Um novo estudo traz as evidências mais convincentes vistas até agora do chamado “efeito filha”.
07/06/2017
Emily Peck Editora executiva de negócios e tecnologia no The Huffington Post
Para muitos homens, ter uma filha é algo que os conscientiza de uma ideia que já está na cabeça da maioria de nós: as mulheres são seres humanos, tão capazes quanto os homens.
A internet está cheia de blog posts de pais explicando com grande sinceridade que quando tiverem uma filhinha, isso mudou seus sentimentos em relação às mulheres. Os papais dizem que as garotinhas não são apenas objetos bonitinhos e cheirosos para serem olhados com prazer. Observando suas filhas crescendo e enfrentando o mundo, os pais descobrem que elas encaram dificuldades devidas ao machismo.
O "efeito filha" não é apenas algo relatado por alguns homens. E ele faz mais do que apenas mudar as atitudes dos homens: pode também ter consequências econômicas profundas. Um estudo recente de pesquisadores da universidade Harvard revelou o que talvez seja a prova mais convincente disso: os investidores de risco que têm filhas mostram tendência maior a contratar mulheres para trabalhar em suas firmas, e essas firmas mais diversificadas apresentam retornos financeiros melhores.
Em outras palavras, os pais menos sexistas acabaram tomando decisões melhores para suas empresas.
"A reversão sutil de preconceitos pode ter efeitos reais", falou Paul Gompers, professor da Harvard Business School e autor da pesquisa, juntamente com a doutoranda em economia Sophie Wang, de Harvard. Eles publicaram suas descobertas em artigo no site do National Bureau of Economic Research.
Outros estudos sobre categorias profissionais com predomínio de homens chegaram a conclusões semelhantes: os deputados e senadores que têm filhas são mais progressistas em seus votos, segundo um estudo de 2006. Uma pesquisa de 2015 concluiu que os CEOs que têm filhas dedicam mais tempo a causas sociais. E um artigo de 2014 informou que os juízes que têm filhas tendem a fazer julgamentos mais favoráveis às questões femininas.
Tudo isso vem contrariar fortemente as noções antiquadas sobre a separação entre homens e mulheres, como a regra que o vice-presidente Mike Pence supostamente segue: consta que ele se nega a jantar ou sair em companhia "mista" (incluindo homens e mulheres), a não ser que sua mulher esteja presente. Vale lembrar que ele, Mike Pence, tem duas filhas e um filho.
Criar uma filha nem sempre é algo que faz um homem mudar seu modo de pensar. Ninguém tomaria Mike Pence ou o presidente Donald Trump por feministas. Mas foi a pedido de sua filha Ivanka que Trump incluiu uma licença-maternidade e paternidade paga em sua proposta de orçamento draconiano, no mês passado. Ele é o primeiro republicano a jamais ter proposto tal medida. Enquanto isso, seu predecessor, o ex-presidente Barack Obama, pai de duas filhas, foi o primeiro presidente americano a ter se descrito explicitamente como feminista.
Também há algo um pouco deprimente nas descobertas dos estudos. Sim, eles trazem argumentos sólidos em favor da diversidade e mostram como a inclusão pode reduzir o preconceito. Mas nos deixam sem saber o que fazer quando se trata de tomar medidas concretas.
"Ter mais filhas" não é uma política social viável. Não é uma recomendação útil como base para um programa corporativo de diversidade. O "efeito filha" lembra também o modo como homens em posições de poder frequentemente reagem a relatos de sexismo ou de violência sexual ou estupro, fazendo declarações de solidariedade acrescidas de explicações do tipo "como pai de uma filha, estou revoltado".
Seria melhor que não fosse tão difícil solidarizar-se com as mulheres, que compõem metade da população. E vale perguntar se a mulher que ajudou o pai a criar essa filha não teve influência semelhante sobre ele.
Mesmo assim, as conclusões são importantes. Elas formam uma evidência clara e rara do vínculo entre diversidade de gênero e resultados comerciais melhores, uma ligação que pesquisadores têm tido dificuldade em constatar definitivamente até agora.
Para seu estudo, Paul Gompers e Sophie Ward examinaram firmas de capital de risco e startups financiadas com capital de risco entre 1990 e 2016 e enviaram questionários por e-mail para obter informações sobre o gênero dos filhos dos sócios seniores das formas. Acabaram com um universo de 1.400 investidores, e descobriram que o fato de terem uma filha (em vez de um filho) elevou em 24% as chances de essas firmas contratarem uma investidora mulher. Nas firmas cujos sócios tinham filhas, 12% dos novos contratados foram mulheres, contra 9% nas firmas em que os sócios tinham mais filhos homens que mulheres.
As firmas em que os sócios tinham filhas mulheres apresentaram retorno 3% mais alto sobre os investimentos.
As conclusões foram especialmente interessantes quando se considera que o mundo do capital de risco – uma área pequena, insular, dominada por homens e que exerce efeito desproporcional sobre a economia – injeta bilhões de dólares em startups de tecnologia. Nada menos de 75% das firmas de capital de risco nunca teve uma sócia mulher, segundo pesquisas anteriores de Gompers e outros acadêmicos.
As firmas de capital de risco geralmente financiam empreendedores e companhias que também são predominantemente formadas por homens.
A explicação de todas essas conclusões é simples: exposição. Homens ou garotos são forçados a participar de um relacionamento real e não sexual com uma mulher – e, provavelmente, com as amigas dela. Eles ganham uma compreensão melhor dela. Isso exerce efeito transformador.
Vê-se algo semelhante ocorrer com filhos homens e suas mães. Pesquisadores já descobriram que os filhos homens cujas mães trabalham fora de casa frequentemente têm atitudes mais feministas. E as crianças que passam mais tempo em ambientes mistos, com meninos e meninas, mostram menos probabilidade de acreditar em estereótipos sobre homens e mulheres.
"Quanto mais somos expostos a pessoas que são diferentes de nós, mais vamos perdendo nossos preconceitos", disse Gompers ao HuffPost. Ele próprio tem três filhas, com 25, 21 e 19 anos de idade. "O fato de assistir aos problemas, as lutas e os esforços delas, especialmente minha filha de 25 anos, que está trabalhando numa empresa de software de Nova York financiada por capital de risco, me proporcionou insights que eu não teria se não tivesse filhas."
Resumindo: a melhor maneira de reduzir o machismo e o preconceito de gênero é conviver com pessoas do sexo oposto. Tirando Mike Pence, quem discordaria disso?
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