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sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Lei expõe rotina de violência contra a mulher

Publicado 07/08/2016
Por Inaê Miranda

“Venho de um casamento falido de 20 anos. Comecei a sofrer violência doméstica há mais de dez por conta dele ser usuário de droga. Tivemos um filho. Fiquei grávida do segundo, mas ele me bateu e eu perdi. Fiquei grávida do terceiro e as agressões pioraram. Eu era nova. Tinha que cuidar das crianças e, naquela conjuntura, achava a violência normal.” O relato é de J., de 38 anos. Ela conta que começou trabalhar fora e fazia de tudo para ficar longe de casa. As vítimas das agressões passaram a ser os filhos. Os vizinhos denunciaram ao Conselho Tutelar. A mulher e as crianças foram encaminhadas para acompanhamento.

Depois de iniciar o atendimento no Centro de Referência e Apoio à Mulher (Ceamo), J. reatou o relacionamento na esperança de que o companheiro pudesse se recuperar, o que não ocorreu. Além da violência física sofrida, ela passou a enfrentar a depressão. Tentou suicídio cinco vezes. Na última tentativa — enquanto estava hospitalizada — seu agressor driblou a segurança do hospital e tentou matá-la. Foi preso, mas após 60 dias foi solto. Para pedir a separação, foi necessário buscar proteção em uma casa abrigo. “Tive que me esconder para conseguir me separar.”

Assim como milhares de mulheres, ela está amparada pela Lei Maria da Penha, que completou ontem dez anos. Segundo especialistas, a legislação avançou na proteção das mulheres e na conscientização das vítimas em denunciar, mas o desafio é ainda o de reduzir o número de casos de violência.

J. conta hoje com uma medida protetiva e o seu agressor não pode se aproximar dela. Também é uma das 13 mulheres acompanhadas atualmente pelo programa GM Amigo da Mulher — programa da Guarda Municipal de Campinas, que auxilia o poder judiciário no cumprimento das medidas protetivas às vítimas de violência doméstica. Semanalmente, recebe a visita dos agentes. Elogia ainda o suporte recebido pelo Ceamo, que ajudou a fazer cumprir a lei.

Sancionada no dia 7 de agosto de 2006 pelo ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva —, a Lei Maria da Penha trouxe muitos avanços e maior rigor às punições dos agressores. A lei tipifica a violência doméstica como uma das formas de violação dos direitos humanos. Ela alterou o código penal e possibilitou que os agressores passassem a ser presos em flagrante ou que tivessem a prisão preventiva decretada, quando ameaçassem a integridade física da mulher. Também prevê medidas de proteção para a mulher que corre o risco de vida, como o afastamento do agressor do domicílio e a proibição de sua aproximação física da mulher agredida e dos filhos.

“A Lei Maria da Penha trouxe muitos avanços. Ela não permite mais a condenação do agressor com pena pecuniária, pagamento de cesta básica por exemplo. As penas são mais severas pelo reconhecimento da gravidade da violência doméstica”, explica a assistente social Elza Fratini Montali, coordenadora do Ceamo e da Coordenadoria da Mulher de Campinas. Os crimes graves como tentativa de homicídio, homicídio e lesão grave se tornaram crimes de ação pública e a mulher não pode mais retirar a denúncia contra o agressor. “Antes da lei, muitas vezes a mulher era coagida pelo agressor e ia à delegacia retirar a queixa. Hoje, não pode mais porque virou crime de ação pública.”

Outro avanço foram as medidas protetivas. “Quando a mulher está em situação de risco, o juiz tem um prazo de 48 horas para expedir a medida protetiva de urgência, obrigando o afastamento do agressor do lar. Os processos se tornaram mais ágeis para garantir a proteção da mulher”, afirmou.

Notificações
O Sistema de Notificação de Violência em Campinas registrou apenas no primeiro semestre de 2015 um total de 250 atendimentos a mulheres vítimas de violência, entre 18 e 59 anos, na rede municipal de enfrentamento e prevenção às violências. Em 2014 foram 367 casos. Os dados policiais envolvendo violência doméstica em Campinas não são disponibilizados no site da Secretaria de Segurança Pública (SSP), diferentemente do que ocorre com outros tipos de crimes.

