os planos de benefícios de natureza previdenciária apenas aos empregados ou grupo de empresas aos quais estão atrelados e não se confundem com a relação laboral (art. 458, § 2º, VI, da CLT). 4. O artigo 1.659, inciso VII, do CC/2002 expressamente exclui da comunhão de bens as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes, como, por analogia, é o caso da previdência complementar fechada. 5. O equilíbrio financeiro e atuarial é princípio nuclear da previdência complementar fechada, motivo pelo qual permitir o resgate antecipado de renda capitalizada, o que em tese não é possível à luz das normas previdenciárias e estatutárias, em razão do regime de casamento, representaria um novo parâmetro para a realização de cálculo já extremamente complexo e desequilibraria todo o sistema, lesionando participantes e beneficiários, terceiros de boa-fé, que assinaram previamente o contrato de um fundo sem tal previsão. 6. Na partilha, comunicam-se não apenas o patrimônio líquido, mas também as dívidas e os encargos existentes até o momento da separação de fato. 7. Rever a premissa de falta de provas aptas a considerar que os empréstimos beneficiaram a família, demanda o revolvimento do acervo fático probatório dos autos, o que atrai o óbice da Súmula nº 7 deste Superior Tribunal. 8. Recurso especial não provido. (REsp 1477937/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/04/2017, DJe 20/06/2017).
[3] DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. AÇÃO DE ARBITRAMENTO E COBRANÇA DE ALUGUEIS, EM DECORRÊNCIA DE USO EXCLUSIVO DE IMÓVEL NÃO PARTILHADO. INDENIZAÇÃO CORRESPONDENTE A METADE DO VALOR DA RENDA DO ALUGUEL APURADO, DIANTE DA FRUIÇÃO EXCLUSIVA DO BEM COMUM POR UM DOS CONDÔMINOS. CONDOMÍNIO, ADEMAIS, QUE FOI EXTINTO POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL TRANSITADA EM JULGADO, TENDO SIDO DETERMINADA A ALIENAÇÃO JUDICIAL DO IMÓVEL. INDENIZAÇÃO, TODAVIA, DEVIDA A PARTIR DA CITAÇÃO NA AÇÃO DE ARBITRAMENTO. (REsp 1375271/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/09/2017, DJe 02/10/2017).
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