Em livro infantil, a advogada Alexandra Ullmann narra histórias verídicas de um sofrimento sem fim: alienação parental.
ISABEL CLEMENTE
22/02/2015
Advogada especializada em Direito de Família, Alexandra Ullmann acompanha, há dez anos, histórias de divórcios que não caminham bem. Sem acordo, viram uma batalha e os filhos, armas a serem manipuladas. Carioca, mãe de uma moça de 21 anos, divorciada e amiga do ex-marido e sua atual companheira, Alexandra lança, no dia 3 de março, no Rio, um livro infantil em que retrata, com belas ilustrações de Gregório Medeiros, as angústias contadas por crianças vítimas da disputa dos pais. Em Tudo em dobro ou pela metade (Cassará Editora), a voz infantil ganha força e recorre à imaginação para encenar, num teatrinho, a mensagem perfeita para uma família que se dividiu: no coração de uma criança cabe tudo em dobro. Crueldade é exigir que ela fique só com metade. Formada também em Psicologia, a advogada conversou sobre o tema do livro. Seguem os principais trechos.
ÉPOCA – Crianças sempre sofrem no divórcio dos pais?
Alexandra Ullmann – Lidamos com muitos litígios. Raros são os casos de acordo consensual e as crianças sempre sofrem. Os pais, na grande maioria dos litígios, não poupam as crianças. Acham que a dor vai passar, que elas vão esquecer, ou pior, que elas têm que conhecer os defeitos do pai e da mãe. São frases muito comuns. Comecei a ver que não adiantava aconselhar, sugerir terapia, algo que a maioria até faz, porque, no fundo, essas pessoas não conseguem elaborar de forma racional a separação, sobretudo quando há briga, traição e partilha de bens. Num litígio, até os mais sensatos perdem a sensatez. Eu costumo chamar a família para um papo e escutar a criança, que sempre fala claramente o que acontece. O livro traz exemplos da realidade. As crianças dizem assim "meus pais acham que eu não sei de nada. Eu prefiro mentir para minha mãe dizendo que é ruim ficar com meu pai". Eu aviso ao pai e à mãe que a criança, para sobreviver, é obrigada a viver numa mentira. Uma criança me disse certa vez que o pai tirava o chip do celular para a mãe não poder telefonar quando ele estava com ela (essa história está no livro). Ouvi aqui o relato de um pai que recebeu o telefonema da filha de sete anos perguntando se ele tinha postado o vídeo da apresentação do balé dela e quantos likes o vídeo tinha recebido. A conversa acabou mas, como a menina não desligou o telefone, ele ouviu o diálogo que se seguiu com a mãe dizendo para a criança "tá vendo como seu pai não tem amigos? Ninguém gosta dele."
ÉPOCA – A criança é a maior vítima da alienação. Ela pode fazer algo para estancar esse processo?
Alexandra – Algumas crianças conseguem. Uma juíza do Mato Grosso me contou um lance que me emocionou. Ela leu o livro para uma menina que estava desesperada durante uma audiência. A menina foi se acalmando e disse "tia, eu achava que era só eu que passava por isso". Conheço um caso de alienação grave, que começou quando os gêmeos tinham seis meses. Aos seis, o menino não falava com o pai. Hoje, aos 12, numa nova tentativa da mãe de reduzir o tempo das crianças com o pai, o menino colocou de forma bem direta: "Minha mãe fala mal do meu pai o tempo inteiro, e ela quer que eu faça isso, mas não dá, não vou falar mal do meu pai porque gosto dele." Firme assim. Mas tem criança que não suporta a pressão, e aí a história fica triste demais. Teve criança que tentou se matar com uma facada na barriga aos sete e, aos 12, ameaçou pular do parapeito. Isso aconteceu numa família abastada, em que os pais não se entendem. Outra criança, de 12 anos, cortou os pulsos. Perdi muita a fé em tudo. Lido com o pior do ser humano todos os dias, são pessoas que não se importam com uma criança. O bullying é um tema que vem se popularizando no ambiente escolar. A alienação parental, não.
ÉPOCA – As escolas estão preparadas para tratar do assunto?
