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terça-feira, 11 de agosto de 2015

Amor existe? Cura? Dói? Justifica nossa existência?

Amor (Foto: Thinkstock/Getty Images)


Uma das expressões da sexualidade, o amor, é responsável por muito mais ações orgânicas do que você deve imaginar

JOÃO LUIZ VIEIRA

06/08/2015

"Serei só tua, somente tua, podes crer amor

Serei só tua, somente tua, minha vida, meu amor

Pode o mundo me oferecer um outro alguém

Serei só tua, somente tua, de mais ninguém

Serei só tua (serás só minha), somente tua (serás só minha), podes crer amor

Serei só tua (serás só minha), somente tua (serás só minha), minha vida, meu amor

Pode o mundo me oferecer um outro alguém

Serei só tua, somente tua, de mais ninguém

E quando a idade já com saudade me disser então

Que eu não errei, sempre te amei de coração 

Eu bem velhinha de cabecinha bem branquinha

Direi assim: serei só tua até o fim

Serei só tua, somente tua, de mais ninguém

(Até o fim, até o fim amor)"

Quanta dedicação a uma pessoa traduz essa letra de música, assinada pela dupla Nelson Sheffick e Rômulo Paes, entregue para Dalva de Oliveira nos anos 1950? “Ai, eu me dedico demais ao amor”, já dizia Dalva (1917-1972), uma das intérpretes mais viscerais da música popular brasileira. A mulher que amou demais alguns homens, especialmente Herivelto Martins (1912-92), e também compôs canções sobre vingança e ressentimento e ruborizou os rapazes que se viram expostos por ela. O amor, quando adoentado, produz muita dor. Ou será que não?
Inspirado no sentimento mais nobre produzido pela nossa espécie, decidi falar de outra expressão da sexualidade. O amor existe? Desde quando? Quem sentiu amor primeiro? Todo amor se justifica em si? Ele dói? Ele cura? Ele mexe no organismo? Ele destrói? A mulher ama mais que o homem? Será que alguém ama melhor que o outro? Vou tentar responder a todas essas questões complexas com a ajuda de Ana Lúcia Nogueira Braz, doutora em psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas/PUC, e autora do livro O significado e a importância do amor - Um estudo fenomenológico (Editora Casa do Novo Autor, 178 páginas).
Para mim, amar pode ser entrega sem expectativa de retorno. Pode ser perder. Para muitos, ganhar. Para outros tantos, nada sem apetite sexual. Há quem não saiba do que se trata. Há quem pense que saiba. E há os que nem querem saber. Amor, para mim, é negócio que inclui afeto e sexo. Perceba como os relacionamentos sempre estão interligados por interesses mútuos. Nem sempre conscientemente, muito menos articulados a boas intenções. O certo é que eu posso não existir sem você, mas, se juntos, o que você me acrescenta? E o que posso oferecer em troca? Amar é olhar para fora, para o outro, e desabar por dentro, em busca da rendição condicional. 
Para a senhora, Ana Lúcia o que, afinal, é o amor, se é que ele existe?
Ana Lúcia - O amor existe, sim. Ele é a força de vida, os etólogos (que estudam a origens da espécie humana) afirmam que existe uma “adesividade” biológica da espécie humana que hoje denominamos Amor. Ele existe a nível biológico, psíquico e social.

O que seria essa “adesividade”?

Ana Lúcia – Há uma tendência biológica de ligação entre os seres humanos, somos, assim, organicamente preparados para amar. Inicialmente com os filhos, depois parceiros e os demais.

Onde o amor começou? Veio da mitologia? Existe um registro histórico do surgimento do amor?

Ana Lúcia - Existem vários registros, desde a mitologia até hoje. A mitologia já relata a existência do amor na explicação do início do mundo, a teogonia. O amor (o deus Eros) é um deus primordial, ou seja, ele é o deus que uniu o Céu e a Terra e tudo que possuísse vida. A vida na terra, portanto, segundo a mitologia greco-romana foi possível por intermédio de Eros. Platão também discorreu sobre o assunto em O Banquete (escrito por volta de 380 a.C.). Há várias explicações sobre o surgimento do amor.

A gente pode sentir o amor no corpo? Como? De que maneira?

