Para a filósofa Márcia Tiburi, as relações sociais estão atravessadas pelo ódio
THAIS LAZZERI
07/08/2015
“Ninguém falou comigo. Não explicaram o que estavam fazendo, não olhavam pra mim. Eu não existia ali.” Relatos semelhantes ao da leitora Aretha Guimarães chegaram pela campanha #partocomrespeito. Para entender o que está por trás do desrespeito às gestantes por profissionais de saúde, ÉPOCA conversou com a filósofa Márcia Tiburi. “A violência contra a grávida é a mesma que qualquer grupo fragilizado enfrenta”, diz. “É assustador”.
ÉPOCA – Por que esses profissionais de saúde, que deveriam estar imunes às pressões, cometem abusos?
Márcia Tiburi – Em primeiro lugar, precisamos considerar que a gente vive numa sociedade em que o desrespeito é uma constante cultural. A gente vive numa cultura de violência simbólica e física. Mas uma violência específica e mais forte é a contra a mulher. Por que um indivíduo capacitado para cuidar, percebendo uma pessoa fragilizada, que é o caso das gestantes, age numa outra direção? No âmbito da violência contra a mulher, as mulheres fragilizadas despertam ainda mais o desejo de praticar violência. Isso tem a ver com uma perspectiva subjetiva da nossa cultura, intimamente relacionada a um ponto de vista fascista em relação ao outro. Fascismo é uma onda de ódio flutuante na cultura. Hoje em dia vivemos nessas ondas promissoras de ódio. Nossas relações sociais estão atravessadas por esse sentimento. Grupos fragilizados, sejam eles quais forem – negros, pessoas com deficiência, pobres, trans, gestantes -, são alvos mais fáceis desse ódio.
Márcia Tiburi – Em primeiro lugar, precisamos considerar que a gente vive numa sociedade em que o desrespeito é uma constante cultural. A gente vive numa cultura de violência simbólica e física. Mas uma violência específica e mais forte é a contra a mulher. Por que um indivíduo capacitado para cuidar, percebendo uma pessoa fragilizada, que é o caso das gestantes, age numa outra direção? No âmbito da violência contra a mulher, as mulheres fragilizadas despertam ainda mais o desejo de praticar violência. Isso tem a ver com uma perspectiva subjetiva da nossa cultura, intimamente relacionada a um ponto de vista fascista em relação ao outro. Fascismo é uma onda de ódio flutuante na cultura. Hoje em dia vivemos nessas ondas promissoras de ódio. Nossas relações sociais estão atravessadas por esse sentimento. Grupos fragilizados, sejam eles quais forem – negros, pessoas com deficiência, pobres, trans, gestantes -, são alvos mais fáceis desse ódio.
ÉPOCA – Quanto a qualidade de vida desses profissionais influencia esse tipo comportamento? Relatos de cargas horárias longas, falta de estrutura física para o trabalho e baixos salários são queixas comuns de quem trabalha na área da saúde.
Márcia – Isso é superimportante. A gente precisa reconhecer que esses profissionais também são alvos. Esse profissional também é mal tratado por um sistema. Ele é desvalorizado e aprende a desvalorizar o outro como pessoa. Conheci um enfermeiro que trabalhava em dois hospitais e voltava para casa uma vez por semana. É importante a gente ter noção que essas pessoas são boas, elas não estão propensas a propagar ódio. São pessoas quaisquer que, sob pressão, não conseguem ter o melhor rendimento em questões éticas.
Márcia – Isso é superimportante. A gente precisa reconhecer que esses profissionais também são alvos. Esse profissional também é mal tratado por um sistema. Ele é desvalorizado e aprende a desvalorizar o outro como pessoa. Conheci um enfermeiro que trabalhava em dois hospitais e voltava para casa uma vez por semana. É importante a gente ter noção que essas pessoas são boas, elas não estão propensas a propagar ódio. São pessoas quaisquer que, sob pressão, não conseguem ter o melhor rendimento em questões éticas.
ÉPOCA – O desrespeito generalizado tem a ver com as formas de produção do trabalho?
Márcia – Tem sim. Não temos condições de fazer nada melhor se não temos tempo, um salário razoável, perspectiva. Uma população de trabalhadores que é pressionada, ameaçada, assediada moralmente não vai produzir da mesma forma. Estamos numa sociedade que não privilegia a experiência humana. Tudo é mercadoria, e cada mercadoria tem um valor. As pessoas estão valendo menos que as coisas. Quem é o outro para nós? Um objeto que já não importa. É perverso.
Márcia – Tem sim. Não temos condições de fazer nada melhor se não temos tempo, um salário razoável, perspectiva. Uma população de trabalhadores que é pressionada, ameaçada, assediada moralmente não vai produzir da mesma forma. Estamos numa sociedade que não privilegia a experiência humana. Tudo é mercadoria, e cada mercadoria tem um valor. As pessoas estão valendo menos que as coisas. Quem é o outro para nós? Um objeto que já não importa. É perverso.
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