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sábado, 25 de maio de 2013

A Teoria dos Jogos nos livros de Jane Austen

“O mundo de Austen apresenta situações tão complexas quanto as da economia ou da política”, diz Michael Chwe, professor de ciências políticas da Universidade da Califórnia

JÚLIA KORTE, COM MARCELO MOURA

Michael Chwe, autor de 
"Jane Austen, game theorist" 
(Foto: UCLA/divulgação)
Michael Chwe, professor de ciências políticas na Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, assistia ao filme As patricinhas de Beverly Hills (1995), com os filhos, quando teve uma ideia. Percebeu que a história apresentava modelos clássicos da Teoria dos Jogos, formulada em 1944. Decidiu ler os seis livros de Jane Austen, escritora do século XIX cujo trabalho inspirou o filme. O resultado de sua pesquisa é o livro Jane Austen, game theorist, inédito no Brasil, no qual afirma que Austen foi um gênio da matemática.

ÉPOCA – O senhor acha importante enxergar a literatura com “olhos de matemático”?
Michael Chwe – Há muitas formas de entender a literatura, e a perspectiva da Teoria dos Jogos é uma delas. Alguns exemplos ótimos estão no livro de Tom Schelling, vencedor do prêmio Nobel em 1995. Não há muita matemática no meu livro, apenas o suficiente para ilustrar como a Teoria dos Jogos funciona. Eu acho que qualquer teórico dos jogos iria concordar que o mundo de relações e manejos sociais de Austen apresenta situações pelo menos tão complexas quanto aquelas na economia ou na política.

ÉPOCA – Como o senhor diria que a Teoria dos Jogos se apresenta nos livros de Jane Austen?
Chwe – Aqui está um exemplo do livro Orgulho e preconceito. Jane Fairfax não recebe uma carta de Frank Churchill, de quem está noiva secretamente. Ela chega então à conclusão de que ele simplesmente não se importa, em vez de culpar o serviço dos correios. A discussão da confiabilidade no serviço já havia sido feita anteriormente por Jane Fairfax e Mr. John Knightley. Austen sugere duas explicações para aquela situação, portanto: uma baseada no hábito e uma pensada nos interesses. Como uma teórica dos jogos, a explicação pelo interesse é a fundamental.

O livro de Michael Chwe,
"Game theorist" (Foto: Reprodução)
ÉPOCA – Algumas pessoas consideram Jane Austen uma escritora além do seu tempo. O senhor concorda?
Chwe – Muitas pessoas amam Austen porque adoram o mundo da Regência Britânica (1811 a 1820). Para mim, isso não é muito sobre o que os livros realmente tratam. Os insights dela sobre interações humanas são atemporais e universais, assim como os insights da Teoria dos Jogos. Austen estava tentando explorar estratégias de pensamentos de um ponto de vista da Teoria dos Jogos, embora não ache surpreendente que os romances e jogos matemáticos compartilhem tantas semelhanças. Os insights são universais o suficiente para terem surgido em diferentes contextos históricos.

ÉPOCA – O senhor pode explicar a conexão entre boas escolhas e ser dominado pelas emoções?
Chwe – No livro Mansfield Park, Edmund Bertram dá um colar de ouro para Fanny Price, dizendo que é uma recordação do amor entre melhores amigos, e vai embora. Fanny, sem querer que a doçura dele acabe, cheia de sentimentos de dor e prazer, poderia ousar falar, mas é silenciada, pois era a melhor escolha que poderia fazer. Esse é um exemplo de como Austen mostra que as pessoas sempre podem agir para seus interesses, mesmo sobre estresse emocional. Mesmo dominada pelas emoções, o desejo de Fanny é soberano. Muitas pessoas criticam a Teoria dos Jogos e os economistas por dar mais atenção às escolhas que às emoções. Mas Austen concorda com os economistas. Seus personagens têm intensas emoções, mas agem de acordo com seus interesses.

