Beatriz Montesanti 30 Ago 2016
Para o especialista em mídia digital Ronaldo Lemos, iniciativas se popularizaram ao colocar as mulheres no controle
Sites de relacionamento existem desde os primórdios da internet, mas nunca foram tão populares quanto os aplicativos de paquera que se multiplicaram nos últimos anos.
Para Ronaldo Lemos, advogado especializado em mídias digitais, há um motivo crucial pelo sucesso: o feminismo. O que esses serviços trouxeram de diferente em relação aos antigos sites, além de serem mais adequados tecnologicamente aos tempos atuais, foi colocar as mulheres no controle. Lemos escreveu sobre o tema em uma coluna publicada na revista “TPM” em agosto.
Diferentemente das antigas páginas de relacionamento, no Tinder, Happn e demais opções do gênero criadas nos últimos cinco anos, a comunicação entre duas pessoas só se dá a partir de uma demonstração mútua de interesse.
“Nos primórdios da internet, as poucas mulheres que se aventuravam a ingressar nos sites de paquera (lembrando que aplicativos nem existiam naquela época!) eram assediadas por um número avassalador de homens em busca do par perfeito. A ponto de que esses ambientes virtuais de paquera muitas vezes se tornavam inóspitos para a presença feminina.”
Ronaldo Lemos
Advogado, em coluna na revista “TPM”
Uma pesquisa da Universidade Queen Mary, de Londres - e citada por Lemos em seu artigo - comprovou que há uma diferença expressiva de comportamento entre homens e mulheres em busca de um parceiro.
No caso de sites e aplicativos de paquera, essa diferença se expressa pelo número de pessoas que cada gênero se interessa. Homens tendem a demonstrar interesse por um número maior de mulheres, mas recebem apenas 0,6% de retorno. Mulheres tendem a ser mais seletivas, e recebem 10% de retorno.
“Pode parecer um detalhe, mas essa transferência de poder para o universo feminino revolucionou a dinâmica dos relacionamentos na internet. Primeiro ao eliminar o desconforto do assédio masculino constante na rede. Segundo, abrindo as portas para a popularização desse tipo de ferramenta, que hoje faz parte do tecido urbano de qualquer cidade”, conclui Lemos.
Ainda não é suficiente
A liberdade e empoderamento promovidos pelos aplicativos, no entanto, não foi o suficiente. Um relatório da Pew Research Centre, publicado em 2013, mostrou que 28% dos usuários de sites de relacionamento sofreram algum tipo de assédio - 42% entre as mulheres, ante 17% entre homens. O Tinder, serviço mais popular da atualidade, surgiu em setembro de 2012.
Abusos do gênero foram reunidos na conta do Instagram - agora no Twitter - feminist_tinder. Nela, a garçonete Laura Nowak expõe mensagens sexistas que recebeu após adicionar “feminista” ao seu perfil no Tinder. Entre as conversas reveladas, estão questionamentos como “Por que você está no Tinder se é feminista?” e “Você tem um rosto bonito, por que desperdiçá-lo assim?”.
Desconfortos nas redes - como o envio de “nudes” não requisitadas - fizeram com que outras alternativas surgissem, ainda mais focadas no comportamento feminino - considerando relacionamentos heterossexuais.
Em outubro de 2015, a empresária Whitney Wolfe, cofundadora do Tinder, lançou um aplicativo autoproclamado feminista, com o objetivo de acabar com os assédios on-line. Chamado Bumble, o serviço permite apenas mulheres de iniciarem o contato com outra pessoa.
Para a empresária, quando a mulher toma a iniciativa, homens tendem a ser mais educados, o que diminuiu comportamentos abusivos e o assédio entre os usuários do aplicativo, disse ela em entrevista à BBC.
"Nós trabalhamos, criamos, apoiamos nós mesmas e isso é algo estimulante. A única coisa que não se atualizou foi a maneira como nos relacionamos. Independentemente do seu país ou faixa etária, ainda persiste uma regra não escrita de que o homem é que tem de tomar a iniciativa (na paquera) e sair 'à caça'."
Whitney Wolfe
Cocriadora do Tinder e do Bumble, à BBC
Wolfe rompeu com seus sócios do Tinder meses antes de lançar o Bumble. Ela processou um dos fundadores por assédio sexual e teria recebido US$ 1 bilhão em um acordo realizado.
Outras plataformas de relacionamento foram criadas nesse sentido. O Siren, por exemplo, permite controlar o quanto do perfil é visível, além de viabilizar o bloqueio de alguns usuários.
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