‘(Des)Encanto’, primeira série de Matt Groening em quase 20 anos, estreia nesta sexta-feira na Netflix
ROCÍO AYUSO
Los Angeles
El País
Matt Groening estava há quase duas décadas sem lançar uma nova série. Os Simpsons não é apenas a mais antiga série de animação da televisão, mas a comédia que está há mais tempo no ar. E Futurama, uma ficção cult lançada em 1999 que terminou definitivamente em 2013, era até agora a produção mais recente criada por este gênio que começou como jornalista e desenhista das tiras de quadrinho de humor Life in Hell. Agora chega (Des)Encanto(Disenchantment em inglês). “Os personagens continuam tendo olhos grandes e a mandíbula superior mais avançada, mas desta vez eles têm queixo! E você não imagina como é difícil desenhá-los”, ri esse criador e consumidor de cultura popular de 64 anos.
Embora em seu estilo a princesa Bean, a personagem principal, seja uma prima distante de Lisa Simpson, as diferenças de (Des)Encanto em relação ao resto do universo de Groening são maiores. A principal é que as aventuras dessa princesa alcoólatra ao lado de um elfo triste e seu demônio pessoal em um reino medieval têm continuidade entre os capítulos, não são episódicas, tornando-as ideais para uma maratona em capítulos de 25 minutos na Netflix, plataforma para a qual foram criadas e onde estreiam nesta sexta-feira, dia 17. Ele está encantado com a mudança. “A Netflix oferece uma nova forma de narrativa sem pausas publicitárias, em que posso contar histórias mais longas. Ao contrário de Os Simpsons e Futurama, em (Des)Encanto há espaço para reduzir o ritmo sem necessidade de ser mordaz, engraçado ou atrevido o tempo todo”, diz o autor ao EL PAÍS.
Entre suas influências para este novo trabalho, Groening cita Italo Calvino, J.R.R. Tolkien, Neil Gaiman, o cinema de Buster Keaton e dos irmãos Fleischer, bem como O Mágico de Oz e Bollywood. Mas ele também menciona os filmes da Disney por suas imperfeições. “É o que mais me interessa em animação, não os grandes filmes perfeitamente acabados, mas as imperfeições de seus esboços”, afirma.Groening mantém o humor e a ironia que caracterizam seu trabalho. “Meu objetivo é chegar àqueles que se ofendem e fazê-los rir. Embora ainda discordemos, se eu os fizer rir considero uma vitória criativa”, diz. Para esses dez episódios promete uma ou outra lágrima no final da temporada. “Bom, talvez seja dizer muito”, ri. E sobre a mordacidade, é claro que nada vai detê-lo. “Sou daqueles que pensam que tudo é político, até o que parece mais inocente. Então espere até a metade da série para tirar suas próprias conclusões.”
Se muitas vezes se comentou e brincou sobre os fatos da vida real que Os Simpsons parecem ter antecipado, como a chegada de Donald Trump à presidência, onde Groening mostrou ter sensibilidade foi precisamente em dar vida a essa série em 1989. Sentiu que havia chegado a hora de conquistar os adultos para o mundo da animação. “Já havia conquistado os mais jovens”, lembra sobre aquele momento de engenho. São cerca de três décadas nas quais se sentiu como quando brincava na infância com os amigos do bairro, com seus soldados de plástico contra seus dinossauros, também de plástico. Uma brincadeira que parece não ter fim à vista. “Com tudo o que a Disney pagou pela Fox, teremos Os Simpsons por um bom tempo”, prevê, confiando também que (Des)Encanto terá um longo futuro.
O MAIOR DEFENSOR DE APU
Nesta era marcada em todos os lugares pelo politicamente correto, o personagem Apu, de Os Simpsons, tornou-se um assunto desconfortável na televisão norte-americana devido ao seu forte sotaque indiano, que muitos consideraram insultante. Mas não o próprio Matt Groening. “Tenho orgulho de tudo o que faço”, disse o autor na época à associação de críticos de televisão de Los Angeles.
Ele não vê nada de ofensivo no personagem, nem quer comentar mais essa questão. Prefere falar sobre seu amor pelo cinema produzido na Índia, na fábrica de Bollywood. Groening é um entusiasta de títulos como Bahubali ou Magadheera, que o ajudaram a colocar em marcha o projeto de (Des)Encanto. “Gosto da falta de cinismo do cinema de Bollywood”, enfatiza um dos autores mais cáusticos da animação atual.
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