Alexandra – A maioria das escolas não está preparada para lidar com essas questões. São poucas as que promovem debates sobre esse assunto. Há mais de cinco anos, falo com os pais sobre responsabilidade civil pelos atos dos filhos e com a garotada também. Com esse livro, minha ideia é montar uma peça para levar às escolas porque a mensagem principal é para os pais mesmo. Além do mais, a nova lei da guarda compartilhada, aprovada em dezembro, prevê multa para todo estabelecimento, público e privado, que não fornecer aos genitores - independentemente de quem tem a guarda - informações sobre o filho. A grande maioria das escolas desconhece isso porque a lei é muito nova ainda.
ÉPOCA – Como a senhora lida com clientes que incidem em alienação parental?
Alexandra – Se eu perceber que há alienação, não entro no processo. Eu me recuso. Mas se eu não souber e vir que meu cliente está fazendo isso, oriento porque muitos não percebem, fazem por raiva ou vingança, mas exijo "ou enquadra, ou eu não continuo". E já mandei vários embora. Somos humanos, todos erramos, mas é preciso se dar conta do dano causado à criança. Existem inúmeros casais que alienam enquanto casais com aquela história do "seu pai não presta para nada" ou "sua mãe parece não gostar tanto de você assim". Quando vem a separação, aquela estrutura rui porque as pessoas não separam o casamento da parentalidade. Os casais que conseguem manter os filhos longe da separação certamente terão adolescentes mais tranquilos e adultos sem problema de relacionamento no futuro. Filho é 50% um e outro, ao anular a outra metade, o alienador está destruindo metade da origem de uma criança.
ÉPOCA – O que o pai ou a mãe consciente, que não chantageia o filho, pode fazer para atenuar o sofrimento imposto pelo outro genitor?
Alexandra – É muito complicado. Tentamos mostrar ao juízo que a situação exige terapia e laudos que comprovem a alienação. O problema é que o tempo do Judiciário não é o tempo da criança. Para o alienador, quanto mais tempo demorar, melhor. E um advogado mal intencionado pode esticar um processo de um para dez anos.
ÉPOCA – É possível dizer a partir de que idade a criança consegue romper com a manipulação?
Alexandra – Não dá. Depende do laço estabelecido antes entre o filho e o genitor alienado. Crianças muito pequenas com ótimos laços são menos esponjas. Outras passam a crer na mentira. É tão fácil implantar memórias em crianças. Elas repetem tudo, como se lembrassem de histórias que lhes foram contadas. Se o pai ou a mãe estabelecer alguma relação com uma ponta de verdade, basta. Acabou a verdade e ficou a mentira.
ÉPOCA - Pessoas de fora do núcleo familiar, como avós, tios, amigos muito chegados, aprofundam a alienação?
Alexandra – Na grande maioria dos litígios, acontece um apartheid dos amigos porque as partes entram numa de dizer "se você é amigo dele não pode ser meu". Não tem mais os "nossos amigos". O alienador busca respaldo, daí espalha que está ficando sem pensão, fala mal do ex-cônjuge, reclama, e o amigo acaba ficando com raiva também e começa a repetir isso. A alienação fora da esfera familiar é comum, e vem do entorno da criança.
ÉPOCA - Como essas mesmas pessoas poderiam ajudar uma criança em conflito?
Alexandra – Já teve avó me procurando para dizer que a filha está praticando alienação e não sabe mais o que fazer. A gente pode encaminhar para tratamento psicológico, chamar para conversas. Cabe aos amigos também chamar a pessoa à realidade, caso ela esteja cega pela raiva porque é bom avisar que, se for brigar na Justiça, vai acabar perdendo a guarda do filho. As pessoas perdem a noção. Tivemos um caso em que um pai acusou a mãe de praticar swing e que, por isso, ela não poderia ser uma boa mãe. Ele tinha fotos e estava no meio. Ué, ela não pode mas ele podia? Como é isso? O comportamento que era mútuo ou aceito vira combustível para a alienação. O ódio se transforma na lenha da fogueira em que o filho vai arder. E a criança queima, ciente de tudo que se passa.
ÉPOCA - Alienação parental não é um fenômeno novo, sempre existiu, mas discutir o problema nos tribunais é recente, não?