O que se sabe é que, mesmo com a instituição da Lei Maria da Penha, de maneira geral, os indicadores de violência contra a mulher são altos. Uma em cada cinco mulheres no Brasil já sofreu algum tipo de violência doméstica ou familiar, segundo o levantamento DataSenado. Outro número que assusta é o de feminicídio. Dados do Mapa da Violência 2015 colocam o Brasil em 5º lugar num ranking de 83 países em assassinatos de mulheres. O disque-denúnica (pelo telefone 180) aponta um aumento de 44,7% no número total de registros relacionados à violência contra a mulher. Foram 76.651 ligações em 2015 e 42.388 em 2014.

Segundo os especialistas, o aumento das denúncias de violência contra mulher está relacionado mais à conscientização das vítimas do que com o efetivo aumento no número dos casos. “O que a gente acredita é que as mulheres estão tendo mais coragem de fazer a denúncia. Não necessariamente que a violência tenha crescido. Elas estão tendo mais acesso à informação e para fazer a denúncia, o que aumenta o número”, afirma a advogada Lúcia Helena Octaviano, da Organização Não Governamental SOS Ação Mulher e Família.

SERVIÇOS
Ligue 180 - Central de atendimento à mulher em situação de violência. A ligação é gratuita e o serviço funciona 24 horas, durante todos os dias da semana.
DDM Campinas - O endereço é Avenida Governador Pedro de Toledo,1.161, Bonfim. O telefone é (19) 3242-5003.
Ceamo - O endereço é Avenida Francisco Glicério, 1.260 (prédio do Conselho Tutelar), Centro. O horário de atendimento é de segunda-feira a sexta-feira, das 8h às 17h. O telefone é 0800 7771050.
SOS Ação Mulher e Família - O endereço é Rua Dr. Quirino, 1.856, Centro de Campinas. O telefone é (19) 3232-1544.

I., 55 anos
PONTO DE VISTA
Não sabia o que era viver
“No meu caso, o problema era a desconfiança. Qualquer coisa que saía do lugar a culpa era minha. Sumia um dinheiro, ele dizia que fui eu. Eu só era boa enquanto trabalhava. Depois que fiquei doente, não prestava mais. Falava que eu era louca, preguiçosa. Foram 33 anos de casamento. Só os dois primeiros foram razoáveis. No Ceamo foram me dando força e coragem para enfrentar a vida. Não sabia o que era viver. Só chorava e aguentava calada. Logo vai sair o meu divórcio. Quero sarar e ser feliz.”

‘Lei possibilita pedidos de medidas protetivas’

Confira íntegra de nota da Secretaria de Segurança sobre os efeitos da lei:
"A Delegacia de Defesa da Mulher de Campinas informa que, na esfera policial, a Lei nº 11.340-2006 - Maria da Penha tem possibilitado a solicitação de medidas protetivas, quando solicitadas, para vítimas que registram ocorrências envolvendo delitos ocorridos no âmbito doméstico/familiar, ou mesmo aqueles onde haja ou tenha havido relação íntima de afeto entre a vítima e o autor. Quando uma vítima solicita proteção, o pedido é encaminhado ao Poder Judiciário, que concede ou não. A medida visa proteger a solicitante, evitando a ocorrência de novos delitos, ou mesmo do agravamento da situação de violência. Dentre as medidas previstas, estão o afastamento do agressor do lar e a proibição da aproximação e de contato com a vítima, que são eficazes na coibição da violência doméstica. A manifestação do Supremo Tribunal Federal na ADI 4424, de fevereiro de 2012, tornou as ações penais envolvendo delitos de lesão corporal ocorridos no âmbito da Lei Maria da Penha públicas. Isso reforçou a inibição dos delitos, e tem evitado que as vítimas se sintam coagidas pelos agressores a retirarem suas queixas.”

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