Por Julyete Louly em 17/02/2015 na edição 838
As mulheres sempre foram cobradas pela sociedade para exibir corpos que agradem os olhos alheios. Essa cobrança é maior quando elas atuam na televisão. As jornalistas que aparecem quase que diariamente nos telejornais, seja na bancada ou nas reportagens, estão expostas a isso a todo o momento. É cabelo que não pode voar no rosto quando estiver no link ao vivo, roupa adequada, unhas bem feitas, maquiagem impecável mesmo quando o dia ainda está começando, principalmente para disfarçar as olheiras, já que a noite foi dedicada à apuração ou preparação de notícias.
Apesar de todos os pesares, o machismo arraigado na cabeça das pessoas não perdoa: exige perfeição, e, se ela não transparece na caixa mágica, mil pedras são jogadas e uma enxurrada de comentários maldosos e críticas aparecem. Dentro deste absurdo contexto, isso tudo ocorre para lembrar à mulher que, apesar dela ter estudado e se esforçado para conseguir um bom emprego, não é o bastante. Ela ainda será vista como um bibelô, um diamante para enfeitar o mundo e jamais como um simples ser humano que apenas quer construir sua história enfrentando as mesmas lutas que todos.
Um caso que ganhou grande repercussão foi o da apresentadora do Globo Esporte, da Rede Globo, Fernanda Gentil. A jornalista foi à praia e acabou sendo fotografada porpaparazzi, o que rendeu uma matéria no R7, portal de notícias da Rede Record. Para provar que a própria mídia é machista, as fotos de Gentil estavam acompanhadas de frases como “Expectativa x Realidade”, “Fernanda Gentil virou a repórter queridinha na época da Copa. Um fator que ajudou muito foi a sua aparência. A jornalista é loira e, teoricamente, tem um corpão. Teoricamente.” Ou: “O figurinista dela, porém, merece os parabéns por conseguir disfarçar as imperfeições tão bem”, entre outras barbaridades. O site foi tão criticado que acabou retirando a postagem do ar e publicando um pedido de desculpas, mas somente quando descobriram que Fernanda está grávida.
Reforçando estereótipos
Dias depois, outra que não foi poupada pelos olhares críticos e hipócritas da perfeição foi Ilze Scamparini, correspondente da Rede Globo na Itália. Após ela aparecer ao vivo em um enquadramento de câmera não muito bom, mas que parecia ser uma transmissão improvisada, o jornalista Daniel Castro escreveu: “Correspondente da Globo esconde a barriga e mostra o céu de Roma“. No texto, o trabalho de Ilze é minimizado a uma obsessiva busca por ângulos que disfarcem a sua imagem para parecer sempre mais magra. Só pelo título, que chegou a ficar cômico, percebe-se como é ridícula essa cobrança sem sentido.
Recentemente, a nova vítima da patrulha da beleza foi Fabíola Gadelha, apresentadora doBalanço Geral Manhã e Cidade Alerta Especial, ambos da Record. O jornalista e locutor Silvio Luiz publicou em uma rede social a seguinte frase: “Existe coisa mais sem nexo do que essa gorda na Record?” Apesar de ter sido criticado por internautas e, infelizmente, apoiado por outros, ele não se manifestou novamente sobre o assunto.
Vale lembrar que os homens também sofrem com essa vontade alheia de encontrar o belo neles, claro que de forma mais branda em relação às mulheres. A exemplo, temos o Faustão, que já foi motivo de piada por conta de seu peso.
É fato que as pessoas entendem a TV como um grande espetáculo, inclusive, quando se trata de telejornais. Entretanto, é preciso mudar esse pensamento de que as mulheres estão ali sempre para ser lindas e impecáveis como bonecas de porcelana. É verdade também que no mundo televisivo o trabalho com a imagem muitas vezes torna-se ponto principal, mas este não é o caso das jornalistas. Deve-se pensar que, de forma geral, ali estão seres humanos, gente como a gente, que têm emprego, filhos, problemas, doenças, imperfeições, enfim, tudo o que nos torna iguais independente de gênero, etnia ou classe social.
Essa vontade de encontrar o belo no outro, principalmente quando ele não faz disso o seu trabalho, só reforça estereótipos que tanto execramos. Ver esses maus exemplos dentro do próprio jornalismo mostra o quão urgente é praticar o respeito ao próximo e mudar de vez a postura midiática em relação às mulheres.
