A feminista defende que feminismo é a luta pela igualdade, para que as pessoas possam protagonizar suas vidas, seus trabalhos
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8 mar 2018
Claudia
Maria Amélia de Almeida Telles, conhecida como Amelinha, militava clandestinamente no PCdoB, em plena ditadura militar (1964-1985), quando se compreendeu feminista. “Militei muitos anos só com homens. Trabalhei na imprensa clandestina e, ali, só trabalhavam homens. Eu sentia falta das mulheres. Percebia a desigualdade dentro e fora do partido”, relatou à CLAUDIA por telefone.
Ao tomar contato com obras como a da ativista e filósofa negra norte-americana Angela Davis, foi solidificando sua posição, entendendo seu lugar no que chama de “coletivo de mulheres que se rebelam frente à discriminação histórica contra elas”. Na mesma época em que a Assembleia Geral da ONU declarou 1975 como o Ano Internacional das Mulheres, Amelinha começou a escrever para o jornal Brasil Mulher, um dos primeiros direcionados às mulheres e feitos por mulheres.
“Vivi muitas lutas em momentos históricos muito distintos. Eu sou de um tempo em que a palavra creche era estigmatizada e que, hoje, é entendida como um direito, graças às feministas”, coloca Amelinha, acrescentando às conquistas a igualdade de direitos solidificada pela Constituição de 1988, o ganho de consciência política entre as mulheres, o aumento das notificações de denúncias de violência.
CLAUDIA: O que é o feminismo para você?
Amelinha Teles: Um movimento político. Um coletivo de mulheres que se rebelam frente à discriminação histórica contra elas. Eu entro nesse coletivo, eu sou uma dessas mulheres e isso muda a minha vida, o meu cotidiano, na medida em que luto para ser uma mulher com autonomia em todos os sentidos, pessoal, econômico, político. Não tem um feminismo, são feminismos, são muitos. É ter direitos sobre meu corpo, minha sexualidade, meu direito de ir e vir, minha opinião. E ser como eu sou.
CLAUDIA: Em que momento você se percebeu feminista?
Amelinha: Me tornei feminista na clandestinidade. Eu me dei conta que era feminista além de comunista. Na organização, militei muitos anos só com homens. Não que não tivessem mulheres na luta contra a ditadura, mas nos núcleos em que eu me encontrava só tinham homens. Sentia falta das mulheres, percebia que havia desigualdades entre homens e mulheres, não só dentro do partido como fora também. As mulheres alvo de violência, salários menores… E comecei a me questionar: “por que isso?” Fui tomando conhecimento do que acontecia no mundo. Que existia uma Angela Davis nos EUA, uma mulher negra, comunista e feminista. Mulheres na Europa falando sobre o feminismo. Mas só em 1975 me tornei publicamente feminista, participei do jornal Brasil Mulher. A ONU declarou o ano de 1975 como o ano da mulher, então o movimento já ganhou uma visibilidade maior. O feminismo hoje é mais falado, mais aceito do que na época em que eu me tornei feminista. Feminismo é uma construção histórica que acontece dentro da sociedade e dentro de nós mesmos. Sempre estamos buscando respostas e formulando perguntas nas relações de um modo geral… Nos anos 1960, e 1970, feminismo era quase um palavrão. Hoje as pessoas dão um sorrisinho de lado. Ou levam na brincadeira, como se não fosse algo sério.
CLAUDIA: Um levantamento realizado pela Abril Inteligência com 1,5 mil leitoras mostra que 25% delas não se identifica com o feminismo. Isso quer dizer que o estigma com a palavra ainda é forte…
Amelinha: Vivemos em uma sociedade extremamente machista, e esse machismo é incorporado por homens e mulheres. Passa-se a ideia de que as desigualdades entre homens e mulheres são naturais, como se a mulher tivesse nascido para ser submissa e o homem para ser poderoso. Isso é visto como natural, mas é uma construção social. Você se rebelar tem um lado prazeroso, que dá orgulho, porque você vai lá e enfrenta. Mas às vezes há um certo comodismo em deixar as coisas como estão porque o preço pode ser alto. Então são vários os fatores pelos quais as mulheres não se assumem como feministas. Porque até os homens deveriam ser feministas. É uma proposta política de igualdade entre homens e mulheres em condições e em direitos. Não quer dizer que você não vá respeitar as diferenças que há entre nós. Não interessa o sexo, interessa a capacidade para que as pessoas possam protagonizar suas próprias vidas, seu trabalho, sua criatividade. Acho que muitas mulheres que não se consideram feministas não tiveram ainda a oportunidade de refletir sobre o próprio cotidiano. Porque basta refletir sobre o seu cotidiano que você se torna feminista.
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