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sexta-feira, 3 de maio de 2013


A política de filho único ameaça deixar a China velha antes de ficar rica

E mostra os perigos das políticas de controle populacional pelos governos


RAFAEL CISCATI

CADA VEZ MAIS RARO Um bebê no colo da mãe em Pequim. A taxa de filhos por mulher na China  desabou desde os anos 1990 (Foto: Ed Jones/AFP)
CADA VEZ MAIS RARO
Um bebê no colo da mãe em Pequim. A taxa de filhos por mulher na China desabou desde os anos 1990
(Foto: Ed Jones/AFP)
"Quanto maior o número de filhos, maior a felicidade”, reza um ditado chinês de 2 mil anos. Desde os anos 1990, os chineses têm cada vez menos filhos. Como consequência, em 2012, pela primeira vez em meio século, a população em idade de trabalhar encolheu. Se a tendência se mantiver, daqui a 12 anos a Índia assumirá o título de país mais populoso do mundo. O fenômeno ameaça outro símbolo da China autoritária e pujante das últimas décadas: a política do filho único.

Criada em 1979, a política determina que o casal com um filho pague uma multa se quiser uma segunda criança. O valor varia de acordo com a região – em Xangai, são US$ 17.300. O governo força abortos, no caso das famílias sem dinheiro. Em 2012, veio a público a foto de uma mãe de 23 anos, Feng Jianmei, ao lado do filho morto, abortado no sétimo mês de gravidez. A lei que criou a política previu seu fim em 2010, mas ela vem se mantendo – agora, sob ataques cada vez mais duros.


Intelectuais chineses, no país e no exterior, criticam a política com vee­mência crescente. As esperanças de mudança se renovaram com a troca de governo (o atual presidente, Xi Jinping, assumiu em março) e com uma recente alteração na estrutura da burocracia. Foram unidos os departamentos de controle de natalidade e saúde pública. Isso deve diminuir o poder dos cerca de 500 mil burocratas encarregados de conter os nascimentos. O governo nega que isso represente uma mudança de rumo e afirma que a China ainda precisa controlar o tamanho da população, a fim de conter a demanda por serviços e o consumo dos recursos naturais.

Quando criada, a política – embora autoritária – parecia tecnicamente explicável. A população crescera 78% entre 1950 e 1980, de 551 milhões para 983 milhões. “Aquela imensa população poderia ser uma vantagem para a economia, mas também poderia destruir o país”, afirma a economista Jane Golley, diretora do Centro Australiano de Estudos sobre a China. A ideia era chegar rapidamente ao período de bônus demográfico, em que um país tem menos crianças e mais jovens e adultos (o Brasil está num momento parecido). O governo calcula ter evitado 400 milhões de nascimentos. O grande número de trabalhadores pode ser responsável por um quarto do crescimento chinês desde os anos 1980, segundo o Banco Mundial. Há, porém, dois problemas com essa política.

Em primeiro lugar, demógrafos questionam a explicação da queda dos nascimentos. Para eles, a prosperidade foi mais importante que a política do filho único na redução de nascimentos. “Desde os anos 1990, a principal força a reduzir a taxa de fecundidade é o desenvolvimento”, diz Zuo Xuenjin, da Academia de Ciências de Xangai. À medida que o país prosperou, tornou-se mais caro educar uma criança. Mulheres mais ocupadas e instruídas decidiram ter menos filhos. Avanço semelhante ocorreu em outros períodos, em outros países emergentes, como Coreia do Sul e Brasil (aqui, a taxa de fecundidade caiu de 6,2, em 1960, para 1,9, em 2010). A Índia vem experimentando queda na taxa de fecundidade sem recorrer a medidas restritivas. Há quem afirme que o controle já era exagerado quando foi concebido. Num estudo publicado em 2012, o demógrafo Yong Cai, da Universidade da Carolina do Norte, sustenta que a China passou pela transição demográfica já durante os anos 1970.

A queda da população economicamente ativa alerta para um segundo problema na lógica do controle de natalidade. Com nascimentos em queda, a população envelhece rapidamente, produz menos e exige mais gastos em saúde e previdência. Para contornar o problema, alguns estudiosos apostam até na criação de uma política de dois filhos por casal. Ou, num futuro próximo, em políticas de incentivo à natalidade. Mais provavelmente, a China precisará encontrar formas de tornar seus trabalhadores mais produtivos. O país foi bem-sucedido ao forçar uma transição demográfica mais rápida. Agora, precisa ter pressa também para lidar com suas consequências.

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