Contribua com o SOS Ação Mulher e Família na prevenção e no enfrentamento da violência doméstica e intrafamiliar

Banco Santander (033)

Agência 0632 / Conta Corrente 13000863-4

CNPJ 54.153.846/0001-90

domingo, 17 de janeiro de 2016

Onda de ataques a mulheres leva Merkel a rever acolhimento aos refugiados

Os registros de centenas de casos de ataques sexuais aumentaram as dores de cabeça da chanceler alemã para defender sua política de asilo
TERESA PEROSA
15/01/2016

A praça central localizada entre a famosa catedral gótica e a estação central de trem é o centro nervoso de Colônia, a quarta maior cidade da Alemanha, na região ocidental do país. Os protestos, as comemorações e as festas são celebrados lá, em manifestações que costumam atrair milhares de pessoas, locais e turistas. Quem foi à praça, no último dia 31 de dezembro, para a passagem de ano, não encontrou no local  um ambiente de celebração, mas sim violência e caos.

Os relatos são assustadores: centenas de mulheres denunciaram que, ao andar pela multidão,  foram agarradas por uma horda de homens embriagados e abusivos. Em meio a frases de baixo calão, os agressores, além de roubar pertences, também fizeram ataques de natureza sexual às vítimas, apalpando suas pernas, seus seios e onde mais se alcançava. Até a semana passada, mais de 500 queixas haviam sido registradas junto à polícia, inclusive duas denúncias de estupro, que teriam sido perpetrados por um grupo formado por cerca de 1.000 homens.

Na Alemanha, que acolheu em 2015 1,1 milhão de refugiados, a maioria proveniente do conflito na Síria, o maior número entre os países europeus, graças à política de portas abertas da chanceler Angela Merkel, o arrastão de Colônia virou também uma questão política. A maioria dos agressores foi descrita pelas vítimas como sendo de “aparência árabe e norte-africana”. A lista preliminar de suspeitos, divulgada no dia 9, incluía 32 nomes de diferentes origens – argelinos, marroquinos, iranianos, sírios, alemães e ainda um sérvio e um americano. Dentre eles, 22 são solicitantes de asilo. O caso ganhou ares de escândalo, depois que se descobriu que a polícia de Colônia tentou abafar o episódio. Em uma edulcorada nota oficial divulgada no dia 1º, a polícia de Colônia afirmou que as festas de Ano-Novo tinham transcorrido de maneira “pacífica”, com apenas um ligeiro aumento das “perturbações” em relação ao ano passado. Um relatório policial interno, tornado público pela revista Der Spiegel, pintou um quadro totalmente diferente: o caos na noite de Ano-Novo foi agravado pela falta de pessoal e pela indiferença dos agressores à escassa presença de policiais.

Os incidentes de Colônia, que foram registrados também, em escala menor, nas cidades de Stuttgart e Hamburgo, aumentaram as dores de cabeça de Merkel para defender sua política de asilo – que ela sustenta com o argumento verdadeiro de que, para assegurar seu futuro, a Alemanha, um país com baixa natalidade e alto índice de envelhecimento da população, precisa absorver imigrantes.  Desde outubro, a chanceler vinha sofrendo pressões, vindas de integrantes de seu próprio partido, para diminuir o ritmo de acolhida de refugiados. As críticas à política de Merkel ganharam mais força depois que Suécia e Noruega, países tradicionalmente receptivos a imigrantes, anunciaram medidas de controle na entrada de refugiados. Antes mesmo de Colônia, Merkel já anunciara que a recepção de refugiados, em 2016, não ocorreria nos mesmos números de 2015. Depois do Ano-Novo, a chanceler endureceu um pouquinho mais. Seu governo anunciou alterações na legislação para facilitar a deportação de estrangeiros condenados por crimes e o cancelamento de seu status de refugiado. Também foi anunciada a tramitação de emendas que mudam a lei que pune estupro no país. Ela era considerada arcaica por considerar estupro apenas o ato sexual no qual tenha havido comprovadamente resistência da mulher.

Members of LEGIDA, the Leipzig arm of the anti-Islam movement Patriotic Europeans Against the Islamisation of the West (PEGIDA), hold a placard showing German Chancellor Angela Merkel (Foto: Fabrizio Bensch/Reuters)
HOSTILIDADEO movimento anti-islã Legida, braço de Leipzig do Pegida, chama os refugiados de estupradores. A política de imigração de Angela Merkel está sob ataque (Foto: Fabrizio Bensch/Reuters)l (Foto: Fabrizio Bensch/Reuters)
Com esses movimentos, a habilidosa Merkel tenta conter a  retórica xenofóbica e anti-imigração que cresce no país e na Europa, na esteira da polêmica sobre a possibilidade de integração às sociedades europeias ocidentais de imigrantes provenientes de países de maioria muçulmana, com valores culturais diferentes em relação ao papel da mulher. Nesta semana, um grupo de imigrantes paquistaneses e um sírio foram atacados por gangues de hooligans em Colônia. Em um protesto em Leipzig, na parte oriental da Alemanha, membros do grupo anti-islã Pegida exibiam cartazes nos quais se lia “rapefugees” – uma fusão das palavras “estupros” e “refugiados” em inglês.

Para Lukas Gehrke, do Centro Internacional para o Desenvolvimento de Política Migratória, de Viena, o arrastão de Colônia poderá acelerar a já planejada política de controle dos fluxos de refugiados e imigrantes na Alemanha. “Vamos ver um período muito crucial à frente e, se o sentimento na Alemanha mudar 180 graus, nós veremos um impacto no governo e na cena política”, diz Gehrke. “A pressão política está crescendo e planos que já estavam no papel podem ser implementados mais rápido.” Se a noite de Ano-Novo foi um mau presságio para Merkel, ela prenuncia tempos ainda mais difíceis para os milhões de civis encurralados pela guerra civil na Síria. O infortúnio deles crescerá se a Alemanha, um dos poucos escapes de uma tragédia humanitária, também lhes fechar as portas.

Época

Nenhum comentário:

Postar um comentário