Painel de abertura expôs as consequências do racismo e da política proibicionista de drogas para o desenvolvimento integral das juventudes. Foto: Thiago Rodrigues Souza |
“Quero falar sobre esse negócio ‘fenomenal’ que é o racismo, que influencia relações econômicas, políticas, culturais e, até mesmo, amorosas”. Com uma contundente exposição sobre as dimensões da discriminação racial no país, o militante da União de Núcleos de Educação Popular para Negras/os e Classe Trabalhadora (UNEafro-Brasil), Douglas Belchior, deu início à mesa de abertura do seminário “Juventudes contra Violência”. O evento, que aconteceu nos dias 21 e 22 de fevereiro, no CentoeQuatro, reuniu jovens, educadores e outros profissionais que atuam na área para discutir as múltiplas dimensões da violência contra a população de 15 a 29 anos. Douglas, que também é editor do blog Negro Belchior, chamou a atenção para a ausência de políticas públicas consistentes para a população negra no Brasil, sendo uma das poucas exceções a Lei 10639/2003, que estabelece a obrigatoriedade da temática “História e cultura afro-brasileira” no currículo oficial da rede de ensino.
Além das altíssimas taxas de homicídio entre pessoas negras – 36,5 para cada 100 mil habitantes, índice duas vezes e meia maior que a vitimização entre pessoas brancas – Douglas lembrou que a dívida do Estado brasileiro com a população negra abrange outras esferas, como a educação. Ele ressaltou que as ações afirmativas para negros e negras, a exemplo da reserva de cotas para o ingresso em universidades públicas, são politicas reformistas, que não reparam totalmente o histórico de violações contra essa população no país. “Não existe um ‘milímetro’ na história do Brasil que não tenha sido construído com nosso suor e nosso sangue”, acrescentou.
Representando o Fórum de Juventudes do Rio de Janeiro, a assistente social Monique Cruz fez um relato alarmante sobre as violações de direitos sofridas por jovens na capital do estado, especialmente por aqueles de periferia. Segundo a jovem, o acesso a espaços e equipamentos públicos como praias, parques e até mesmo veículos de transporte coletivo tem sido dificultado àquelas pessoas. “A circulação na cidade vem sendo um dos grandes problemas que a gente vem enfrentando, principalmente para jovens negros e pobres”, pontuou Monique, que também alertou para as práticas de criminalização do funk. A militante realçou, ainda, que a política de pacificação nas comunidades, cujo expoente máximo são as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), pode estar violando direitos da população que vive ali. “Com essa política, houve, sim, redução dos homicídios, mas aumentaram os desaparecimentos de pessoas”, advertiu.
Eduardo Ribeiro, da Frente Estadual Drogas e Direitos Humanos da Bahia, explicou que a história da humanidade se confunde com a história do consumo de drogas, entendendo que qualquer substância psicoativa – do álcool à maconha, do café à cocaína – pode ser considerada uma droga. Ele traçou um histórico da política proibicionista no mundo, segundo ele “um mecanismo de coerção social racista”, e destacou que a chamada guerra às drogas é, na verdade, uma guerra contra as pessoas.
O fracasso da política proibicionista foi um dos pontos altos da exposição de Eduardo, que também é professor de História na rede pública: os Estados Unidos, país pioneiro nas formulações do proibicionismo no mundo, amargam hoje a maior população carcerária mundial – em torno de 25% das pessoas encarceradas no mundo. Ele também alertou para os perigos da internação compulsória e das posturas higienistas em relação ao consumo do crack, realçando que, em geral, existe um histórico de negação de direitos na vida de quem está viciado nessa droga. “O proibicionismo é uma estratégia de controle e gestão da pobreza”, finalizou.
Importante ação associada à campanha de mesmo nome, o seminário “Juventudes contra Violência” foi realizado pelo Fórum das Juventudes da Grande BH, em parceria com a Associação Imagem Comunitária e o Instituto C&A e com o apoio do CentoeQuatro.
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