Entrevistas com mulheres e autoridades que fugiram do regime de Kim Jong-un revelam abusos cometidos por homens em posição de poder. "Eles nos consideram brinquedos. Estamos à mercê dos homens", relata vítima.
01.11.2018
Homens em posição de poder na Coreia do Norte abusam regularmente de mulheres sem enfrentar consequências, denunciou a Human Rights Watch (HRW) em relatório divulgado nesta quarta-feira (31/10). A violência sexual aparenta ser "endêmica" no país, afirmou a organização de defesa dos direitos humanos.
Violência sexual contra mulheres é tão comum no país que passou a ser aceita como parte da vida cotidiana, afirmou a ONG internacional baseada em Nova York.
"Violência sexual na Coreia do Norte é um segredo notório, sem resposta e amplamente tolerado", afirmou Kenneth Roth, diretor executivo da HRW. "Mulheres norte-coreanas provavelmente diriam 'Me Too' se acreditassem haver uma maneira de obter justiça, mas suas vozes são silenciadas na ditadura de Kim Jong-un", acrescentou, referindo-se à campanha internacional de denúncia contra assédio sexual #MeToo (#EuTambém).
O relatório, intitulado "Você chora à noite, mas não sabe o porquê", é o resultado de entrevistas com 54 refugiadas norte-coreanas – que deixaram o país depois de 2011, quando Kim Jong-un chegou ao poder – e oito ex-autoridades do país que fugiram do país.
Segundo a HRW, membros do alto escalão de partidos, agentes penitenciários, policiais, promotores, soldados e inspetores de mercados cometem estupros e outros abusos contra mulheres sem receberem qualquer tipo de punição.
Temendo retaliação ou o estigma social e dispondo de poucos meios para denunciar violência sexual, mulheres norte-coreanas raramente o fazem. Denunciar abusos pode até mesmo levar à punição das mulheres, incluindo espancamento, detenção e trabalho forçado.
A corrupção e o abuso de poder cometidos por homens são exacerbados pelas tradições hierárquicas e patriarcais na sociedade norte-coreana. Muitos dos abusos sexuais reportados à HRW foram cometidos por policiais ou agentes de segurança enquanto as mulheres estavam em prisões. Mulheres que trabalham nos crescentes mercados negros também são vítimas de inspetores e outras autoridades.
"Nos dias em que tinham vontade, guardas do mercado ou policiais poderiam me pedir para segui-los até uma sala vazia ou em outro lugar que escolhessem", disse uma ex-operadora de mercado. "Eles nos consideram brinquedos [sexuais]. Nós [mulheres] estamos à mercê dos homens."
Quando um funcionário numa posição de poder "escolhe" uma mulher, ela não tem opção que não seja obedecer a qualquer pedido que ele faça, seja relativo a sexo, dinheiro ou outros favores, disseram muitos dos norte-coreanos ouvidos pela HRW.
Em resposta ao relatório da HRW, a delegação da Coreia do Norte em Genebra emitiu um comunicado "rejeitando fortemente" as alegações como "fictícias".
Dados apresentados pelo governo norte-coreano a um painel da ONU sobre igualdade de gênero mostraram apenas cinco condenações por estupro no país em 2015, sugerindo que o regime não reconhece o abuso contra mulheres como um problema.
Investigadores da ONU relataram a existência de campos de prisioneiros políticos, execuções e o uso da fome como arma na Coreia do Norte, afirmando que chefes de segurança e possivelmente até mesmo o próprio Kim deveria ser alvo da Justiça internacional. De acordo com a ONU, até 120 mil pessoas estão presas em campos de prisioneiros políticos.
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