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sábado, 3 de fevereiro de 2018

Contra o humilhante teste da virgindade na Índia

Acaba o casamento, mas não há tempo para fotos felizes. Começa a humilhação. Ambos são chamados diante do conselho da casta. Um grupo de veneráveis anciãos se senta em círculo diante dos recém-casados e suas famílias e interroga a noiva sobre possíveis doenças contagiosas. Minutos mais tarde, o casal é enviado a um quarto enquanto o panchayat (líder da comunidade) se reúne com as famílias, que lhe pagam uma doação forçosa. Começa o ritual. Algumas mulheres verificam se a noiva não tem nenhuma ferida no corpo e escondem qualquer objeto cortante com o qual possa falsificar o teste. Lençóis escrupulosamente limpos sobre o leito conjugal para o qual a noiva se deixa levar tão depressa quanto entra seu marido. Fora, membros da família esperam que terminem de consumar o ato.

“Alguns oferecem material pornográfico e álcool ao noivo para se inspirar”, conta Vivek Tamaichekar, de 25 anos. “A pressão é tremenda para os dois. Se o rapaz não pode fazer nessa noite, repetem o ritual no dia seguinte. É assim até três vezes. Declaram-no impotente diante de sua família e sua comunidade se não conseguir fazer sexo”, conclui este estudante de mestrado em Ciências Sociais, de Mumbai, na Índia. Mas a humilhação tão somente começou. Vivek Tamaichekar conta que, quando tinha 10 anos, uma prima sua foi insultada diante de centenas de pessoas e espancada em privado quando descobriram que os lençóis não estavam manchados de sangue. “Impura, impura, Impura, o noivo tem de gritar.”

Vivek Tamaichekar pertence à casta Kanjarbhat e quer mudar a tradição de sua comunidade. Só há cerca de 50.000 membros em Maharashtra, o Estado de Mumbai onde Vivek se criou e agora vive. Com origem no Rajastão, o ritual nasce dos ciganos nômades – daí as semelhanças com o teste do lenço do povo ciganoeuropeu –, mas há mais de um milhão de membros da comunidade praticando-o por toda a Índia (com nomes diferentes, dependendo do Estado).

Há mais de um milhão de membros da comunidade praticando o ritual por toda a Índia

“Há alguns anos me propus acabar com essa prática humilhante. Sofri discriminação na minha família, mas estou satisfeito com a resposta das pessoas”, explica Vivek. Em outubro do ano passado, com sua prima Priyanka, criou um grupo no WhatsApp que chamaram de Stop the V ritual [Parem com o ritual V] (por virgindade). Meia centena de jovens da mesma comunidade se uniram à sua luta nessa e outras redes sociais.

A reação espontânea dos jovens da comunidade teve resposta. Desde finais do ano recebem ajuda da organização especializada na denúncia de práticas supersticiosas Blind Faith Eradication Committee (Comitê para a Erradicação de Crenças Cegas). Os mais de 15.000 membros desse grupo com presença em várias regiões indianas estão há anos lutando contra práticas atávicas como os assassinatos por honra. Em 2016, conseguiram que o Estado de Maharashtra se tornasse o primeiro na Índia a aprovar uma lei para conter tais práticas. A Lei para a Proibição do Boicote Social permite a denúncia e perseguição dos líderes locais que promovam práticas supersticiosas. “Registramos 19 casos nas autoridades policiais e não vamos parar até que eliminem todas essas tradições que mancham nossa cultura”, explica Krishna Changude, de 44 anos, membro da organização há décadas.

Por sua vez, Vivek e o grupo de jovens prosseguem em sua luta para mudar a tradição de sua comunidade. Não só conscientizam os seus nas redes sociais, mas organizam encontros para boicotar essas práticas e manifestações com lenços brancos para chamar a atenção dos adultos e envergonhar quem as apoiam. Alguns já entraram em choque com o núcleo duro da comunidade. Em 20 de janeiro, uma turba de meia centena de fanáticos da casta Kanjarbhat atacou três dois jovens integrantes quando assistiam a um casamento em Pune, a 150 quilômetros de Mumbai.

“É questão de tempo e perseverança. Uma tradição deste tipo não tem sentido no século em que estamos. Nem na Índia nem em parte alguma”, sentencia Vivek. Prometido para uma garota da mesma comunidade, o jovem se nega a participar do ritual da virgindade, enfrentando sua família.

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