3 DE NOVEMBRO DE 2016
Passadas as eleições para as câmaras municipais, já havia dados disponíveis para demonstrar os avanços ou retrocessos no número de mulheres nos espaços políticos em 2016. Essa é a segunda disputa em nível municipal depois da vigência da Lei das Eleições, que determinou uma cota de ao menos 30% para candidaturas de cada sexo. Na prática, essa cota buscava incluir mais mulheres na disputa eleitoral.
Os números obtidos nas urnas permitem uma análise da sua eficácia: afinal, as mulheres estão realmente na disputa? Para a reportagem “Partidos recorrem a candidatas ‘fantasmas’ para preencher cota de 30% para mulheres“, baixamos os resultados eleitorais do repositório do TSE e verificamos as informações sobre os candidatos. Para obter o número de mulheres e homens sem nenhum voto, excluímos os casos em que a votação dos candidatos é anulada e aparece como zerada, mesmo que tenham sido votados. É o caso, por exemplo, de candidaturas aptas e indeferidas com recurso ou cassada com recurso.
Os dados do TSE trazem as votações recebidas por cada candidato em cada zona eleitoral, e o tamanho do arquivo extrapola o limite de processamento de softwares de planilha comuns (Google Spreadsheet, Libre Office, Excel). Então consultamos em SQL (a sigla para o que em português chamamos de Linguagem de Consulta Estruturada) os candidatos zero voto reunindo todas as zonas eleitorais.
Essa base não apresentava a coluna “sexo”, um desafio que já se tornou bastante comum para nós, da Gênero e Número. Embora o TSE tenha essa informação em seus registros, ela não está presente em todas as suas bases. Análises de gênero nem sempre são possíveis por essas limitações. Ou seja, apenas com a planilha de resultados do TSE não teríamos como separar homens e mulheres. Contudo, a base trazia o nome e o número sequencial dos candidatos, algo que usamos para importar os dados de sexo da base de candidaturas.
A partir daí, com o recorte de candidatos homens e mulheres sem voto nas eleições de 2008, 2012 e 2016, chegamos ao que queríamos checar: a cota impulsionou as candidaturas femininas, mas além de não alterar o quadro de eleitas, levou os partidos a criarem uma nova categoria de candidata, as “fantasmas”, que são convidadas e convencidas a entrar nas chapas, mas efetivamente não entram na disputa, não fazem campanha, não recebem apoio ou sequer dão a si mesmas seus votos.
Homens ou mulheres? Gênero na composição partidária
A baixa representação feminina na política tem origem nos partidos, onde elas também são minoria, especialmente se olharmos estruturas partidárias como o Diretório e a Executiva nacionais. E foi o que fizemos.
A primeira dificuldade, nesse caso, é que o TSE não dá uma base consolidada dos membros dos diretórios e das executivas. O que temos disponível é um sistema de consulta com informações registradas pelos partidos – o Sistema de Gerenciamento de Informações Partidárias (SGIP). Nele podemos verificar a composição dos órgãos partidários, e elas nem sempre estão totalmente atualizadas.
Criamos um raspador em Python para obter a composição de todos os diretórios e comissões executivas nacionais dos partidos do SGIP e jogamos no Google Sheets. O segundo problema: mais uma vez, não tínhamos dados de gênero. Eram mais de 5600 nomes, como classificá-los por homens e mulheres manualmente?
A segunda etapa com essa base foi encontrar um dicionário de nomes na língua portuguesa que tipicamente eram associados aos sexos feminino e masculino. Usamos esse dicionário como uma base inicial de consulta para atribuir gênero aos nomes raspados do SGIP. Esse dicionário inicial mostrou-se incompleto. Usamos um filtro para classificar, manualmente, os nomes que não constavam no dicionário e aqueles em que não era possível determinar o gênero apenas pelo seu uso comum. Nesses casos, fizemos pesquisas na web para verificar quem eram os candidatos. Não identificamos 17 dos 5662 nomes, o que representa 0,3% do total, uma quantidade inexpressiva nas nossas análises.
Com essa base fizemos uma primeira análise da proporção entre mulheres e homens nos partidos. Alguns casos acenderam um alerta – por exemplo, a Erundina, que foi candidata pelo PSOL à prefeitura de São Paulo, ainda aparecia como membro do diretório do PSB. Depois de checar com o TSE, tivemos a certeza de que nem todos os dados ali estavam atualizados. Então decidimos separar os dez partidos com maior representatividade no Congresso Nacional e checar os nomes em todos eles.
A tendência dos dados se mantinha a mesma por partido, a baixa presença feminina nos cargos decisórios dentro da máquina partidária estava comprovada, e ouvimos mulheres dentro dos partidos para entender o que isso representava, na prática.
Em todas as pautas, a preocupação se mantém a mesma: ir dos dados à escuta, porque os números precisam ser checados e precisam de contexto, e eles sozinhos não contam as histórias que queremos trazer, todo mês, na Gênero e Número.
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