ÉPOCA – Que tipo de lições valiosas uma pessoa interessada em manipulação e persuasão no mundo real poderia tirar dos livros de Austen?
Chwe – Uma das lições mais importantes do livro é que, mesmo nas situações mais difíceis ou até constrangedoras, é possível ser estratégico e tomar boas decisões. Em Mansfield Park, Fanny Price não tem poder e é maltratada pela família adotiva. Mesmo assim, ela mantém posições estratégicas. Olhando as estrelas pela janela com Edmund Bertram, Fanny propõe que eles observem a constelação Cassiopeia, o que só é possível se eles forem até o jardim juntos. Essa simples manipulação quase funciona. Quando o rico e o odioso Henry Crawford pede sua mão em casamento, ela recusa, mesmo que todos, inclusive Edmund, tentem persuadi-la a aceitar a proposta. E no final ela conquista Edmund. Assim, Fanny é a única heroína de Austen que toma uma decisão, opondo-se à opinião contrária de todos. Se uma garota aparentemente fraca como Fanny pode se defender sozinha e tomar as rédeas das suas próprias escolhas, então todos nós podemos.

Casos clássicos da Teoria dos Jogos em livros de Jane Austen 
  
Dilema do Prisioneiro
O que é? Cada pessoa pode ou não contribuir para o bem estar social, mas cada um quer no fundo uma “carona livre” no esforço do outro. Como resultado, ninguém contribui e a situação é pior a todos.
Exemplo real: Poluição nas cidades. Todos preferem um ambiente com ar limpo, mas ainda sim individualmente preferem manter um carro velho e sem manutenção que solta fumaça, por exemplo, a andar de bicicleta ou usar energia limpa. 
Em Jane Austen
Obra: Persuasão
Ano: 1818
Onde: Quando o Capitão Wentworth está visitando sua irmã no Kellynch Hall e é convidado para jantar no Upercross. Charles e Mary Musgrove também são convidados e estão ansiosos para conhecer o Capitão. Mas infelizmente o filho pequeno do casal, Charles, teve uma queda e deu um mau jeito no pescoço. Cada um pode escolher entre ir ao jantar ou cumprir suas obrigações de bons pais, apesar do desejo próprio. Depois de Charles partir para o jantar, Mary chora e questiona: “Se o papai pode ir, por que eu não poderia?”. Se Charles ficasse em casa, talvez sua mulher também o fizesse, e o filho não ficaria triste. Mas, uma vez que um deles decide sair, o outro se sente excluído e decide ir junto. Essa situação é salva por Anne Elliot, irmã de Mary, que decide ficar para cuidar do sobrinho. Anne está feliz em ter uma desculpa para não encontrar o Capitão Wentworth porque havia recusado uma proposta de casamento dele oito anos antes.

Caça ao Cervo
O que é? Cada pessoa quer participar, mas ninguém quer ser a única participando. Todos precisam da segurança que outros vão participar também. Assim, seria mais fácil chegar a um acordo, já que há vantagem para os envolvidos.
Exemplo real: Unir-se a uma insurreição política. Se você é o único que quer participar, provavelmente vai levar um tiro, mas, se todos se juntarem à causa, o regime pode cair.
Em Jane Austen
Obra: Orgulho e preconceito
Ano: 1813
Onde: Quando Elizabeth Bennet visita Netherfield, o Sr. Darcy a convida para dançar, mas ela recusa, pensando que ele queria humilhá-la (ele havia dito anteriormente ao Mr. Bingley: “Ela é tolerável, mas não tem beleza suficiente para tentar-me”). Ou seja, a princípio, ela não gostava do senhor Darcy, por achar que ele não gostava dela, como confessou a Charlotte Lucas.

Jogo do Covarde
O que é? Cada pessoa pode confrontar ou se acovardar. A melhor situação é quando um dos envolvidos continua e o outro desiste. Mas se ambos decidem se armarem, o resultado é sempre um desastre.
Exemplo real: Armamento de mísseis em Cuba. Nesse jogo, é uma vantagem mover primeiro e se armar antes que outro tenha a chance de fazê-lo. Uma vez que você está armado, o outro vai ter que desistir antes que aconteça uma catástrofe.
Em Jane Austen
Obra: Razão e sensibilidade
Ano: 1811
Onde: Elinor Dashwood gosta de Edward Ferraris, mas não reconhece suas intenções verdadeiras. Porém, quando Elinor conhece Lucy Steele, esta conta que está noiva dele em segredo há quatro anos. Então, Elinor diz a si mesma que só poderia ter sido por ciúmes a confissão. Em outras palavras, é melhor Lucy clamar por Edward para Elinor desistir, do que ambas causarem uma situação desconfortável.  

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