Camponesa Camponesas do Nepal precisam entender a mudança climática
Mulher nepalesa trabalha em horta cultivada com apoio da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). Foto: Sailendra Kharel.

Dang, Nepal, 17/7/2012 – Quando o marido de Arati Chaudhrary emigrou para a Índia em busca de trabalho, a responsabilidade da granja e da família caiu sobre os seus ombros magros. “Minha família (de quatro filhos) morrerá de fome se este ano trabalhar mais duro na granja. Só espero que chova bastante com esta monção” (vento úmido que sopra de junho a setembro), disse Arati à IPS, em sua aldeia de Lamahi, no isolado distrito de Dang, 500 quilômetros a oeste de Katmandu.
Especialistas acreditam que as más colheitas nas montanhas do oeste exacerbam a tendência à emigração masculina para a Índia, país que permite a livre entrada de cidadãos nepaleses e lhes concede autorização para trabalhar. “A qualidade do solo só piora, há grande escassez de água e os frequentes desastres, deslizamentos, pragas e doenças das plantações reduziram a área cultivável”, descreveu Krishna Raj Aryal, da organização não governamental Atividades de Apoio a Produtores Pobres do Nepal (Sappros).
Este país se recuperou em grande parte da severa seca de 2008-2009, a pior em 40 anos, mas o Programa Mundial de Alimentos divulgou em fevereiro um estudo mostrando que 3,33 milhões de pessoas ainda sofrem uma grave insegurança alimentar. O informe também alertava para a possibilidade de a situação se deteriorar em Karnali e nos distritos montanhosos do oeste no primeiro trimestre deste ano, com o esgotamento de reservas de alimento.
Segundo o estatal Centro de Pesquisa Agrícola do Nepal, a produção só cobre as necessidades entre três e oito meses ao ano. Na medida em que aumenta a insegurança alimentar, cada vez mais famílias nepalesas dependem de os homens encontrarem trabalho na Índia. Isto ocorre, sobretudo, nos empobrecidos distritos do oeste. Mais de 80% dos 27 milhões de habitantes do Nepal dependem da agricultura. “Sempre foi difícil prever o clima, mas as chuvas de monção se tornaram notoriamente escassas e mais imprevisíveis”, observou Arati, que não sabe ler nem escrever.
Aos membros de ONGs como Aryal preocupa que se fale de mudança climática nas cidades mas se faça pouco para capacitar as camponesas sobre como adaptarem-se aos seus efeitos ou oferecer-lhes apoio tangível. As autoridades negam que tenha faltado cuidado com o assunto e dizem que a situação vai melhorar neste país que ainda sofre as consequências dos dez anos de guerra civil que terminou com a abolição da monarquia em 2008.
O Nepal ainda deve dotar-se de uma nova Constituição que seja aceitável para todas as partes e todos os grupos étnicos. No dia 27 de maio, o primeiro-ministro, Baburam Bhattarai, anunciou que o parlamento, eleito em 2008 para redigir a lei fundamental, seria dissolvido e que haveria eleições em novembro. “Os programas de adaptação exigem uma previsão cuidadosa e levamos a sério o trabalho para minimizar os impactos da mudança climática”, declarou à IPS o vice-presidente da Comissão Nacional de Planejamento, Deependra Bhadaur Nshetri.
O Plano Nacional de Ação para a Adaptação ainda está sendo elaborado. O Ministério do Meio Ambiente prepara uma estratégia de gênero que se espera concentre-se nos problemas das famílias encabeçadas por mulheres e dependentes da agricultura. O Nepal é um dos países mais vulneráveis à mudança climática por sua topografia (eleva-se entre 60 a 8.800 metros de altitude) e sua empobrecida população, dependente dos recursos naturais.
Um estudo feito em 2007 no distrito de Rasuwa, pela Sociedade de Gestão e Identificação de Recursos (Rims) concluiu que, entre 1978 e 2007, houve um sustentado aumento da temperatura durante os verões e a temporada de monções. O estudo também concluiu que as chuvas anuais diminuíram um milímetro ao ano nesse período, com consequências para a agricultura. Apenas 17% das terras cultiváveis do Nepal contam com irrigação. Aproximadamente 80% das precipitações caem nos meses de monção, quando o país fica inundado, enquanto no resto do ano existe escassez e seca.
“Há pouquíssimo conhecimento sobre a mudança climática em zonas rurais e precisamos educar a população, em especial as mulheres, sobre o que está acontecendo”, disse Gehendra Gurung, diretor do programa de mudança climática e redução do risco de desastres da organização Practical Action. A quantidade de famílias encabeçadas por mulheres passou de 14% para 22% na última década, segundo a mais recente pesquisa de trabalho feita pelo governo e divulgada em 2008.
A divisão sexual do trabalho é acentuada no Nepal. As mulheres realizam atividades agropecuárias, trabalho remunerado e doméstico, segundo o informe Mulheres na Primeira Linha da Mudança Climática: Riscos e Esperanças desde a Perspectiva de Gênero, divulgado em 2011 pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). Nas regiões montanhosas do Nepal, as mulheres realizam 6,6 vezes mais trabalhos agrícolas do que os homens, segundo o Centro Internacional para o Desenvolvimento Integrado de Montanhas, com sede em Katmandu.
“Não há muita ênfase no componente de gênero e é preciso reconhecer isso antes de tudo”, opinou Dinanath Bhandari, da Practial Action. “Em última instância, é o governo que deve ser responsável pela implantação de programas de adaptação e mitigação. O setor voluntário está limitado a projetos-piloto e bons exemplos”, destacou Gurung. Algumas ONGs já estão realizando projetos de adaptação com mulheres. Por exemplo, um, do Fundo Mundial para a Natureza (WWF), concentra-se em melhorar a produção agrícola nos distritos montanhosos da região de Langtang, ao norte de Katmandu. Envolverde/IPS
* Este artigo é parte de uma série apoiada pela Aliança Clima e Desenvolvimento.