Aspectos Teóricos e Metodológicos
Guia para Capacitação em Depoimento Especial
de Crianças e Adolescentes
O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) tem muitos
motivos de satisfação por ter participado da elaboração deste livro-guia destinado à
capacitação dos vários profissionais envolvidos na escuta de crianças e adolescentes
vítimas de violência sexual. Esses profissionais têm a dupla missão de proteger
crianças e adolescentes e, ao mesmo tempo, tomar as providências para a devida
responsabilização daqueles ou daquelas que praticam a violência.
Esta obra apresenta um conjunto de subsídios, ainda inéditos no país, para
orientação e treinamento de profissionais que atuam na promoção e na defesa dos
direitos da criança e do adolescente. Além de ser uma primeira coletânea substancial
de textos para a capacitação em Depoimento Especial, o livro-guia inova pela
abrangência de seu conteúdo que oferece elementos teóricos e metodológicos para
os vários atores da rede de proteção de crianças e adolescentes, incluídos aqueles
pertencentes aos sistemas de segurança e justiça, que efetivamente realizam de
forma cotidiana a escuta.
Esta publicação é fruto do esforço coletivo de pessoas com muita experiência
em temas relacionados à infância e adolescência e comprometidas com o respeito e
com a proteção dos direitos da criança e do adolescente.
A publicação deste livro-guia é uma excelente maneira de celebrar o 25o
aniversário da Convenção sobre os Direitos da Criança das Nações Unidas, um
dos marcos legais mais importantes na história dos direitos humanos. Em seu
artigo 12, a Convenção assegura o respeito à opinião de crianças e adolescentes
sobre “todos os assuntos” a elas relacionados, e, em particular, o direito de “ser
ouvida em todo processo judicial ou administrativo” que lhes afetem. Por sua vez,
qualificar a ação de profissionais que trabalham com crianças e adolescentes vítimas
ou testemunhas foi um compromisso que o Estado brasileiro assumiu ao ratificar,
em 2004, o Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança, que
trata da venda de crianças, prostituição e pornografia infantil.
Os Estados Partes adotarão medidas para assegurar treinamento
apropriado, em particular treinamento jurídico e psicológico,
às pessoas que trabalham com vítimas dos delitos proibidos
pelo presente Protocolo (Art. 8o
, Inciso 4).
Em suporte à Convenção sobre os Direitos da Criança e ao Protocolo
correspondente, o Conselho Econômico e Social das Nações Unidas estabeleceu
em suas diretrizes que
a formação adequada, educação e informação devem ser
disponibilizadas aos profissionais que trabalham com crianças
vítimas e testemunhas, com vistas a aperfeiçoar métodos
especializados, abordagens e atitudes, a fim de proteger e lidar
de forma eficaz e sensível com crianças vítimas e testemunhas.
(Art. 40 Resolução 20/2005 da ECOSOC).
Esta iniciativa, portanto, nos permite dar concretude ao nosso mandato de
apoiar e acompanhar a implementação da Convenção sobre os Direitos da Criança.
Ela também nos permite ser parte de um processo de construção de procedimentos
judiciais amigáveis, centrados na proteção dos direitos da criança e alinhados às
mais recentes construções da normativa internacional elaborada pelas Nações
Unidas com a qual estamos comprometidos.
Brasília, outubro de 2014.
Gary Stahl
Representante do UNICEF no Brasil
É com alegria que a Childhood Brasil e as organizações parceiras
disponibilizam a todos os interessados na temática da proteção e do respeito aos
direitos da criança e do adolescente o livro A escuta de crianças e de adolescentes vítimas
ou testemunhas de violência sexual: aspectos teóricos e metodológicos. O propósito desta obra
é servir como o primeiro material de referência para a capacitação de profissionais
em escuta especializada de crianças e de adolescentes, incluindo o Depoimento
Especial.
Os artigos que fazem parte desta publicação distinguem os vários tipos de escuta
e abordam desde concepções de infância e de adolescência até a escuta de crianças e de
adolescentes pelos órgãos da rede de proteção e de defesa de seus direitos, incluindo
tópicos como a preparação de crianças e de adolescentes antes e o acompanhamento
após seus depoimentos nos órgãos de segurança e de justiça. Ademais, na perspectiva
dos cuidados aos cuidadores, este material enfatiza a necessidade, pouco discutida,
de atenção aos profissionais que realizam escuta de crianças e de adolescentes sobre a
violência sexual da qual foram vítimas ou testemunhas.
A abordagem realizada pelos autores concebe a escuta de crianças e de
adolescentes, além de um procedimento ético, político e pedagógico, como uma
atitude ontológica de reconhecimento da criança e do adolescente na condição
de pessoas em si mesmas, em sua igualdade e em suas diferenças em relação aos
adultos, conferida pela condição peculiar de desenvolvimento. Tal concepção
é condição essencial para a ocorrência de uma verdadeira e profunda escuta da
criança e do adolescente.
O processo de elaboração deste material consistiu em um ato de parceria.
A equipe da Childhood Brasil, particularmente do Projeto Depoimento Especial,
fez uma primeira identificação de conteúdos e de conteudistas e organizou uma
oficina na qual os autores foram solicitados a apresentar as ementas de seus
capítulos, contendo conteúdo programático, estrutura do capítulo e bibliografia
básica de referência. Esse rico material foi apresentado e debatido por todos os
conteudistas participantes da oficina, em um processo de intercâmbio muito
produtivo que contribuiu, substancialmente, para a qualificação de cada uma das
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Escuta de crianças e adolescentes em situação de violência sexual: aspectos teóricos e metodológicos
propostas de capítulos apresentadas. Também nessa oficina, foram identificados
outros conteúdos não previamente incluídos no projeto original, os quais se buscou
incorporar no projeto de publicação.
Sucedeu-se, a essa primeira oficina, um período de dois meses para diálogos,
por meio eletrônico, entre os diversos autores, trabalho esse que culminou em uma
segunda oficina sobre a primeira versão dos capítulos já elaborados. A metodologia
utilizada nessa nova oficina previu que cada um dos autores se tornasse comentador
de dois outros capítulos diversos do de sua própria autoria. Esse intercâmbio,
muito bem-avaliado por todos os participantes, permitiu que todos os capítulos
passassem pela primeira crivagem de uma audiência qualificada. O resultado foi
uma substantivação das propostas originais.
Os autores, em um curto espaço de tempo, buscaram incorporar as
sugestões recebidas pelos pares. Os capítulos foram, então, entregues à equipe
organizadora deste livro que estamos chamando aqui, informalmente, de guia de
referência para capacitação em escuta de crianças e de adolescentes. Essa equipe
fez uma revisão técnica do conteúdo, solicitou ajustes e concluiu o material na sua
fase de produção técnica. Da elaboração do projeto original à fase de editoração do
material, foram basicamente dois anos de trabalho.
Para finalizar, uma palavra sobre os autores copartícipes desta obra:
profissionais experientes, da mais alta respeitabilidade, dos vários campos do
saber, articulados em uma construção inter e multidisciplinar, todos muito
comprometidos com o respeito e com a proteção dos direitos da criança e do
adolescente, cujas contribuições tiveram caráter voluntário.
A todos aqueles que contribuíram com esta produção, os nossos mais
sinceros agradecimentos.
Ana Maria Drummond
Diretora-Executiva
Childhood Brasil
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