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sexta-feira, 31 de maio de 2013


Ficou ofendido com o título? Essa é a premissa do livro ‘Você não é tão esperto quanto pensa’, de David McRaney. Ele lista 48 formas com as quais nossos cérebros nos enganam - e mostra que, ao conhecermos essas falhas, podemos conviver melhor com nós mesmos

por Luciana Galastri
Editora Globo
David McRaney - ele se descreve
como um 'nerd' da psicologia
 // Crédito: Mon Mussiet
Você tem suas opiniões sobre o preço do tomate, sobre política, religião e sobre um número imensurável de outras coisas. Provavelmente, você acha que elas são resultado de análises feitas durante anos de sua vida – tudo baseado em uma lógica estritamente racional. Mas a verdade é que essas ideias são provenientes de uma ótica falha. Você presta atenção apenas em alguns tipos de informação: aquelas que confirmam suas antigas crenças. As versões contraditórias? São muito trabalhosas, logo, são inconscientemente ignoradas.

Não é a GALILEU que diz isso – é o autor de Você não é tão esperto quanto pensa (Leya, R$39,90), o jornalista David McRaney. Em seu livro, ele reúne 48 formas (como a citada no primeiro parágrafo) com que o nosso cérebro nos engana, todas exemplificadas por estudos científicos que analisam a forma com que pensamos e o comportamento resultante. 

Confira a entrevista com o autor e pense duas vezes antes de dizer ‘eu já sabia’ – de acordo co suas pesquisas, tendemos a esquecer que estávamos errados e acreditamos que já sabíamos da verdade o tempo todo. 

GALILEU: Como você se tornou uma pessoa tão interessada na mente humana?
David McRaney: Eu era filho único e não tinha vizinhos. Em outras palavras, não tinha com quem brincar, já que cresci em uma região remota ao Sul dos Estados Unidos. Sentia que tinha nascido um eremita. Cresci em uma bolha que não se parecia em nada com o mundo que descobri quando finalmente foi para a escola. Foi como se eu tivesse me juntado a uma raça alienígena e precisasse entender como ela funcionava. Quando eu fiz a minha primeira aula de psicologia, tudo começou a fazer sentido. Percebi que todos os meus questionamentos eram uma versão diferente do tema ‘ser uma pessoa’. Tive uma professora incrível, Jean Edwards, que abriu minha mente e me fez ver a luta que todos nós travamos para sermos pessoas com mentes complexas, cheias de nuances e incrivelmente perfeitas. 

E então você decidiu escrever um blog sobre o assunto? (McRaney mantém o blog You are not so smart, sobre psicologia) 
David McRaney: Em 2009 eu comecei a escrever o blog e, no começo, postava muitos links, vídeos e artigos, com poucos posts propriamente meus. Comecei, na verdade, quando eu assisti dois vídeos no YouTube: a troca de pessoas, do ilusionista Darren Brown, e o experimento do Gorila Invisível. Assim que comecei a ter uma ideia melhor sobre o tema principal do blog, fiquei com vontade de escrever textos maiores, que explorassem mais cada tópico. 

A ideia de transformar este assunto em um livro que provasse como não somos tão inteligentes surgiu quando?
David McRaney:  Estava em uma discussão acalorada com alguns amigos sobre qual console era melhor, o PlayStation 3 ou o Xbox 360. Era uma dessas discussões (ou batalhas nerds) tipo Apple X Microsoft, Star Wars X Star Trek. E eu fiquei impressionado com o quanto aquilo me chateou. Eu tentei entender porque eu estava agindo como um imbecil e resolvi escrever um post. Esse post acabou atingindo muitas pessoas, foi republicado no Gizmodo, um blog bem popular. Depois disso, o blog se tornou famoso e eu recebi um e-mail da minha agente que sugeriu que aquilo poderia se tornar um livro legal.

E como você reuniu 48 tópicos que provam que não somos tão espertos assim?
David McRaney:  Lembrei do que parecia causar mais furor, mais discussões nas minhas turmas dos cursos de psicologia e das coisas aprendidas lá que eu repetia em festas e reuniões e que pareciam alimentar bem as conversas. Essas foram as bases. Depois eu comecei a buscar falácias e preconceitos nas pesquisas sobre estes tópicos. Minha esposa é bibliotecária, então eu também posso colocar minhas mãos em qualquer estudo que eu desejar de forma relativamente fácil. Para cada tópico do livro, eu reunia de 30 a 50 estudos, lia todos, e decidia quais deles tornariam o assunto mais fácil. Depois eu os resumia em 5 a 10 estudos citados no capítulo. 

O resultado é um livro que nos mostra que somos criaturas iludidas. E, na maioria das vezes, não há como escapar disso. Mesmo assim, mesmo escapando da filosofia da auto-ajuda, você acredita que o livro pode nos fazer viver melhor com um cérebro cheio de manias? 
David McRaney: Eu acho que é importante adicionar o conhecimento de nossas limitações ao manual de instruções para termos um corpo humano. A ideia do livro é que você pare de acreditar que você é a pessoa que deve ser e passe a planejar sua vida de acordo com a pessoa que você realmente é. Se você entende que um tipo de comportamento leva a dívidas no banco, ou que um trabalho X o deixará infeliz, você pode evitar colocar a si mesmo em situações que irão levar a essas atitudes. Em pequena ou em grande escala, como indivíduos e como sociedade, nos comportamos melhor quando admitimos nossas ilusões. 

Você pode dar um exemplo da aplicação dessa atitude mais honesta em relação às limitações? 
David McRaney: Nós não acreditamos que crianças são capazes de manter os dedos fora de tomadas. Então, nós cobrimos nossas tomadas e explicamos o motivo para nossos filhos. Eu proponho que façamos algo parecido com o nosso comportamento. Nos Estados Unidos, sabemos que pessoas relutam em se tornar doadoras de órgãos, mesmo sabendo que é a coisa certa a ser feita. Então, em muitos estados, em vez de perguntar às pessoas se elas gostariam de se tornar doadoras, os governos passaram a cadastrá-las no programa de doação automaticamente e dar à elas a opção de se “descadastrar”. Agora, em vez de pessoas recusarem se tornar doadores, elas têm uma tendência maior a recusar a cancelar seu cadastro. 

Durante toda a leitura, caímos na realidade repetidas vezes e vemos as limitações de nossa mente. Mas, como você mesmo explica, temos dificuldade de admitir que estávamos enganados sobre alguma coisa. Você recebeu alguma reação negativa de leitores? 
David McRaney: Não recebi nenhum feedback negativo nesse sentido. Aliás, as respostas têm sido muito positivas e eu acho que é porque eu falo sobre coisas que muitas pessoas suspeitava, mas nunca colocaram em palavras, ou compartilharam com outras. Também há um senso de humildade diante da fragilidade humana. É uma boa sensação quando nos reconhecemos como parte de uma comunidade falha global. Vemos que todos nós estamos nos esforçando para sermos pessoas melhores, e isso nos dá forças. 

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