Ana Lúcia - Sim, o amor se manifesta corporalmente. Quando existe a energia positiva do amor, nosso corpo se modifica, a energia se dirige para fora, a pele está sensível, e o toque promove sensações agradáveis e prazerosas. Há uma necessidade de ser tocado e acariciado. Há uma abertura para o mundo. Isso explica o desejo de as pessoas que se amam de dar as mãos e abraçar. É uma grande demonstração corporal do amor e confiança.

Amar dói?

Ana Lúcia - O que  dói é a perda do amor. Amar não dói. Amar causa uma sensação de bem-estar e prazer.

Amar cura?

Ana Lúcia - Ha inúmeras pesquisas que indicam que o amor pode promover saúde e bem-estar. Seria muito dizer que o amor cura, mas faz parte, sim, do processo de cura. Amor é um processo biopsicossocial. É fundamental para a evolução e sobrevivência de nossa espécie. Estudos indicam que a falta de amor no início do desenvolvimento pode provocar depressão analítica, que muitas vezes provoca até a morte de crianças ainda na primeira infância. Outros estudos indicam que a falta ou a perda do amor podem provocar enfermidades como a “doença do coração partido”, que pode até matar adultos. Poderíamos falar de inúmeras patologias relacionadas a falta de amor.

A mulher ama mais que o homem ou isso é mito?

Ana Lúcia - A mulher é, biologicamente, mais preparada para desenvolver o processo de amor, devido aos sistemas hormonais femininos, como, por exemplo, a oxitocina que a mulher produz em maior quantidade em ocasiões especiais. Seja no ato sexual, durante a amamentação e na hora do parto. O amor, porém, não é apenas biológico. O social também interfere. Vivemos ainda um período em que a mulher é mais estimulada desde a infância a demonstrar mais seus sentimentos. Por essa razão, ela apresenta mais atitudes que apontam para o amor. Não podemos dizer que a mulher ama mais, apenas que é mais estimulada e preparada. Posso dizer também que o homem, quando ama, se desgasta fisicamente muito mais para desenvolver esse sentimento, embora seu amor seja extremamente intenso.

Sempre alguém ama mais que o outro num relacionamento?

Ana Lúcia – Sim. É muito difícil amar nas mesmas proporções. Ama-se com qualidades e estilos diferentes.

Amor maior é o amor de mãe?

Ana Lúcia - É o mais unidirecional. A mãe ama (principalmente na primeira infância) e nada recebe. É um amor que não se mantém pela reciprocidade. Não podemos dizer que é o maior amor. Existem muitas mães que não se ligam a seus filhos, algo até antinatural, fugindo da natureza biológica. Mas que o amor maternal existe, isso, sim, e é muito forte. Esse é o amor mais ligado à biologia, por isso muitas vezes apontado como maior. Mas há diversas vertentes e manifestações de amor.

A vida só se justifica por causa do amor?

Ana Lúcia - Como uma estudiosa do amor, digo que sim. O amor é a força motivacional da vida, é o motor de nossa existência. A vida do ser humano não se consolida de maneira isolada. Somos em função de um outro, aprendemos a ser com o outro ao qual nos ligamos. A sociedade se organizou em grupos devido à ligação amorosa de seus membros. Em uma passagem da mitologia Greco-romana, Eros ou cupido, é filho de Afrodite e não cresce. Seu desenvolvimento só acontece após o nascimento de Anteros, o amor fraternal. A mitologia aponta a importância do amor para o desenvolvimento saudável do ser humano. Os etólogos, nos estudos antropológicos, apontam que o amor foi responsável pela vida social. Biólogos, médicos e psicólogos indicam que o amor é a base para o desenvolvimento físico e emocional do ser humano. Assim, acredito que sim, o amor é fundamental.

Aqui, Dalva de Oliveira cantando Serei só tua:

*João Luiz Vieira é editor de ÉPOCA, jornalista profissional há 26 anos, roteirista de TV, dramaturgo, autor dos livros Kama Sutra Brasileiro e Sexo Sem Tabu (Editora Planeta), coordenador do e-book Sexo com Todas as Letras (e-galaxia), sócio-proprietário do site Pau Pra Qualquer Obra, e pós-graduado em Educação Sexual. Para falar com ele: jluiz@edglobo.com.br.

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