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sexta-feira, 24 de março de 2017

“Nosso objetivo é romper as barreiras e o preconceito”, diz diretor de ‘Waiting For B.’

DIEGO OLIVARES ·MARÇO 2, 2017

Qualquer pessoa que acompanha minimamente a cultura pop conhece o fenômeno que se repete a cada grande show de uma estrela internacional no Brasil. Meses antes do evento, aparecem os primeiros fãs dispostas a acampar na fila até o dia da apresentação, faça chuva ou faça sol. Tudo para garantir um lugar mais perto de seu ídolo.
“Loucos” e “desocupados” são alguns dos adjetivos mais comuns empregados pela maioria das pessoas na hora de descrever estes cidadãos abnegados. O documentário Waiting For B., dirigido por Paulo César Toledo e Abigail Spindel, tem o mérito de ir além destes estereótipos. Ao fazer isto, acaba revelando um pouco da alma destes jovens, em sua maioria negros, homossexuais e da periferia de São Paulo, que passaram longas semanas às portas do Morumbi na expectativa pelo show de Beyoncé no estádio, que aconteceu em setembro de 2013.
Num país em que muita gente ainda carece de se ver representada na grande mídia, figuras como Beyoncé, ou pelo menos a imagem de empoderamento projetada por sua persona pública, são fundamentais e acabam cumprindo o papel próximo a uma “madrinha” de seus admiradores.
Tal retrato tem reverberado forte com o público. Imaginado inicialmente como uma produção a ser disponibilizada diretamente no YouTube, o filme foi premiado em Festivais como o Mix Brasil, o In-Edit e o Queer Lisboa, além de ter sido exibido na América Latina, Estados Unidos, Rússia, Suécia, Tanzânia e Austrália, entre outros..
Na semana em que Waiting For B. chega ao circuito comercial brasileiro, como parte da iniciativa Sessão Vitrine Petrobrás, Paulo César Toledo conversou com o TelaTela:
TelaTela – Como surgiu a ideia do documentário? Você é particularmente fã da Beyoncé ou já fez coisas parecidas para ver algum show?
Paulo César Toledo – O documentário surgiu da minha curiosidade pessoal sobre esse fenômeno dos acampamentos para os grandes shows, principalmente porque eu sempre achei que, apesar da cobertura dada pelos meios de comunicação, ela era sempre rápida e superficial. Eu pressentia que havia ali um tesouro, mas que ele demandaria tempo e paciência para que ele viesse à tona. Eu sempre fui um grande fã de música, inclusive foi por causa da música que fui estudar Rádio e Televisão e acabei chegando ao Cinema. A Abigail gostava mais da música da Beyoncé do que eu quando começamos o filme (confesso que eu mal a conhecia), mas nenhum de nós nunca considerou fazer uma loucura tão grande por nenhum artista.
Há uma preocupação visível do documentário em apresentar os personagens de forma leve e divertida e ao mesmo tempo não reduzi-los a caricaturas. Como foi encontrar estes limites?
Realmente acho que seria muito fácil fazer um filme ridicularizando esses fãs, pois eles estão muito expostos e já partem de uma situação em que a maior parte das pessoas os vê com preconceito. Por isso buscamos produzir um documentário de observação, pois o ponto de vista do público fica muito mais próximo do próprio ponto de vista dos personagens, e cria-se assim, uma empatia maior. Para nós, que não os conhecíamos antes das filmagens, foi essencial a generosidade e a receptividade do acampamento e todo o tempo nosso objetivo é romper as barreiras e o preconceito, ao invés de reforçá-las, então procuramos fazer um retrato sem julgamentos.
À primeira vista, para quem lê a sinopse, o filme parece apenas ter um recorte curioso. Diante das personagens, acaba sendo um estudo sobre a influência de uma artista em pessoas que normalmente não se sentem representadas em outras áreas da sociedade. O documentário sempre foi concebido com essa premissa ou o contato com os personagens acabou por revelar isso posteriormente?
O filme começou como uma investigação sobre esse grupo específico de fãs. Como o tempo nós fomos descobrindo todas essas camadas de assuntos que foram se revelando para nós e quem aliás, acabaram sendo muito mais relevantes! Assim, o fanatismo, de ponto de partida passou a ser a catalisadora dessa série de questões que acabou indo de empoderamento, homofobia, classe e até mesmo o sentimento de coletividade, dentro dessa comunidade de aceitação.
O Brasil é um país onde a idolatria aos astros da cultura pop é muito grande. Quais fatores podem explicar isso?
Olha, apesar de termos feito esse filme eu ainda não tenho uma resposta definitiva pra isso. Mas posso falar do meu ponto de vista: apesar de ser um país tão grande e rico, a desigualdade social acaba com a auto-estima dos jovens, principalmente os das classes mais baixas. A minha impressão é que estamos sempre ‘batendo na trave’ em termos de inserção no cenário internacional, mas graças à internet nós nos sentimos tão próximos a tudo que acontece no mundo, mas nunca podemos alcançar. Então, na prática, cada show, cada aparição de um ídolo internacional por aqui pode ser a última. Além disso, se não temos esperança de alcançarmos o sucesso de uma Beyoncé ou de uma Lady Gaga, ao fazermos parte dessa coletividade da “fanbase” é possível, pelo menos virtualmente, compartilhar um pouco dessas glórias.
Este é seu primeiro longa-metragem e já vi declarações suas de que a expectativa inicial era apenas de lançá-lo na internet mesmo. Agora, ele chega ao circuito comercial de cinema, depois de passagens importantes por festivais. Como toda esta trajetória de Waiting For B. impacta sua carreira daqui para frente?
A carreira do Audiovisual no Brasil é muito dependente do apoio público, através de leis de incentivo, editais e concursos. Até hoje nós nunca havíamos conseguido nenhum patrocínio para nenhum projeto, por isso fizemos esse filme sem grana nenhuma. Quando começamos esse projeto nossa intenção era exatamente enriquecer nosso currículo para, quem sabe, conseguirmos algum apoio desse tipo no futuro. Espero que Waiting for B. facilite esse acesso agora..
O filme dá voz a jovens negros, gays, pessoas da periferia. Qual é a importância de fazer isso em um momento como este no Brasil, onde as minorias que vinham ganhando força se vêem ameaçadas por uma nova onda de repressão?
Acho que tão importante quanto o filme em si e seus personagens, o maior valor desse filme é mostrar que é possível produzir por conta própria. Esse filme é, quase que literalmente, um filme de fundo-de-quintal, e esse é o recado: se você acredita na sua ideia, parta pra cima e produza. Se o filme não chegar na sala de cinema não desanime, afinal o que não faltam hoje são maneiras de colocar o seu filme no mundo. O que queremos, no final, é compartilhar a nossa visão e tentar mostrar um pedacinho do mundo que algumas pessoas ainda não conhecem, então a internet está aí pra isso.




Carta Capital

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