Alexandra – Quando o pai deixa de ser provedor e quer assumir o papel na educação do filho é que esse drama veio à tona. Não existe mais a visita do pai. A palavra é convivência. É um entendimento arcaico partir do pressuposto de que a mãe é melhor. Pessoas são pessoas, têm defeitos e qualidades. Pais querem conviver mais. Antes, eles pegavam as crianças limpas, levavam para passear e pronto. Devolviam. Hoje os pais querem dividir responsabilidades, participar das reuniões da escola, das decisões, pegar e levar, conviver. Eles têm um papel. Pela ótica freudiana, o pai é o limite, é quem chega para mostrar ao filho que a mãe não é a extensão dele.
ÉPOCA - A senhora consegue distinguir um perfil mais propenso a usar o filho como cabo de guerra?
Alexandra – Não tem perfil, classe social, nada. Pessoas acima de qualquer suspeita piram igual a qualquer um. As pessoas estão cada vez mais difíceis de lidar. Há muita falsa acusação de abuso sexual, que é o último degrau da alienação. Existe claramente um caminho seguido por quase todos os acusadores. O pai ganha mais tempo com o filho, entra o pernoite, a mãe começa a dificultar esse encontro, aí surge uma namorada do pai, a mãe complica mais ainda a aproximação, daí o pai entra com uma ação para reconquistar o que está perdendo e, na resposta, a ex-mulher aparece com uma acusação de abuso sexual, alegando que era uma desconfiança antiga que aumentou com o tempo. Tenho um cliente que ficou uma semana detido acusado de abusar do próprio filho, sem prova alguma, com todos os laudos dando negativo. Bastou a palavra da ex-mulher. Há um ano não conseguimos nem convivência vigiada para ele ver o filho. O tempo passa e, à medida que ele perde nos pleitos, reforça a falsa memória implantada na criança com o discurso do "tá vendo? Tanto é verdade que o juiz não deixou mais você estar com ele".
ÉPOCA - O que é mais difícil para um pai ou mãe que sofre alienação parental?
Alexandra - Educar, dizer não. Eles acham que não podem mais contrariar os filhos, temendo que eles não queiram voltar. Eu digo que, até os 18 anos, a responsabilidade é dele sim, é o pai e a mãe que tomam decisões. O genitor alienado fica fragilizado. Eu tenho um cliente que passou por isso. Disse não e a filha não quis mais voltar. É muito comum o alienador jogar a decisão no filho com um "eu deixo, ele é que não quer". Educar é dizer não e permitir que o outro diga também.
ISABEL CLEMENTE
22/02/2015
Advogada especializada em Direito de Família, Alexandra Ullmann acompanha, há dez anos, histórias de divórcios que não caminham bem. Sem acordo, viram uma batalha e os filhos, armas a serem manipuladas. Carioca, mãe de uma moça de 21 anos, divorciada e amiga do ex-marido e sua atual companheira, Alexandra lança, no dia 3 de março, no Rio, um livro infantil em que retrata, com belas ilustrações de Gregório Medeiros, as angústias contadas por crianças vítimas da disputa dos pais. Em Tudo em dobro ou pela metade (Cassará Editora), a voz infantil ganha força e recorre à imaginação para encenar, num teatrinho, a mensagem perfeita para uma família que se dividiu: no coração de uma criança cabe tudo em dobro. Crueldade é exigir que ela fique só com metade. Formada também em Psicologia, a advogada conversou sobre o tema do livro. Seguem os principais trechos.
ÉPOCA – Crianças sempre sofrem no divórcio dos pais?
Alexandra Ullmann – Lidamos com muitos litígios. Raros são os casos de acordo consensual e as crianças sempre sofrem. Os pais, na grande maioria dos litígios, não poupam as crianças. Acham que a dor vai passar, que elas vão esquecer, ou pior, que elas têm que conhecer os defeitos do pai e da mãe. São frases muito comuns. Comecei a ver que não adiantava aconselhar, sugerir terapia, algo que a maioria até faz, porque, no fundo, essas pessoas não conseguem elaborar de forma racional a separação, sobretudo quando há briga, traição e partilha de bens. Num litígio, até os mais sensatos perdem a sensatez. Eu costumo chamar a família para um papo e escutar a criança, que sempre fala claramente o que acontece. O livro traz exemplos da realidade. As crianças dizem assim "meus pais acham que eu não sei de nada. Eu prefiro mentir para minha mãe dizendo que é ruim ficar com meu pai". Eu aviso ao pai e à mãe que a criança, para sobreviver, é obrigada a viver numa mentira. Uma criança me disse certa vez que o pai tirava o chip do celular para a mãe não poder telefonar quando ele estava com ela (essa história está no livro). Ouvi aqui o relato de um pai que recebeu o telefonema da filha de sete anos perguntando se ele tinha postado o vídeo da apresentação do balé dela e quantos likes o vídeo tinha recebido. A conversa acabou mas, como a menina não desligou o telefone, ele ouviu o diálogo que se seguiu com a mãe dizendo para a criança "tá vendo como seu pai não tem amigos? Ninguém gosta dele."
