por Amy Fallon, da IPS
Kampala, Uganda, 26/2/2014 – Os homossexuais de Uganda se preparam para uma onda de prisões e incidentes de assédio, depois que o presidente Yoweri Museveni promulgou uma draconiana lei contra o homossexualismo. Após a aprovação, um homem gay de Kampala disse à IPS que agora não há nada que se possa fazer, e que só resta deixar o país em busca de um lugar mais seguro. “Ninguém diz ‘quero ser gay’, especialmente aqui, em Uganda. Simplesmente nasce assim. Não escolhe”, afirmou.
A Lei Anti-Homossexualidade intensifica os castigos existentes para quem seja pego mantendo relações com pessoas do mesmo sexo, e prevê períodos de prisão que chegam a prisão perpétua por “homossexualidade agravada”, o que inclui sexo com menor de idade ou com um casal que seja HIV positivo. O texto também estabelece o “crime de homossexualidade”, pelo qual uma pessoa pode ser condenada à prisão pelo resto de sua vida.
O advogado John Francis Onyango, especialista em direitos humanos que representa muitos ugandeses da comunidade de lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e intersexuais (LGBTI), contou que “definitivamente” viu um aumento das prisões contra esse setor da população desde que o projeto foi aprovado no parlamento, no dia 20 de dezembro.
“Também há muitas pessoas gays que temem por sua segurança, sua liberdade e sua possibilidade de associar-se”, contou o advogado à IPS, acrescentando que atualmente representa a comunidade LGBTI nos tribunais em vários casos. Antes de o projeto se converter em lei, essa nação já tinha algumas outras leis contra quem fosse pego mantendo relações homossexuais.
Museveni desafiou a condenação internacional assinando a lei, no dia 24, durante uma cerimônia pública na sede do governo. Isto surpreendeu a muitos, pois Museveni havia dito no final da semana passada que deixaria em suspenso a legislação enquanto buscava assessoria com cientistas dos Estados Unidos para saber se a homossexualidade é uma manifestação natural ou é educada.
Mas o legislador Sam Okuonzi, presidente da Comissão de Relações Exteriores do parlamento, explicou à IPS que Museveni foi alvo de uma “enorme pressão” de parte de uma crescente quantidade de legisladores, líderes religiosos e cidadãos em geral para que promulgasse a lei. “Não há nada que tenha unido esse país de modo tão absoluto e forte como esse projeto”, afirmou.
Depois que Museveni aprovou o texto, outro legislador, Stanley Omwonya, declarou à IPS que, “realmente se trata de preservar nossa cultura. Queremos que nosso povo tenha retidão moral”. Ativistas pelos direitos humanos questionam a lei argumentando que viola os padrões internacionais de direitos humanos e que é inconstitucional.
Frank Mugisha, ativista ugandense pelos direitos dos gays e ganhador do Prêmio Robert F. Kennedy para os Direitos Humanos 2011, postou no Twitter: “Ao assinar o projeto antigay, Museveni faz um gol contra. Desafiaremos esta lei e a anterior”. Na mesma rede social, Mugisha escreveu: “@YKMusevenii sabe que revogaremos essa lei no tribunal constitucional e que, com nossa determinação, nada nos deterá”.
Onyango apontou que a nova lei também apresenta dúvidas sobre o espaço que as organizações da sociedade civil terão para operar. Segundo a lei, se uma organização não governamental “promover a homossexualidade” poderá ser fechada e seus diretores ou líderes poderão ser julgados.
Em um comunicado divulgado no dia 24, a organização Human Rights Watch declarou que Museveni desferiu “um golpe drástico à liberdade de expressão e de associação em Uganda”. Há apenas uma semana o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, alertou Museveni que promulgar a lei complicaria a “valiosa relação com Uganda”. No passado, Obama enviou soldados norte-americanos como assessores a Uganda para ajudar o país a combater o rebelde Exército de Resistência do Senhor (LRA) e capturar seu líder, Joseph Kony. O LRA é responsável por assassinatos em massa, violações e sequestros no norte de Uganda.
Canadá, Irlanda, Holanda, Alemanha, União Europeia e o arcebispo anglicano sul-africano Desmond Tutu, prêmio Nobel da Paz, também divulgaram comunicados ou se manifestaram sobre o projeto de lei. Alguns disseram que, entrando em vigor, pode provocar cortes na ajuda que Uganda recebe. Segundo informado no dia 24, Noruega e Dinamarca anunciaram de imediato que congelaram ou desviaram sua assistência, enquanto a Áustria afirmou que avaliava a sua assistência.
Canadá, Estados Unidos e a Organização das Nações Unidas (ONU) divulgaram um forte comunicado condenando a lei. A União Europeia a qualificou de “draconiana”, enquanto a Grã-Bretanha declarou que está “profundamente entristecida e desiludida”. O advogado ugandense Adrian Jjuko apontou à IPS que o país deveria se preparar para uma redução da ajuda que recebe. Mas enfatizou que Uganda precisa de “sanções que não afetem as pessoas comuns, mas as que aprovaram a lei”.
“Há alguns aspectos da ajuda que poderiam ser cortados, em lugar de outros. Não cortar a ajuda destinada à educação”, pontuou Jjuko, diretor-executivo do não governamental Fórum para a Conscientização e a Promoção dos Direitos Humanos. “Talvez em termos de gasto militar e coisas assim… se é esse o tipo de ajuda que se corta, é o corte que se sentirá, por ir diretamente para o presidente, seus interesses e ambições pessoais, em lugar de ir para o povo de Uganda”, acrescentou.
Jjuko ressaltou que reduzir a ajuda apenas pela aprovação da nova lei seria fazer vista grossa para outras violações dos direitos humanos cometidas em Uganda. “A questão gay não é o único assunto neste país. Vistos em sua totalidade, os antecedentes de Uganda em matéria de direitos humanos está baixando”, acrescentou.
O que diz a Lei Anti-Homossexualidade
No contexto da nova lei, quem tiver condutas homossexuais será condenado à prisão perpétua.
A “tentativa de cometer homossexualidade” implicará uma sanção de sete anos, assim como por “ajudar e instigar” a homossexualidade.
Uma pessoa que “mantiver uma casa, quarto, série de quartos ou local de qualquer tipo com fins de homossexualidade” também enfrentará sete anos de prisão.
A lei também penaliza com prisão a “promoção” da homossexualidade.
Fonte: Human Rights Watch
Envolverde/IPS
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