Os três estados da região sul aparecem entre os cinco que mais tiveram vítimas de violência doméstica no país, de acordo com o Anuário divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública na última quinta (9).
Considerando o cálculo proporcional entre as mulheres da região, o Rio Grande do Sul é o que mais registrou vítimas no país, com 398 vítimas a cada 100 mil mulheres em 2017. Já Santa Catarina apresentou um aumento, com 368 vítimas a cada 100 mil mulheres no mesmo período.
Atrás do Rio de Janeiro e Maranhão, o Paraná teve 224 vítimas a cada 100 mil mulheres em 2017.
Mas, afinal, o que explica o elo entre os estados do sul a uma mesma realidade de violência contra a mulher?
Motivos da concentração de violência
Não existe uma única justificativa, mas para promotores e juízes da região, as razões vão de aumento das denúncias a melhora na obtenção dos dados de violência doméstica.
“As mulheres e a sociedade estão menos tolerantes com esse tipo de delito”, justifica Gioconda Fianco Pitt, responsável pelo núcleo de violência doméstica na Corregedoria-geral da Justiça, no Rio Grande do Sul.
Com campanhas e atendimento psicológico que une órgãos de municípios, estados e União, quem trabalha com esse tipo de violência afirma que as mulheres confiam mais que serão acompanhadas durante a denúncia.
Mecanismos de denúncia e proteção
Segundo o Conselho Nacional de Justiça, o Rio Grande do Sul expediu 38.664 medidas protetivas de urgência, ou 6,7 a cada 100 mil mulheres, em 2017. Neste caso, o juiz pode exigir um afastamento mínimo entre as mulheres e os filhos do homem acusado de agressão.
No Rio Grande do Sul existem cerca de 20 delegacias especializadas em violência contra mulher. Em Santa Catarina, 31 delegacias; no Paraná, são 21.
Mesmo espalhadas pelos estados, as delegacias especializadas não atingem áreas mais afastadas dos grandes centros.
Para juízes e procuradores da região, a deficiência é suprida por campanhas que divulgam o Disque 180 (contra violência doméstica) e projetos federais. Entre as iniciativas, está o “ônibus lilás”, responsável por levar palestras sobre violência doméstica a municípios rurais, e percorre a região sul desde 2016 em uma parceria entre governo federal e estaduais.
Coleta de dados
“Aumento de casos não significa aumento da violência mas, sim, de notificações”, justifica Patrícia Maria Zimmermann D'Ávila, coordenadora das Delegacias de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso do Estado de Santa Catarina.
No Rio Grande do Sul e Santa Catarina, a secretaria de segurança pública faz o acompanhamento mensal ou semestral de boletins de ocorrência enquadrados na Lei Maria da Penha (lesão corporal causada em ambiente doméstico e familiar). Os dados são divulgados na internet.
No país, o número de vítimas de violência doméstica é ainda maior do que o divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o que pode desfavorecer a região sul.
Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Roraima e Tocantins não disponibilizaram dados específicos sobre o tema ao Anuário. Goiás, Piauí, Rondônia e Sergipe não apresentam o cálculo específico com vítimas mulheres.
Em todo o Brasil, foram registrados 221.238 registros de violência doméstica, ou 606 casos por dia, em 2017, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
País se torna mais violento
Mesmo com o aumento em denúncias, a região ainda tem casos como o de Tatiane Spitzer, 29, morta no início de julho após cair da janela do apartamento que dividia com Luis Felipe Manvailer em Guarapuava, no Paraná. Em um vídeo chocante, ela é agredida pelo então companheiro no estacionamento e também no elevador do prédio.
Especialistas alertam que a violência doméstica é um dos primeiro indícios de casos de feminicídio.
Para a delegada Zimmmerman, casos como esse despertam um novo olhar sobre a realidade da violência doméstica.
“Nós levamos projetos de educação sobre violência doméstica para as escolas, temos grupos de conversa entre mulheres na delegacia e grupo de apoio para homens [em Santa Catarina]. Temos 62 psicólogos da Polícia Civil nas comarcas para acolher vítimas. Melhor a capacitação, melhorar a quantidade e qualidade dos dados”, diz.
“Mas precisamos de um trabalho engajado com todo o aparelhamento estatal, pois a gente só vai conseguir melhorar a estatística quando mudarmos a educação e a percepção das pessoas sobre a violência contra a mulher”, conclui.
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