Na Câmara Federal, SPM destaca que femicídio transpõe fronteiras e avalia incidência no Brasil, como nos casos Eloá e estupro coletivo na Paraíba
Secretária-executiva da SPM, Lourdes Bandeira (com blazer colorido), qualifica assassinato de mulheres como expressão das relações de poder e dominação masculina Foto: Nilza Scotti/SPM
No painel ‘Femicídio – A morte de mulheres em razão de gênero’, secretária-executiva Lourdes Bandeira refletiu sobre o assassinato de mulheres devido em decorrência da sua condição de gênero. Evento foi organizado pela Frente Parlamentar Mista para o Aperfeiçoamento da Justiça Brasileira e pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB)
A tolerância social à violência contra as mulheres e a impunidade são fatores que levam aos altos índices de homicídios contra as mulheres (femicídio), no Brasil. O apontamento foi feito, nessa terça-feira (28/05), pela secretária-executiva da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR), Lourdes Bandeira, e pela juíza de direito do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Adriana Ramos de Mello.
Elas foram as palestrantes do painel ‘Femicídio – A morte de mulheres em razão de gênero’ do seminário ‘Femicídio no Brasil’, organizado pela Frente Parlamentar Mista para o Aperfeiçoamento da Justiça Brasileira, em parceria com a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), na Câmara Federal, em Brasília.
Lourdes Bandeira afirmou que o femicídio transcende todas as fronteiras. “Estima-se que cerca de 70% dos assassinatos de mulheres foram cometidos pela associação com a sua condição de ser mulher. Geralmente, aconteceram na intimidade de seus relacionamentos e a sua residência é o local onde ocorrem esses crimes com maior frequência”.
A secretária destacou os casos emblemáticos de assassinatos de mulheres, entre eles o de Elisa Samudio, o da adolescente Eloá Pimentel e o estupro coletivo com duas mortes de Queimadas, Paraíba. Salientou que o assassinato de Eloá e suas cem horas de suplício foram midiatizados e compartilhados em mídia nacional.
“Eloá teve várias mortes: em sua exposição midiática, sua perda de dignidade, de identidade, de humanidade e sua morte física. Esse femicídio evidencia o caráter violento que caracteriza as relações de gênero, sobretudo, as relações mais íntimas”. Acrescentou que, inconformado com o fim do relacionamento com a jovem, Lindemberg Fernandes Alves a manteve, junto com uma amiga, em cárcere privado, quando a agrediu, acusou, expôs, coagiu e martirizou seu corpo com um tiro na virilha e outro na cabeça.
O valor da vida da mulher - “A tardia intervenção policial e a recusa em conter o agressor demonstraram a falta de preparo policial para lidar com esse tipo de crime. Tanto o comandante da operação quanto a cobertura midiática destacaram o aspecto passional do episódio, enfatizando as qualidades do agressor: bom rapaz e trabalhador”.
Lourdes Bandeira lembrou que o comandante, ao justificar o fato de a polícia não ter agido com o mesmo “modus operandi” de outros casos quando há reféns e aplicado o tiro de misericórdia para salvar as vítimas, afirmou tratar-se de “um rapaz jovem, de 22 anos, sem antecedentes criminais e que havia sofrido uma decepção amorosa”. Enfatizou que, implicitamente, para o policial, a vida do agressor vale mais do que a vida de uma mulher. “O assassinato de Eloá é a expressão perversa de um tipo de dominação masculina ainda fortemente cravada na cultura patriarcal brasileira”.
A juíza de direito Adriana Ramos de Mello reforçou que, nos casos de assassinatos de mulheres pelos companheiros ou ex-companheiros, os juízes consideram que eles não representam uma ameaça para a sociedade, “apenas que era um perigo somente àquela mulher, que já está morta e, portanto, pode ficar solto”. A juíza considerou que cerca de 70% dos homicídios de mulheres são cometidos por razões associadas a sua condição de gênero, por serem o que elas são, e têm como autores homens com relação de proximidade, como companheiros e ex. “Está embutido na cultura brasileira o sentimento de posse do homem sobre a mulher. As normas sociais criam o sentimento de que o homem é mais soberano e que as mulheres devem ser submissas”, assinalou.
Dados da Violência - Segundo dados do Mapa da Violência no Brasil de 2012, entre os anos de 1980 e 2010, mais de 92 mil mulheres foram mortas violentamente, sendo 43,7 mil só na última década. O Brasil ocupa a sétima posição em homicídios de mulheres entre os países.
Presença - Participaram do seminário, os presidentes da Frente Parlamentar Mista para o Aperfeiçoamento da Justiça Brasileira, deputado federal Wellington Fagundes (PR-MT), e da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), desembargador Nelson Calandra, a representante da ONU Mulheres Brasil e Conesul, Rebecca Tavares, deputadas e deputados federais, estudantes e público em geral.