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domingo, 25 de setembro de 2016

No escurinho do cinema, a desigualdade perpetuada

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Cineastas do Coletivo Vermelha e secundaristas do Virgília em selfie feito por Ellen Tejle (à esq.)
  por 

Ativista sueca vem ao Brasil conversar sobre teste que mede sexismo e racismo nos filmes. Com secundaristas, fala sobre a importância das imagens na formação das crianças: “o que elas podem ver, elas podem ser”
Por Inês Castilho



O que dizer de um país que desde 1970 dá ao casal, no nascimento do filho, 16 meses de salário para cuidar da criança? Onde o príncipe, o ministro da educação e os pais em geral saem às ruas carregando seus bebês? De fato, a Suécia é considerada o país onde há a menor desigualdade de gênero no planeta. Lá, as mulheres votam desde 1921, o aborto foi legalizado em 1938 e o Ministério de Gênero foi criado em 1954. O próprio governo, orgulhoso, declara-se feminista.
Um paraíso para as mulheres? Não exatamente. Entre outras coisas, as mulheres ainda recebem cerca de 500 mil dólares a menos que os homens no decorrer da vida. E o mesmo texto é avaliado como bem escrito, forte e convincente, se assinado por um homem; e bagunçado, antipático, incompreensível, se assinado por uma mulher – segundo pesquisa feita na Suécia e em outros países europeus.
Foram essas constatações que levaram Ellen Tejle, jovem sueca programadora da sala de cinema Rio e dona de dois restaurantes em Estocolmo, a criar um índice que mede a presença das mulheres no cinema. Chamado Bechdel Test em homenagem à cartunistaAlison Bechdel, ele classifica os filmes a partir de três perguntas muito simples. Tem duas personagens femininas com nome? Elas conversam entre si? Falam sobre algum assunto que não seja homem?
“Eu nem era feminista, mas percebi que há muito a fazer, mesmo na Suécia. Que há um problema democrático para as mulheres, e que esse problema é reproduzido inconscientemente. Só temos primeiros-ministros homens, embora as mulheres também se candidatem. Inconscientemente, as pessoas acham que o homem é melhor que a mulher. Por isso a representação dos gêneros no cinema é tão importante”, diz ela.
Ellen aponta os dados de um estudo global na indústria cinematográfica, realizado pelo Instituto Geena Davis, segundo o qual apenas 29,2% dos papeis que têm fala são femininos e 70,8%, masculinos; e 19,5% das personagens femininas têm uma profissão, para 80,5% dos personagens masculinos.
”É ainda pior que na realidade, pois cerca de 40% das mulheres trabalham fora. O percentual de papeis femininos com fala é o mesmo que havia nos anos 40. E são papeis de mulheres hipersexualizadas, sempre salvas pelos homens, que choram desamparadas ou são vítimas de violência. De que valem, então?”, pergunta.
Ellen se dirigia a um pequeno grupo de alunas e alunos do 3º colegial da escola estadual Virgilia Rodrigues Alves de Carvalho Pinto, no Butantã, na sexta-feira (26), num dos debates decorrentes das ocupações e da integração entre escola e comunidade. Trazida ao Brasil pelo Coletivo Vermelha de mulheres cineastas, veio falar sobre o teste de Bechdel e o selo A-rating, que garante a igualdade de gênero e vem sendo usado como selo de qualidade também em programas de rádio e TV. “Tornou-se até um adjetivo, usado para qualificar festas e eventos que têm participação igualitária entre os gêneros. Tipo foi cool, A-rated”, diz ela.
Apresenta também um selo que mede a presença de negros, ou “pessoas não brancas” nos filmes, medida por meio do teste Chavez Perez, nome de um escritor latino que vive na Suécia. “Há um problema sério de racismo hoje na Suécia”, diz ela, que aparece numa foto ao lado da ministra da Cultura sueca, ao mesmo tempo mulher e de origem negra.
Ellen menciona ainda outra pesquisa do Instituto Geena Davis, segundo a qual crianças até 5 anos, de ambos os sexos, têm as mesmas aspirações, e a partir dessa idade passam a ser fortemente afetadas pelas imagens que veem nas telas. “O que ela pode ver, ela pode ser”, diz o site do Instituto, em sua cruzada contra a desigualdade de gênero no cinema e TV.
A partir do Teste de Bechdel o Instituto de Cinema Sueco, órgão estatal responsável pelo audiovisual no país, conseguiu em poucos anos alcançar paridade de gênero nos filmes financiados pelo Estado. No Brasil, um estudo da Ancine mostra que a presença feminina na direção de obras é de 19%, e que ela ocorre mais no curta (23%) que do longa-metragem (18%). Dos 809 filmes lançados de 1995 até 2015 no Brasil, 631 não contam com mulheres na equipe de câmera e apenas 48, 5,93%, foram fotografados por mulheres.
É sobre esse teste que ela vai falar neste domingo, 28, às 19 horas, no Museu de Imagem e do Som (MIS), em São Paulo. Segue depois para a China, onde vai apresentar seu trabalho num festival de cinema de mulheres. “A questão da desigualdade de gênero está surgindo lá também, e vem sendo perseguida pelo governo. Para fazer frente a isso as mulheres organizaram um festival e me chamaram”, diz Ellen. Desde que criou esse selo, há alguns anos, ela tem sido chamada para falar em vários países d o mundo. Sua passagem pelo Brasil, assim como pela China, está sendo gravada para um filme produzido pelo Instituto Geena Davis sobre as mulheres no cinema e na TV.

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