Anuary Saidi Salvando as crianças mais pobres da Tanzânia
Anuary Saidi, que sofre de diarreia viral, com sua mãe Mariam. Foto: Kristin Palitza/IPS

Dar es Salaam, Tanzânia, 20/12/2012 – Meio dormindo, Anuary jaz exausto em sua cama no hospital Amana, na capital da Tanzânia. Sua mãe, Mariam Saidi, está sentada na beira de seu colchão, com o olhar perdido na janela. Quando o levou ao hospital, um dia antes, o menino tinha muita febre, sofria de diarreia viral, estava severamente desidratado e havia perdido a consciência. Os médicos salvaram sua vida e agora ele enfrenta uma lenta recuperação.
“A diarreia viral e as infecções respiratórias são muito comuns nas crianças daqui”, disse à IPS o diretor do hospital, Meshack Schimwela. “As duas enfermidades constam entre as principais causas de mortes de meninos e meninas com menos de cinco anos na Tanzânia”, acrescentou.
Para Saidi, mãe solteira que trabalha como cabeleireira no assentamento de Buguruni, nos arredores de Dar el Salaam, a hospitalização de seu filho implica uma grave pressão econômica. Cada dia que passa junto de seu leito é um dia que deixa de ganhar dinheiro. para ela já é difícil chegar ao fim do mês com seu magro salário de US$ 4 por dia que, explica, permitem apenas ter uma refeição por dia. “Só Deus sabe como enfrentaremos isto. É muito difícil”, disse à IPS esta mulher de 21 anos.
A doença de Anuary poderia ter sido prevenida facilmente se ele estivesse imunizado contra o rotavírus, que causa uma diarreia severa comumente chamada de “febre estomacal”. Mas, atualmente a vacina não está disponível através do sistema de saúde pública neste país do leste africano.
A situação é semelhante em muitos outros países do continente. Cerca de 20% das crianças da África – ou uma em cada cinco – não estão , segundo a organização internacional Save the Children. “Sempre são as crianças mais pobres as que não têm acesso a serviços de vacinação. É preciso fazer muito mais para chegar à quinta criança”, disse Kirsten Mathieson, encarregada de pesquisas e políticas sanitárias dessa entidade.
Na Tanzânia, pelo menos, isto poderá mudar logo. Através de cofinanciamento da Aliança Gavi (uma associação público-privada dedicada à imunização e que negocia preços menores de vacinas para os países mais pobres do mundo) o governo poderá integrar vacinas contra o rotavírus e contra o pneumococo ao seu programa público de imunização a partir de janeiro próximo.
“As crianças dos países em desenvolvimento têm 18% mais possibilidades de morrer antes de completar cinco anos” do que os das nações industrializadas, disse à IPS a vice-presidente da Gavi, Helen Evans, para quem “a vacinação pode marcar uma grande diferença”.
Mtagi Kibatala, chefe interina de pediatria do hospital Amana, concorda: “Muitas crianças em nossas alas de pediatria não estariam aqui se tivessem acesso a vacinas contra o rotavírus e o pneumococo”. Vacinar todas as crianças neste país de 885 mil quilômetros quadrados, quase quatro vezes o tamanho da Grã-Bretanha, levará tempo.
Chegar às famílias nômades e às que vivem em áreas rurais ou em ilhas pequenas será essencialmente difícil, disse Kibatala à IPS. Ela prevê que irá demorar “pelo menos um ano” ver uma melhoria na saúde infantil e uma redução da mortalidade.
Outro obstáculo é a severa escassez de trabalhadores do setor no país. cerca de 40% dos postos nos centros de saúde pública estão vagos, segundo o Ministério da Saúde. Sem pessoal suficiente, será difícil dar atenção sanitária a todas as crianças, disse Schimwela. O impacto que as vacinas podem ter sobre a saúde infantil “é muito claro”, acrescentou.
A Tanzânia comprovou uma constante redução na mortalidade infantil desde que começou a imunizar contra a poliomielite, o tétano, a tuberculose e a difteria através de seus sistemas de saúde pública. Em consequência, a mortalidade de menores de cinco anos caiu de 155 em mil nascimentos vivos, em 1990, para 76, em 2010, segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).
Apesar de a introdução da vacina contra o rotavírus chegar tarde para Anuary (teria que ter menos de 15 semanas para que fosse efetiva), milhares de crianças da Tanzânia poderão não só levar vidas mais sãs, mas também mais felizes.
Esse é o caso de Rosemary Julius, de seis semanas. Sua mãe, Janet Julius, está sentada pacientemente em uma cadeira de plástico azul diante da clinica de saúde de Buguruni, abanando-se para aliviar o sufocante calor de dezembro, com a menina no colo. Rosemary será um dos sete bebês escolhidos pelo pessoal da clinica para receber imunização dual contra rotavírus e pneumococo.
Embora oficialmente as vacinas somente estarão disponíveis a partir do próximo mês, o Departamento de Saúde decidiu imunizar um pequeno grupo de bebês para celebrar o lançamento do plano. Janet, uma dona de casa de 22 anos que soube desta oportunidade durante um exame pós-natal, disse estar muito feliz por Rosemary ficar protegida contra a pneumonia e a diarreia viral. “Vi bebês ficarem doentes e morrer. A vacina ajudará minha filha a crescer bem”, disse à IPS.