Carta Capital
Carol Castro
4 de dezembro de 2018
Roda formada para a oração antes do jogo. O juiz apita e dá início ao 1º Festival Minas do Toque, em Parelheiros, no extremo sul da capital paulista. Entre um lance e outro, um chute mais forte e a bola passa por cima da rede, direto para fora. Direto para o córrego que cerca o campinho de terra batida. As jogadoras invadem o mato alto e resgatam a bola de dentro do esgoto com a ajuda de um galho improvisado. Cinco minutos depois, o jogo recomeça.
Essas e outras dificuldades do futebol feminino das periferias ganharam as páginas do livro-reportagem em quadrinhos “Minas da Várzea”, que será lançado pela Agência Mural de Jornalismo das Periferias nesta quarta-feira 5. “Essas mulheres continuam jogando apesar de todas as dificuldades, com os campos ruins, superando preconceitos masculinos. É um ato de resistência mesmo”, conta Priscila Pacheco, autora do livro.
Essas e outras dificuldades do futebol feminino das periferias ganharam as páginas do livro-reportagem em quadrinhos “Minas da Várzea”, que será lançado pela Agência Mural de Jornalismo das Periferias nesta quarta-feira 5. “Essas mulheres continuam jogando apesar de todas as dificuldades, com os campos ruins, superando preconceitos masculinos. É um ato de resistência mesmo”, conta Priscila Pacheco, autora do livro.
Futebol feminino na periferia vai, de fato, muito além do esporte. Elas formam uma rede de apoio, afeto e solidariedade. Enquanto algumas mães disputam partidas, seus filhos ficam na torcida, sob os cuidados das colegas que só jogarão a próxima rodada. Fazem um revezamento. “Algumas não tem com quem deixar as crianças, então levam. Outras não querem ficar longe dos filhos naquele tempo do futebol, já que trabalham. É uma maneira de estar mais presente na vida deles”, relata Pacheco. “E é curioso porque elas disseram que muitos maridos não fazem o mesmo. Existe uma diferença no olhar para a família”, completa.
Quando falta dinheiro para a condução de uma delas, a rede de apoio se mobiliza outra vez. Juntam uns trocados e garantem a presença de todas elas. Não é só entre as mulheres retratadas no livro de Pacheco. Parece ser uma união entre todas as jogadoras da várzea. O documentário “Mulheres do Progresso: muito além da várzea”, lançado no início do ano, mostrou a história de quatro mulheres que coordenam times femininos da periferia. E a história se repete – a união para comprar lanches ou para ajudar as parceiras com dificuldades financeiras, compartilhamento de uniformes e chuteiras.
Juntas, em um espaço predominantemente masculino, conseguem superar o machismo. Passaram a responder às provocações de sempre – do tipo “mulher não sabe jogar futebol” – e se impor dentro e fora dos campos. “Antes os outros criticavam, falavam que mulher não sabia jogar. Agora nós demos a volta por cima e mostramos que é diferente”, relatou Raili, uma das personagens do livro.
Nenhuma delas se intimida mais com os organizadores que insistem em colocá-las sempre para jogar nos campeonatos só após as partidas de todos os times masculinos. Até entre as jogadoras de aldeias indígenas – há times masculinos e femininos por lá também. “Jogar futebol ajuda a quebrar esse estereótipo da cultura indígena. Em uma das aldeias, ela me disseram que disputavam campeonatos, mas quem marcava era o pai. Aí ele se mudou para São Vicente e isso acabou”, conta Pacheco. “Minha interpretação é: ou ainda precisavam que um homem marcasse, ou era ele quem tinha os recursos, um celular para agendar, por exemplo. Era a questão da autonomia do homem em marcar um campeonato? Elas não me falaram isso, é um questionamento meu”, conclui.
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