comissao Começa a trabalhar a primeira Comissão de Direitos Humanos islâmica
As áreas prioritárias sobre as quais trabalhará a Comissão de Direitos Humanos serão mulheres e infância, direitos políticos 
e das minorias, e conflito palestino-israelense. 
Foto: Eva Bartlett/IPS

Washington, Estados Unidos, 17/12/2012 – Reunidos pela primeira vez em Washington, representantes da nova Comissão de Direitos Humanos da Organização para a Cooperação Islâmica (OCI) anunciaram o começo de seus trabalhos para o final deste mês. “Nos últimos meses detalhamos uma série de assuntos prioritários, e agora planejamos começar a trabalhar em grupos, no final deste mês, em Yeda”, cidade da Arábia Saudita, informou a jornalistas, na semana passada, a presidente da Comissão, Siti Ruhaini Dzuhayatin.
“Em particular, esta Comissão trabalhará para eliminar o mal-entendido sobre a percebida incompatibilidade entre o Islã e os princípios universais de direitos humanos”, disse Ruhaini. Ela e outros membros da Comissão insistiram que seu mandato é atender os direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais no contexto de uma aplicação universal, e não procurará aplicar nenhuma interpretação híbrida dos direitos humanos pela lente do Islã.
Também recordaram que a própria OCI é um órgão político, não religioso. Criada em 1969, representando 56 países e a Autoridade Nacional Palestina (ANP), a entidade é o maior fórum intergovernamental depois da Organização das Nações Unidas (ONU). A ideia de criar um órgão de direitos humanos dentro da OCI surgiu pela primeira vez em 2005, quando os Estados-membros acordaram um novo plano de dez anos que incluiu a formação da Comissão.
O plano também foi uma tentativa de redefinir a natureza da OCI em torno de ideias de moderação e modernização. Em meados de 2011, a organização criou formalmente a Independente Comissão de Direitos Humanos Permanente e elegeu 18 membros com o mandato de assessorar o Conselho de Ministros de Relações Exteriores do grupo. Entre os eleitos há advogados, ativistas, acadêmicos e diplomatas, quatro dos quais são mulheres, incluída a presidente da Comissão, uma socióloga da Indonésia. A cada uma das três principais áreas da OCI (Ásia, África e mundo árabe) serão destinados seis assessores.
Ruhaini informou que a Comissão formulou, neste último ano, seus termos de referência e normas de procedimento. Um elemento importante foi acordar suas áreas prioritárias, que incluirão questões de mulheres e infância, direitos políticos e das minorias e o conflito palestino-israelense.
Em suas quatro décadas de existência, este último tema foi um assunto definitivo para a organização, e agora é considerado um elemento permanente da agenda. “Contudo, não do ponto de vista político, mas de uma perspectiva dos direitos humanos”, explicou Ruhaini. “Por exemplo, como o conflito afeta a vida das pessoas, em particular de mulheres, meninas e meninos, e seu direito ao desenvolvimento, à paz, à segurança e à educação”, destacou.
Não aprofundaram muito no processo pelo qual os integrantes da Comissão escolherão os assuntos a serem tratados. Rizwan Sheikh, diretor executivo da secretaria interina da Comissão em Yeda, disse à IPS que este órgão receberá os temas de cima e de baixo, isto é, desde as preocupações do Conselho de Ministros de Relações Exteriores até as de ativistas.
A autonomia e a independência da Comissão foram claramente algumas das questões definidoras para os integrantes do novo órgão, como o são para muitos observadores externos. Segundo o mandato atual, cada integrante será designado por seu país e, depois, mediante voto secreto, será eleito pelo Conselho de Ministros. Sheikh indicou que caberá à Comissão definir como e quando proceder com sua agenda.
“O estatuto reitor oferece à Comissão certo grau de independência nunca antes visto nas últimas quatro décadas de trabalho da OCI: pela primeira vez em sua história, a organização criou um órgão independente de especialistas”, observou Sheikh. “A independência está garantida pela própria natureza do órgão que é assessorar. Se assim não fosse, poderiam ter surgido considerações políticas que teriam entorpecido o trabalho da Comissão. Mas isto também funciona como incentivo para atuar com muita franqueza e sem disfarçar suas opiniões”, ressaltou.
Quando iniciar seus trabalhos, entre as questões que a Comissão poderia examinar, segundo Sheikh, estão a violência contra as mulheres, o trabalho infantil, os menores em conflitos armados e outros assuntos mais sensíveis, como o casamento precoce e o direito à educação, entre outros. Nas duas sessões preliminares que houve este ano foram apontados como especialmente urgentes a violência contra os muçulmanos rohingya, no oeste da Birmânia, o cruento conflito da Síria e a queima de exemplares do Alcorão (livro sagrado do Islã) no Afeganistão.
Os membros da Comissão decidiram que uma de suas primeiras medidas será pedir aos Estados-membros da OCI que enviem as leis nacionais relevantes vinculadas aos temas prioritários da Comissão, para que esta possa começar a examiná-las. Entretanto, o orçamento do órgão, fornecido pelos membros da OCI, não foi divulgado, e grande parte de sua eficiência dependerá, sem dúvida, dessa precisa informação, que refletirá quanta vida os Estados estão dispostos a dar à Comissão.
“Esperamos realmente que este órgão seja independente e capaz de ter os meios para falar aos governos da OCI e reafirmar os direitos humanos universais”, enfatizou Joelle Fiss, da organização Human Rights First, com sede em Washington. Como Fiss, muitos analistas evitaram opinar sobre as perspectivas futuras da nova Comissão.
“Veremos como andará o assunto, mas, no momento, a Comissão deve ser incentivada pelo governo dos Estados Unidos e por outros. Teremos que avaliar o trabalho da Comissão para ver se atende aos assuntos de particular interesse para o mundo muçulmano”, afirmou Ibrahim Hooper, porta-voz do Conselho de Relações Norte-Americanas-Islâmicas, a maior organização muçulmana de direitos civis neste país. Envolverde/IPS