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domingo, 20 de julho de 2014

Pais incríveis, juízes falíveis

É fácil adotar as mesmas regras para todos os filhos, mas justiça não é isso. Crianças diferentes exigem estratégias distintas

ISABEL CLEMENTE
20/07/2014

Se você nunca pensou em cursar Direito ou alguma carreira de prestígio nessa área por falta de aptidão mas teve mais de um filho, ingressou automaticamente como juiz amador na vara doméstica da família.

Administrar interesses e apaziguar ânimos dos filhos é das tarefas mais ingratas dos pais (parênteses para enfatizar que ainda não inventaram ninguém melhor para assumir esse papel do que os responsáveis). Julgamos o que é certo e errado o tempo todo sem perceber.

Qualquer decisão nossa está sempre sujeita a contestação e, pior, à comparação com o que foi feito em relação ao irmão, há pouco, no dia anterior, na semana que passou, como se fosse imperdoável mudar de ideia ou levar em conta novas circunstâncias, como o clima. Os recursos chegam no susto. Lançamos mão da primeira explicação.

"Você não foi à piscina porque nevou e hoje faz sol."

"Pai, aqui não ne-va!"

Mas nem sempre explicações vem fácil assim. Como juízes, somos um bom alvo. Toda vez que ousamos ser flexíveis, haverá um pirralho disposto a nos levar ao limite da nossa flexibilidade. Haja jogo de cintura, presença de espírito e tempo. Porque, não sei se vocês já leram algo a respeito, mas conflitos costumam surgir quando a mãe enfia a chave na porta de casa para ir trabalhar.

É muito comum confundirmos justiça com a adoção das mesmas regras para todos os filhos. Fazemos isso sem sentir, como se a casa e a vida da gente fossem instituições sujeitas a leis imutáveis ou, no máximo, revistas a cada 50 anos. Mas não são. A busca por igualdade quando se lida com fraternidade na família muitas vezes nos leva por caminhos equivocados porque é mais simples uniformizar e adotar as mesmas regras para todos. Se um não vai à festa, então não vai ninguém. Ninguém assiste TV e todos dormem no mesmo horário. Educar não é fácil, mas, sinto dizer, erramos quando fazemos isso indistintamente e eu me incluo nessa. Pego carona aqui no célebre discurso de Rui Barbosa, intitulado Oração aos moços: “a regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam”.

Um filho nunca é igual ao outro, nem gêmeos. Como o mais frequente é estarmos lidando com crianças em idades e fases diferentes, discernir que regras específicas vale para cada uma delas é o desafio.

Não estou sugerindo que você seja mais carinhosa com um do que com o outro, ou proteja mais um deles, a não ser que algum precise realmente de mais proteção. Acontece por vários motivos. Estou partindo do pressuposto que sua eventual preferência por um dos rebentos não chega ao ponto de você tratá-los bem ou mal de acordo com sua vontade. Amamos incondicionalmente os nossos filhos e queremos o bem de todos, sejam eles como forem.

Estou tratando aqui daquela coisa complicada chamada dia-a-dia, quando somos obrigados a agir, pensar e decidir sem consultar um conselho de sábios antes para checar o potencial destruidor ou altruísta das nossas falas e atitudes. Filho não vem com manual, mas nós também não temos bula indicando todos os efeitos colaterais possíveis e já registrados pela ciência.

Em meio à correria da vida, agimos intuitivamente, movidos por boa-fé e também inspirados por algo bacana que lemos num livro, ouvimos por aí. Conhecimento é aquela bagagem permanente que vai aumentando sem nos cansar. Felizmente.  Somos falíveis mas nos esforçamos por acertar. Toca aqui e prometa olhar cada filho individualmente antes de soltar a próxima bronca coletiva quando presenciar aquela briga que nunca aconteceu na sua casa antes. Porque tem hora que a gente não sabe mesmo que estratégia adotar para diferenciar os filhos e o povo cisma de achar que a culpa é sempre dos pais.

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