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quarta-feira, 15 de abril de 2020

Discriminação de gênero utilizada como estratégia processual

Canal Ciências Criminais

 Discriminação de gênero utilizada como estratégia processual
A violência física contra a mulher veio descortinar outros tipos de violência sofrida por mulheres que muitas vezes passaram despercebidas.
Desqualificar mulheres faz parte de um escopo institucional contra a mulher que aceita sua culpabilização como justificativa para o crime.
Há, e isso é fato, um machismo institucional arraigado no meio jurídico que tenta colocar a mulher e profissional em situações de inferioridade e constrangimento.

Essas práticas têm sido utilizadas como estratégias processuais por profissionais que têm o dever de urbanidade pelos seus pares e respeito pelos direitos humanos. 
A previsão constitucional precisa sair do plano formal e ir para o plano efetivo.
Recentemente tivemos um exemplo no estado da Bahia, que durante a audiência de instrução, um Promotor de Justiça constrangeu a Defensora Pública ao pedir que ela ficasse tranquila, pois a “primeira vez com um negão não doía”. Essa foi uma estratégia que o membro do parquet se utilizou para constranger e enfraquecer a defesa, provocando uma situação de violência psicológica com afã de desestabilizar a Defensora Pública.
Deve-se haver um respeito para que isso não se torne um ilícito processual sofrido por mulheres que já se encontram na condição de vítimas, e também por advogadas no exercício do seu mister.
O ordenamento aceita determinadas estratégias desde que não sejam utilizadas de forma desleal. E usar a violência psicológica contra o gênero feminino, dentro da dinâmica processual, deve ser interpretada como litigância de má fé nos termos do Art. 16 e Art. 79 do Novo Código de Processo Civil.
No jogo processual, até onde serão válidas as estratégias?
Até onde não desrespeite e coloque a mulher em situação constrangedora ou de inferioridade. A condução estratégica tem que estar ligada a boa-fé processual.
Desqualificar a vítima como se não tivesse credibilidade, usando argumentos comuns na sociedade para culpá-la pelo abuso sofrido é um tipo de violência institucional já difundida no judiciário.
Dizer que a mulher é desequilibrada, prostituta, usuária de drogas é um elemento estratégico desleal e que está fora do jogo processual. 
Dentro do jogo, deve-se conhecer cada peça que irá travar sua batalha e por obvio o perfil antecedente de cada jogador. Porém, se valer do testemunho de uma mulher para atacar sua credibilidade, expondo de maneira temerosa a confiabilidade da vítima, ultrapassa o conflito da ampla defesa e da tutela da boa-fé processual.
Outro exemplo recente e de repercussão nacional, foram as acusações contra o Médium João de Deus. A defesa alegou que algumas de suas vítimas não teriam credibilidade para recorrer à justiça e que seus depoimentos deveriam passar por um filtro rígido, pois algumas daquelas vítimas seriam “garotas de programas”. 
É cristalina a intenção dessa estratégia dentro de um argumento camuflado que uma mulher por ser garota de programa poderá sofrer violência sexual e que o autor não deverá ser punido por este crime àquela vítima, em razão da forma em que esta mulher se relaciona com a sociedade. Isto é, argumentos insólitos e que estão fora do jogo processual.
O que tem acontecido com frequência no âmbito judiciário é uso do gaslighting (ou gas-lighting) para desqualificar a investigação como estratégia para que a vítima desista da denúncia.
E o que seria o gaslighting?
É uma forma de abuso psicológico na qual as informações são distorcidas ou omitidas para favorecer o abusador, fazendo com que a vítima duvide de sua própria memória.
Esse tipo de manobra não pode ser tolerada, devemos ser combativos e lutar contra esse manejo em todas as esferas, lutar contra esses ilícitos perpetrados por aqueles que deveriam zelar pela aplicação da lei.
A violência de gênero utilizada como estratégia processual ainda é algo disfarçado e sutil por sua própria natureza estratégica. Mas deve ser enfrentada com altivez, para que não se alimente o algoz que certamente fará de novo, “cego ou ardilosamente” crendo que não estará ultrapassando os limites da boa-fé processual e que nunca será responsabilizado pelos seus atos.

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