ÉPOCA – A criança é a maior vítima da alienação. Ela pode fazer algo para estancar esse processo?
Alexandra – Algumas crianças conseguem. Uma juíza do Mato Grosso me contou um lance que me emocionou. Ela leu o livro para uma menina que estava desesperada durante uma audiência. A menina foi se acalmando e disse "tia, eu achava que era só eu que passava por isso". Conheço um caso de alienação grave, que começou quando os gêmeos tinham seis meses. Aos seis, o menino não falava com o pai. Hoje, aos 12, numa nova tentativa da mãe de reduzir o tempo das crianças com o pai, o menino colocou de forma bem direta: "Minha mãe fala mal do meu pai o tempo inteiro, e ela quer que eu faça isso, mas não dá, não vou falar mal do meu pai porque gosto dele." Firme assim. Mas tem criança que não suporta a pressão, e aí a história fica triste demais. Teve criança que tentou se matar com uma facada na barriga aos sete e, aos 12, ameaçou pular do parapeito. Isso aconteceu numa família abastada, em que os pais não se entendem. Outra criança, de 12 anos, cortou os pulsos. Perdi muita a fé em tudo. Lido com o pior do ser humano todos os dias, são pessoas que não se importam com uma criança. O bullying é um tema que vem se popularizando no ambiente escolar. A alienação parental, não.
ÉPOCA – As escolas estão preparadas para tratar do assunto?
Alexandra – A maioria das escolas não está preparada para lidar com essas questões. São poucas as que promovem debates sobre esse assunto. Há mais de cinco anos, falo com os pais sobre responsabilidade civil pelos atos dos filhos e com a garotada também. Com esse livro, minha ideia é montar uma peça para levar às escolas porque a mensagem principal é para os pais mesmo. Além do mais, a nova lei da guarda compartilhada, aprovada em dezembro, prevê multa para todo estabelecimento, público e privado, que não fornecer aos genitores - independentemente de quem tem a guarda - informações sobre o filho. A grande maioria das escolas desconhece isso porque a lei é muito nova ainda.
ÉPOCA – Como a senhora lida com clientes que incidem em alienação parental?
Alexandra – Se eu perceber que há alienação, não entro no processo. Eu me recuso. Mas se eu não souber e vir que meu cliente está fazendo isso, oriento porque muitos não percebem, fazem por raiva ou vingança, mas exijo "ou enquadra, ou eu não continuo". E já mandei vários embora. Somos humanos, todos erramos, mas é preciso se dar conta do dano causado à criança. Existem inúmeros casais que alienam enquanto casais com aquela história do "seu pai não presta para nada" ou "sua mãe parece não gostar tanto de você assim". Quando vem a separação, aquela estrutura rui porque as pessoas não separam o casamento da parentalidade. Os casais que conseguem manter os filhos longe da separação certamente terão adolescentes mais tranquilos e adultos sem problema de relacionamento no futuro. Filho é 50% um e outro, ao anular a outra metade, o alienador está destruindo metade da origem de uma criança.
ÉPOCA – O que o pai ou a mãe consciente, que não chantageia o filho, pode fazer para atenuar o sofrimento imposto pelo outro genitor?
Alexandra – É muito complicado. Tentamos mostrar ao juízo que a situação exige terapia e laudos que comprovem a alienação. O problema é que o tempo do Judiciário não é o tempo da criança. Para o alienador, quanto mais tempo demorar, melhor. E um advogado mal intencionado pode esticar um processo de um para dez anos.
ÉPOCA – É possível dizer a partir de que idade a criança consegue romper com a manipulação?
Alexandra – Não dá. Depende do laço estabelecido antes entre o filho e o genitor alienado. Crianças muito pequenas com ótimos laços são menos esponjas. Outras passam a crer na mentira. É tão fácil implantar memórias em crianças. Elas repetem tudo, como se lembrassem de histórias que lhes foram contadas. Se o pai ou a mãe estabelecer alguma relação com uma ponta de verdade, basta. Acabou a verdade e ficou a mentira.
