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terça-feira, 31 de julho de 2012


O pai ao lado


Os homens também passaram por mudanças em seus papéis sociais e investem cada vez mais na paternidade, mas ainda estão em segundo lugar na hierarquia doméstica

Fernanda Carpegiani. Ilustração Alessandra Kalko

Ilustração Alessandra Kalko
Onde tem uma mãe que trabalha e cuida dos filhos existe também um pai que trabalha e cuida dos filhos. Ou quase isso. A tão falada divisão de tarefas é uma realidade para 45% das mães que responderam à pesquisa da CRESCER (87% são casadas). Pode parecer pouco, mas é um avanço enorme se compararmos à participação paterna de algumas décadas atrás. Um estudo do governo norte-americano sobre o uso do tempo, divulgado no ano passado, por exemplo, mostrou que os homens gastam uma média de 53 minutos todos os dias se dedicando aos filhos – o triplo do que os pais de 1965 passavam com as crianças. A mudança na vida dos pais é tanta que eles já se sentem sobrecarregados. É isso mesmo, e qualquer semelhança com as mães que trabalham fora não é mera coincidência.
Um extenso estudo do Instituto da Família e do Trabalho, nos Estados Unidos, feito com 1.298 homens mostrou que esse conflito só cresce, devido ao aumento da exigência profissional, às longas horas de trabalho e a maior participação como pai. Uma das constatações foi que 60% dos pais não estavam conseguindo administrar trabalho e família.
Outro estudo norte-americano, feito com 250 pais, concluiu que 85% se sentem pressionados para ser, ao mesmo tempo, provedores e pais envolvidos na vida diária dos filhos, e que 70% gostariam de ter mais flexibilidade no trabalho. Para os brasileiros, é aí que entra mais um obstáculo: a legislação trabalhista, que dá apenas cinco dias de licença-paternidade – embora já existam projetos que preveem 30 dias. Isso e, mais uma vez, o que a sociedade espera do pai que trabalha e da mãe que trabalha. “Se um homem diz que vai faltar ao trabalho porque o filho está doente, ele é no mínimo malvisto. E de uma mulher espera-se que ela faça isso”, diz Lídia Weber, psicóloga e coordenadora do Centro de Análise do Comportamento do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Paraná.
Além desse “vício” social, difícil de mudar, há de se levar em conta que a mulher soma funções às suas anteriores. Já os homens, por outro lado, dividiram o peso de provedores com as mulheres. “Ele se descola com mais tranquilidade dos papéis tradicionais, hoje pode vivenciar a vaidade, a afetividade e isso o deixa mais leve. No sentido inverso, a mulher não”, diz a pesquisadora Clotilde Perez. Mas não pense que para eles não há nenhum conflito. Há a cobrança das mulheres por coisas que antes eles não precisavam fazer – como cuidar da casa e dos filhos – e que ainda não têm modelos nos homens mais velhos para seguir.
54% FLEXIBILIZAM REGRAS POR TRABALHAR FORA 
E 72% ACHAM QUE ISSO INFLUENCIA NA EDUCAÇÃO

