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sexta-feira, 17 de maio de 2013


Exploração sexual infantil é tema de documentário

por Amelia Gonzalez
Uma das inúmeras favelas em Manila, capital filipina: foco de doenças tropicais
Homens ocidentais,  gordos e de cabelos grisalhos, conduzem pelas mãos uma ou duas adolescentes, quase crianças, por ruas movimentadas  de Manila, a capital filipina. A cena não é o que parece. O gesto, que sugere um laço familiar, a mão zelosa cuidando da mão frágil, na verdade retrata uma abominável intrusão de humanos doentes em sua busca de prazer na cultura alheia. Não querem se expor, agir dessa forma perto dos seus.  Então usam seu poder – ter  capital numa região miserável —  para se saciar.
Não é um caso, não são dois casos, são centenas de  milhares. Graças à globalização, hoje o fenômeno atravessa continentes e chega às nossas casas. Está indo ao ar daqui a pouco, às 17h,  pelo canal pago CNN, o documentário “The Fighter”, que registra a atuação de Cecilia Flores-Oebanda nas Filipinas.  Oebanda é  uma pioneira na defesa dos direitos humanos e se arrisca quase todos os dias para tentar livrar meninas das garras de homens que as transformam em escravas, quer sexuais, quer domésticas.
Mas não estamos falando de nada novo. E, a menos que se queira cair numa retórica improdutiva, quase ladainha, gosto de tentar ver o fenômeno de maneira diferente. Falamos aqui sobre mundo sustentável, o que inclui a busca por uma vida mais digna.  Os números mostrados no documentário assustam: estima-se que mais de cem mil garotas estejam envolvidas no comércio de sexo na maior nação de língua inglesa da Ásia.  O que há em torno dessa questão que possa servir como base para pensamento? O filme dá uma dica: o país é eminentemente católico e seus deputados estão mais interessados em criar legislações que impeçam o uso de contraceptivos do que em punir quem escraviza crianças e adolescentes.
A miséria, a extrema densidade populacional, seriam outros fatores aliados desse crime, deduz o documentário.  Cecilia Oebanda  tem uma fundação, a Visayan Forum, e já montou uma estrutura para combater o crime de exploração de meninas e adolescentes.  Deu certo,  tem vários casos de sucesso. O filme mostra a reunião de meninas resgatadas e se percebe que elas estão felizes, brincando,  como crianças. Recentemente, Cecilia buscou a ajuda do pugilista Manny Pacquiao, uma espécie de ídolo local, e essa história de uma parceria que poderia ter dado certo, mas não deu, é contada no documentário.
Cecilia Oebanda: "Não estamos à venda"
Cecilia deixa a dica para uma outra possível interpretação dos fatos quando, emocionada, dá um recado para câmeras de uma cultura que não é a sua:
— Os filipinos têm dignidade. Não estamos à venda.
O caso da Ásia é extremo. Mas aqui no Brasil também temos muitos. Aliás, no mundo inteiro:  desde que existe humanidade, há também os sujeitos e os assujeitados.  O que é nosso, contemporâneo, talvez seja a maior inquietude com o tema. E a chance, que nos dá a globalização, de torná-lo mais público do que privado.
Tinha pensado em escrever hoje sobre o que ocorreu depois do acidente lá em Bangladesh (ver post aqui)  envolvendo trabalhadores da indústria têxtil. É também um caso de subordinação, de homens usando o poder do capital, aproveitando a fragilidade de outros para lucrarem mais. Nesse caso, a sociedade civil criou forças, foi para as ruas, gritou, e a mídia também ajudou bastante.  Por conta disso, o governo local decidiu criar regras e até aumentar os salários: está fazendo exigências que nunca fizera aos fabricantes.  Há um acordo pronto para ser assinado entre as cerca de 30 redes varejistas (segundo reportagem publicada no “Financial Times”) mas a questão agora é  conseguir que as empresas se entendam para pôr fim a séculos de exploração.
Convocar o setor empresarial, capitalista,  para a briga,  talvez seja um caminho também para os casos de explorações sexuais.  Vale tentar, mas nem sempre dá certo.  Empresas (não sei se posso dizer a maioria),  costumam ter atitude de leão quando se trata de finanças e agir como um gatinho indefeso quando o assunto gira em torno de pessoas pobres.
Segundo Aron Belinky, que hoje coordena o Programa de Desenvolvimento Local do Centro de Estudos em Sustentabilidade  da Fundação Getúlio Vargas e esteve na equipe de elaboração do texto da ISO 26000 (de Responsabilidade Social),  é fato que os direitos humanos são sempre secundários nas agendas, tanto das empresas quanto dos governos:
— O licenciamento de uma grande obra pode ser barrado ou sofrer grandes condicionantes em função de questões ambientais, mas quando vai para questões ligadas aos direitos humanos não temos um marco legal para isso, apesar de ser notório o impacto que as grandes obras causam também nas vidas das pessoas. Essa falta de marco regulatório tem, em certa medida, a ver com a dificuldade de se relacionar uma coisa com a outra, e passa-se a ver quase como uma coisa natural o aumento da prostituição e da exploração sexual quando um grande empreendimento se instala numa comunidade pobre.  O que ocorre é que, mesmo em grandes cidades onde não há novos empreendimentos, esse fenômeno existe — disse ele.
Não é por ser secular que não se queira combatê-lo, garante Belinki. Para isso, a instituição onde trabalha se juntou a parceiros fortes, como a ONG Childhood (que foi criada em 1991 pela Rainha Sílvia da Suécia) e pretende discutir o espinhoso assunto com as grandes empresas, chamando-as para ajudar. Vai ter muito trabalho pela frente, e não precisará atravessar o Oceano.
Voltando ao documentário, que será exibido em duas partes, hoje e amanhã, às 17h e 23h e voltando a Manila, segunda cidade mais populosa do arquipélago.  Estive lá em 2008 fazendo uma reportagem e trago na memória cenas fortes de muita miséria e desigualdade.  As favelas são horizontais e se espalham por becos. Quase não há rede de esgoto e o calor úmido é uma porta de entrada para doenças tropicais, a dengue entre elas.
Esse quadro pode ajudar o aliciamento de garotas, sem dúvida. Uma delas conta que a maior demanda é pelas virgens, que acabam recebendo uma quantia maior, em torno de 25 dólares, pela primeira experiência sexual. Se não tivesse o aliciador, garante Cecília, as meninas estariam tentando outros meios de fugir da miséria. Mais complexos, mais dignos.
Crédito das fotos: Amelia Gonzalez e Divulgação

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