19.02.2015
Cristina Fontenele
Adital
Vítimas de abusos sexuais de religiosos nas Américas reuniram-se nesta segunda, 16 de fevereiro, na Cidade do México para exigir do Papa Francisco justiça e medidas concretas contra esse tipo de crime. Uma rede formada pela Internet por vítimas de abusos e pessoas solidárias do Chile, Argentina, República Dominicana, Peru e Estados Unidos, enviou uma carta conjunta ao Papa reclamando sobre o que consideram ambiguidades e contradições do Sumo Pontífice em seu compromisso no combate ao abuso sexual de menores por membros da Igreja.
"Exigimos do Papa que, pelo menos, cumpra com o que está dizendo, porque para fabricar manchetes todos somos bons. Já chega de manchetes!”, manifesta na carta o chileno Juan Carlos Cruz, vítima de abuso.
Em coletiva de imprensa, rede latino-americana pede medidas concretas do Papa Francisco no combate aos abusos clericais. Crédito: Enfoque Notícias |
Para Barbara Blaine, presidenta da Rede de Sobreviventes dos Abusos de Sacerdotes (Snap, sigla em inglês), fundada em Chigago (Estado Unidos), os protestos latino-americanos podem impulsionar a busca por justiça. "É hora de colocar sob proteção todas as vítimas que têm sofrido durante muito tempo, das quais nem todas sobrevivem porque se suicidam ou caem em vícios como o álcool”, assinala Barbara, nascida na cidade de Toledo, (Estado de Ohio, nos EUA) e também vítima de repetitivos abusos do pároco de sua igreja quando criança.
Na carta enviada a Francisco, há relatos de vítimas como Miguel Hurtado Calvo, abusado sexualmente aos 16 anos de idade pelo sacerdote responsável pelo grupo de jovens ao qual pertencia, em uma localidade espanhola. "Custou muito aceitar que um homem de Deus, um homem ao qual considerava como pai que nunca tive, estava cometendo um terrível delito e um pecado horrendo. Mas mais devastador que o abuso foi o encobrimento por parte de seus superiores.”, desabafa Miguel.
Sociedade protesta contra impunidade de sacerdotes acusados de abusos sexuais. Crédito: Sin Embargo |
O Papa Francisco tem sido duramente criticado pelas vítimas de abusos clericais pelo que seria a prática de um "discurso incoerente”, que ainda favoreceria a impunidade de sacerdotes e dificultaria o acesso à justiça. Segundo Juan Carlos Cruz Chellew, chileno, autor do livro "O fim da inocência”, o Papa diz coisas boas, porém pratica todo o contrário quando premia abusadores e encobridores, nomeando-os cardeais e bispos. Cruz, que esteve no México apoiando a rede latino-americana, sofreu também abusos sexuais a partir dos 15 anos, quando iniciou na Ação Católica Juvenil da paróquia do Sagrado Coração, na comunidade de Providencia, bairro nobre de Santiago do Chile.
Cruz acusa o sacerdote Fernando Karadima Fariña, conhecido como "Marcial Maciel chileno”, de cometer abusos contra ele e outras crianças. "Uns ele masturbava, outros penetrava. Quanto a mim, me tocava e, sobretudo, me torturava psicologicamente. Ameaçava e advertia que iria dizer a todos que eu era gay se eu contasse o que ele fazia.”, denuncia o escritor. Karadigma é um sacerdote chileno da Paróquia El Bosque, na comunidade de Providencia, bairro nobre onde frequentavam membros da alta classe chilena. O sacerdote foi declarado culpado, em 2011, pelo Vaticano por uma série de casos de abusos sexuais. Já Marcial Maciel Degollado foi um sacerdote mexicano fundador da congregação católica Legião de Cristo, presente em mais de 20 países. Acusado por diversos abusos sexuais, Marcial Maciel seria também pai de vários filhos. As investigações por seus crimes foram interrompidas, sendo ele "convidado” pela Igreja a retirar-se do sacerdócio para uma vida de oração e penitência. Maciel morreu em 2008, aos 87 anos de idade.
Juan Carlos Cruz Chellew, autor do livro "O fim da inocência”, foi abusado pelo sacerdote Fernando Karadima Fariña, no Chile. Crédito: Sin Embargo |
A rede latino-americana pede ainda "que a Igreja seja uma casa segura” e que tanto os sacerdotes abusadores [chamados "pederastas”] como os cúmplices acobertadores, não importando a hierarquia, sejam punidos com sanções exemplares. As vítimas exortam o Papa, como representante máximo e responsável pela Igreja Católica em todo o mundo, a promover mudanças estruturais e por fim ao que chamam de "holocausto de milhares de meninos e meninas”, sacrificados para evitar o escândalo e preservar a imagem e o prestígio de representantes da Igreja perante o mundo.
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