Por Daniel Lima e José Muniz Neto
Em sede de Habeas Corpus (211.888/TO), o STJ decidiu que ação perpetrada por uma prostituta, que consistiu em subtrair um bem móvel da vítima como forma de pagamento pelo ato sexual praticado, não configurava o crime de roubo, mas sim o de exercício arbitrário das próprias razões (art. 345 do Código Penal)
Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite:
Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite:
Pena – detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência.
In casu, apesar de o STJ ter concedido a ordem de ofício para afastar a punibilidade devido à prescrição, ainda assim, faz-se necessário realizar uma análise para entendermos se a conduta perpetrada pela prostituta caracteriza o crime de roubo impróprio ou o de exercício arbitrário das próprias razões.
Em linhas gerais, o que ficou demonstrado nos autos do processo foi que a ré havia firmado contrato verbal com a vítima para realização do ato sexual em troca do pagamento de R$ 15,00 (quinze reais).
Ocorre que após a realização do coito, a pretensa vítima se recusou a efetuar o pagamento devido, e diante dessa recusa, a ré subtraiu para si um pingente de titularidade da vítima e a ameaçou com uma faca para manter consigo a corrente.
Pois bem.
Prostituição
Nos parece óbvio que a conduta de subtrair coisa alheia móvel, nesse caso, se amolda ao tipo penal de exercício arbitrário das próprias razões, pois apesar de o compromisso assumido pela vítima não ser de natureza executiva, a pretensão da mesma em ser paga pelo serviço sexual prestado era idônea e gozava de legitimidade.
Esse, inclusive, foi o posicionamento do relator Min. Rogério Schietti Cruz, que em seu voto ressaltou que era inegável a legitimidade da pretensão da ré de oferecer serviços sexuais em troca de remuneração financeira.
Segundo o Ministro, não se pode negar resguardo jurídico a prostituta apenas por questões morais, uma vez que não havia nada de ilícito no negócio por ela firmado, já que a prostituição, por si só, não é ilícita, mas tão somente a sua exploração por terceiros (situação diferente, contudo, seria se o ato sexual comercializado envolvesse menores de 18 anos, incapazes ou vulneráveis, que não foi o que ocorreu).
Ante o exposto, e como bem entendeu o STJ, conclui-se que a adequação típica correta para o caso em comento, se dá no tipo de exercício arbitrário das próprias razões e não no crime de roubo, pois não se pode negar retaguarda jurídica às mulheres que oferecem serviços sexuais apenas por questões morais.
E como já dito, a pretensão decorrente de serviço de prostituição é legítima. Assim sendo, aquele que presta o referido serviço e não recebe pelo pagamento, incide no crime do art. 345 do CP, desde que tente obter o pagamento devido à força, fazendo, assim, “justiça com as próprias mãos”.
Por fim, ressalta-se ainda que a liberdade sexual é bem jurídico inerente a todos os indivíduos, e isso inclui as prostitutas. O que nos leva a concluir que a comercialização do sexo, desde que não haja aproveitamento ou exploração por terceiros, nada mais é do que a livre expressão da vertente positiva do bem jurídico liberdade sexual.
E assim sendo, não há de se falar em roubo quando a prostituta comercializa o sexo e tenta obter o pagamento devido pelo serviço prestado.
REFERÊNCIAS
BELING, Ernst von. Esquema de derecho penal: la doctrina del delito-tipo. Tradução por Sebastián Soler. Buenos Aires: Editorial Despalma, 1944.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Habeas Corpus n° 211.888/TO. Relator(a): Min. Rogério Schietti Cruz. Sexta Turma. Publicado em 07/06/2016.
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