 
Mãe no turno da noite
Eduardo Nascimento, 30 anos, bancário e pai de Enzo, 2, tenta encontrar um caminho. Além de ir a todas as consultas do pediatra, é ele quem cuida do filho à noite, enquanto a mulher, que também é bancária, está na faculdade. “Ela chega muito tarde, então eu sou a mãe dele no período da noite. Quer dizer, a mãe não, eu sou o pai.”
Sim, os homens – e a sociedade – ainda atribuem naturalmente essas tarefas às mulheres. Por isso, a confusão de Eduardo. O espaço doméstico, que sempre foi e ainda é dominado por elas, precisa ser conquistado por eles, e nem sempre isso é tão fácil quanto parece. “Depois que elas saíram para trabalhar, tiveram dificuldade de reformular esse domínio doméstico e deixar os homens fazerem mais coisas. E do jeito deles”, explica a historiadora Mary Del Priore.
Em vez de compartilhar as tarefas, a mãe puxa a responsabilidade para si e trata o pai como um auxiliar. “Ajudar significa fazer exatamente o que elas querem que eles façam do jeito delas. Eles realmente resistem, pois querem fazer do jeito deles e não apenas obedecer”, diz a antropóloga Mirian Goldenberg.
Isso acontece porque a mãe julga saber a melhor maneira de cuidar dos filhos e da casa, e acha que o homem, bem, no mínimo, ele não tem tanto conhecimento de causa quanto ela. “Todas as mulheres acham que eles são incompetentes, não só a mãe dos filhos dele, mas também a avó, a babá, a empregada doméstica. É como se a função de criar os filhos fosse exclusivamente feminina e só elas tivessem capacidade e competência para isso”, afirma Mirian. Mas paternidade é assunto de homem, segundo a psicóloga e escritora Lídia Aratangy. “A mulher não entende de paternidade. Ele quer ser o pai que ele quer ser, não o que ela acha que ele deve ser.”
É por isso que até na hora de dar bronca nos filhos as mães centralizam o trabalho. Na pesquisa da CRESCER, 22% das mulheres contaram que são elas que impõem sozinhas os limites em casa, e 2% disseram que essa função é apenas do marido (o restante divide a tarefa).
O problema é que, hoje, mais do que nunca, dar bronca e impor limites não quer dizer colocar de castigo (muito menos dar uma palmada!), mas conversar, conversar e conversar... O que, na conta das tarefas diárias das mães, acaba consumindo um tempo importante. “O pai não é mais aquela figura de autoridade, esse é mais um papel que ele viu enfraquecer”, diz Clotilde.
E se a situação geral fosse diferente e tudo funcionasse a favor do homem, será que a divisão seria igualitária? Talvez não – e talvez isso não seja um problema tão grande. Segundo dados da nossa pesquisa, apenas 10% das mulheres fazem todo o trabalho sozinhas.
Na casa do engenheiro civil Marcelo Monteiro, 40 anos, os afazeres domésticos ficam a cargo da empregada-babá e os cuidados com Marcela, 5 anos, são divididos entre os pais. “Não vou falar que é meio a meio, minha esposa fica com uma carga maior”, diz. Mas é ele quem cozinha e pega a menina na casa dos avós, que a buscam na escola enquanto os pais estão no trabalho, além de ficar com ela junto com a esposa todas as noites. E se precisar fazer algum serviço de casa, o único que ele não sabe e não gosta é passar roupa. Para esses pais, o segredo da harmonia está em dividir as tarefas de uma forma mais intuitiva e condizente com a realidade de cada um.
Um para cada lado
A separação pode trazer alguns desafios a mais na hora de compartilhar tarefas. Metade das nossas entrevistadas que são separadas tem a guarda dos filhos e divide apenas os finais de semana com o ex-marido. Não é uma surpresa, portanto, que 88% das mães reclamem de ter que arcar sozinhas com a educação e os limites porque o tempo com o pai é só diversão. Afinal, é ela quem está lá todos os dias, não só para aguentar as birras, mas também para ajudar com a lição de casa, fazer comida, colocar para dormir, enfim, a rotina básica que é seguida durante a semana. “Como a criança mora com a mãe, é normal que ela tenha uma responsabilidade maior, não tem como dividir igualmente. Mas, se os pais são bem resolvidos com a separação, é possível chegar a um consenso. O homem não deixou de ser pai, então não pode se abster do papel de educar os filhos enquanto estiver com eles”, afirma a psicóloga Rita Calegari. A relação do ex-casal pode facilitar – ou dificultar... – alguns acordos, como o que pode e o que não pode ser feito mesmo nos dias de lazer. Por outro lado, a antropóloga e pesquisadora Mirian Goldenberg diz que enxerga muitas boas relações entre pai e filho de casais separados. “É que aí o homem tem a chance de fazer as coisas do jeito dele, como ele acha certo. E isso pode ser muito bom.”
http://revistacrescer.globo.com/Revista/Crescer/0,,EMI276502-18514,00-O+PAI+AO+LADO.html

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