***
Julyete Louly é jornalista
Observatório da Imprensa
As mulheres sempre foram cobradas pela sociedade para exibir corpos que agradem os olhos alheios. Essa cobrança é maior quando elas atuam na televisão. As jornalistas que aparecem quase que diariamente nos telejornais, seja na bancada ou nas reportagens, estão expostas a isso a todo o momento. É cabelo que não pode voar no rosto quando estiver no link ao vivo, roupa adequada, unhas bem feitas, maquiagem impecável mesmo quando o dia ainda está começando, principalmente para disfarçar as olheiras, já que a noite foi dedicada à apuração ou preparação de notícias.
Apesar de todos os pesares, o machismo arraigado na cabeça das pessoas não perdoa: exige perfeição, e, se ela não transparece na caixa mágica, mil pedras são jogadas e uma enxurrada de comentários maldosos e críticas aparecem. Dentro deste absurdo contexto, isso tudo ocorre para lembrar à mulher que, apesar dela ter estudado e se esforçado para conseguir um bom emprego, não é o bastante. Ela ainda será vista como um bibelô, um diamante para enfeitar o mundo e jamais como um simples ser humano que apenas quer construir sua história enfrentando as mesmas lutas que todos.
Um caso que ganhou grande repercussão foi o da apresentadora do Globo Esporte, da Rede Globo, Fernanda Gentil. A jornalista foi à praia e acabou sendo fotografada porpaparazzi, o que rendeu uma matéria no R7, portal de notícias da Rede Record. Para provar que a própria mídia é machista, as fotos de Gentil estavam acompanhadas de frases como “Expectativa x Realidade”, “Fernanda Gentil virou a repórter queridinha na época da Copa. Um fator que ajudou muito foi a sua aparência. A jornalista é loira e, teoricamente, tem um corpão. Teoricamente.” Ou: “O figurinista dela, porém, merece os parabéns por conseguir disfarçar as imperfeições tão bem”, entre outras barbaridades. O site foi tão criticado que acabou retirando a postagem do ar e publicando um pedido de desculpas, mas somente quando descobriram que Fernanda está grávida.
Reforçando estereótipos
Dias depois, outra que não foi poupada pelos olhares críticos e hipócritas da perfeição foi Ilze Scamparini, correspondente da Rede Globo na Itália. Após ela aparecer ao vivo em um enquadramento de câmera não muito bom, mas que parecia ser uma transmissão improvisada, o jornalista Daniel Castro escreveu: “Correspondente da Globo esconde a barriga e mostra o céu de Roma“. No texto, o trabalho de Ilze é minimizado a uma obsessiva busca por ângulos que disfarcem a sua imagem para parecer sempre mais magra. Só pelo título, que chegou a ficar cômico, percebe-se como é ridícula essa cobrança sem sentido.
Recentemente, a nova vítima da patrulha da beleza foi Fabíola Gadelha, apresentadora doBalanço Geral Manhã e Cidade Alerta Especial, ambos da Record. O jornalista e locutor Silvio Luiz publicou em uma rede social a seguinte frase: “Existe coisa mais sem nexo do que essa gorda na Record?” Apesar de ter sido criticado por internautas e, infelizmente, apoiado por outros, ele não se manifestou novamente sobre o assunto.
Vale lembrar que os homens também sofrem com essa vontade alheia de encontrar o belo neles, claro que de forma mais branda em relação às mulheres. A exemplo, temos o Faustão, que já foi motivo de piada por conta de seu peso.
É fato que as pessoas entendem a TV como um grande espetáculo, inclusive, quando se trata de telejornais. Entretanto, é preciso mudar esse pensamento de que as mulheres estão ali sempre para ser lindas e impecáveis como bonecas de porcelana. É verdade também que no mundo televisivo o trabalho com a imagem muitas vezes torna-se ponto principal, mas este não é o caso das jornalistas. Deve-se pensar que, de forma geral, ali estão seres humanos, gente como a gente, que têm emprego, filhos, problemas, doenças, imperfeições, enfim, tudo o que nos torna iguais independente de gênero, etnia ou classe social.
Essa vontade de encontrar o belo no outro, principalmente quando ele não faz disso o seu trabalho, só reforça estereótipos que tanto execramos. Ver esses maus exemplos dentro do próprio jornalismo mostra o quão urgente é praticar o respeito ao próximo e mudar de vez a postura midiática em relação às mulheres.
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Julyete Louly é jornalista
Observatório da Imprensa
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