ÉPOCA - Pessoas de fora do núcleo familiar, como avós, tios, amigos muito chegados, aprofundam a alienação?
Alexandra – Na grande maioria dos litígios, acontece um apartheid dos amigos porque as partes entram numa de dizer "se você é amigo dele não pode ser meu". Não tem mais os "nossos amigos". O alienador busca respaldo, daí espalha que está ficando sem pensão, fala mal do ex-cônjuge, reclama, e o amigo acaba ficando com raiva também e começa a repetir isso. A alienação fora da esfera familiar é comum, e vem do entorno da criança.
ÉPOCA - Como essas mesmas pessoas poderiam ajudar uma criança em conflito?
Alexandra – Já teve avó me procurando para dizer que a filha está praticando alienação e não sabe mais o que fazer. A gente pode encaminhar para tratamento psicológico, chamar para conversas. Cabe aos amigos também chamar a pessoa à realidade, caso ela esteja cega pela raiva porque é bom avisar que, se for brigar na Justiça, vai acabar perdendo a guarda do filho. As pessoas perdem a noção. Tivemos um caso em que um pai acusou a mãe de praticar swing e que, por isso, ela não poderia ser uma boa mãe. Ele tinha fotos e estava no meio. Ué, ela não pode mas ele podia? Como é isso? O comportamento que era mútuo ou aceito vira combustível para a alienação. O ódio se transforma na lenha da fogueira em que o filho vai arder. E a criança queima, ciente de tudo que se passa.
ÉPOCA - Alienação parental não é um fenômeno novo, sempre existiu, mas discutir o problema nos tribunais é recente, não?
Alexandra – Quando o pai deixa de ser provedor e quer assumir o papel na educação do filho é que esse drama veio à tona. Não existe mais a visita do pai. A palavra é convivência. É um entendimento arcaico partir do pressuposto de que a mãe é melhor. Pessoas são pessoas, têm defeitos e qualidades. Pais querem conviver mais. Antes, eles pegavam as crianças limpas, levavam para passear e pronto. Devolviam. Hoje os pais querem dividir responsabilidades, participar das reuniões da escola, das decisões, pegar e levar, conviver. Eles têm um papel. Pela ótica freudiana, o pai é o limite, é quem chega para mostrar ao filho que a mãe não é a extensão dele.
ÉPOCA - A senhora consegue distinguir um perfil mais propenso a usar o filho como cabo de guerra?
Alexandra – Não tem perfil, classe social, nada. Pessoas acima de qualquer suspeita piram igual a qualquer um. As pessoas estão cada vez mais difíceis de lidar. Há muita falsa acusação de abuso sexual, que é o último degrau da alienação. Existe claramente um caminho seguido por quase todos os acusadores. O pai ganha mais tempo com o filho, entra o pernoite, a mãe começa a dificultar esse encontro, aí surge uma namorada do pai, a mãe complica mais ainda a aproximação, daí o pai entra com uma ação para reconquistar o que está perdendo e, na resposta, a ex-mulher aparece com uma acusação de abuso sexual, alegando que era uma desconfiança antiga que aumentou com o tempo. Tenho um cliente que ficou uma semana detido acusado de abusar do próprio filho, sem prova alguma, com todos os laudos dando negativo. Bastou a palavra da ex-mulher. Há um ano não conseguimos nem convivência vigiada para ele ver o filho. O tempo passa e, à medida que ele perde nos pleitos, reforça a falsa memória implantada na criança com o discurso do "tá vendo? Tanto é verdade que o juiz não deixou mais você estar com ele".
ÉPOCA - O que é mais difícil para um pai ou mãe que sofre alienação parental?
Alexandra - Educar, dizer não. Eles acham que não podem mais contrariar os filhos, temendo que eles não queiram voltar. Eu digo que, até os 18 anos, a responsabilidade é dele sim, é o pai e a mãe que tomam decisões. O genitor alienado fica fragilizado. Eu tenho um cliente que passou por isso. Disse não e a filha não quis mais voltar. É muito comum o alienador jogar a decisão no filho com um "eu deixo, ele é que não quer". Educar é dizer não e permitir que o outro diga também.