Marcela Caetano
As mulheres estão ganhando espaço nos cargos de liderança das empresas do agronegócio, mas ainda há muita barreira a ser derrubada
Ainda na adolescência, a paulista Priscila Vansetti decidiu que trabalharia no mundo do agronegócio. O clique ocorreu em uma excursão escolar, depois de ela visitar o Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena/Esalq/USP). Vansetti ficou tão fascinada com aquele universo que, anos depois, mais precisamente em 1981, se formaria em agronomia na própria Esalq. Ela imaginava brilhar no campo, mas não tinha ideia que seria no de negócios. Afinal, Vansetti, 58 anos de idade, não apenas entrou em um universo masculino como se tornou CEO da DuPont Brasil, a primeira mulher a ocupar o cargo em 79 anos de história da subsidiária da americana no País. Sob seu comando estão 2,3 mil funcionários e uma operação que faturou US$ 1,4 bilhão no ano passado. “Fui criada acreditando que o mundo está aí para ser conquistado”, diz ela que, em outubro, comemora um ano no posto máximo da multinacional.
Por causa de posturas como a de Vansetti, a presença de mulheres em setores do agronegócio tem sido cada vez mais constante, embora a percepção é de que elas ainda sejam uma minoria, principalmente em cargos de liderança. No Brasil não há dados de mapeamento dessas carreiras, mesmo porque as pesquisas são escassas também para mulheres que atuam em outros setores da economia. O que há de disponível são levantamentos mais abrangentes, como o da International Business Report (IBR) – Women in Business, realizado pela consultoria americana Grant Thornton em 36 países, incluindo o Brasil. Os dados mostram que as mulheres ocupam 11% dos cargos de CEOs, o equivalente à presidência de uma companhia, e também 11% dos cargos de CFO, profissionais que respondem pela área financeira. Levando em conta os demais cargos de alto escalão, como as diretorias, por exemplo, a média global dos postos ocupados por mulheres é de 24%. No entanto, no Brasil, o índice cai para 19%. “No caso do agronegócio, o setor é historicamente mais masculino, mas isso está mudando rapidamente”, diz Luiz Carlos Correa, presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag). “O que queremos é entender o perfil dessas mulheres para identificar quais são os limites e as dificuldades que elas enfrentam em suas carreiras.” Não por acaso, a entidade é uma das patrocinadoras do 1º- Congresso Nacional das Mulheres do Agronegócio, que será realizado em São Paulo nos dias 25 e 26 de outubro. No evento, uma pesquisa inédita será apresentada.
Para a administradora Karen Musafir, que também trabalha na DuPont há 13 anos, ocupa o cargo de CFO e responde a Vansetti, a pesquisa pode confirmar de fato o que ela também constata em sua rotina. “Estou no setor agrícola há sete anos e hoje vejo muito mais mulheres na área do que quando entrei”, afirma Musafir, que coordena uma equipe composta em sua maioria por mulheres. No País, a DuPont emprega 2,4 mil funcionários. “As empresas sabem que se não abrirem oportunidades em seus quadros para as mulheres, que são mais de metade da população, perderão talentos”, diz Vansetti. Por isso, nos últimos anos, a DuPont tem investido em mentoria, processo no qual uma pessoa mais experiente, ou com mais conhecimentos, ajuda a orientar a carreira de outras, preparando-as para a liderança em uma companhia.
Na Dow, multinacional americana da área química, o projeto global de liderança para elas atende pelo nome de Women Innovation Network (WIN). Trata-se de uma rede para dialogar sobre as barreiras no mercado de trabalho, além promover a colaboração visando o acesso aos cargos de liderança. A política tem dado resultado. Na subsidiária Dow AgroSciences Brasil, que atua por aqui na área de proteção de cultivos e sementes, 30% de seu quadro de funcionários é formado por mulheres. São cerca de 450, do total de 1,5 mil. Já nos cargos de diretoria, as mulheres representam 25%. Marilene Iamauti, diretora de Assuntos Corporativos da unidade, diz que a atual presença de mulheres na companhia é resultado de um trabalho intenso para ampliar o número de boas candidatas por vaga. “Há dez anos isso não era assim”, afirma Iamauti. “Trabalhamos muito no estabelecimento de cotas para a contratação de mulheres.” Graduada em agronomia também pela Esalq, ela salienta que as barreiras profissionais para as mulheres são imensas, mas que é possível derrubá-las.
Foi o que fez a farmacêutica Daniela Contri, gerente de Inovação e Estratégia na América Latina da multinacional alemã Basf, ao participar do processo de registro da primeira soja transgênica desenvolvida no Brasil pela companhia, em parceria com Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). O processo que começou em 2008 foi concluído no ano passado, com a aprovação da soja em 17 países. Para ela, é importante que mais mulheres estejam nas empresas para a promoção da diversidade. “Sinceramente, espero que um dia a presença de mulheres na liderança seja tão óbvia e que ela não seja mais assunto”, diz Contri. “Para isso, basta que as mulheres tenham oportunidade.” Atualmente, nos países da América do Sul, 29% dos cargos de liderança na Basf são ocupados por mulheres. Em todo o mundo, o índice é menor, mas a empresa quer chegar em 2021 com até 24% de seus cargos de chefia nas mãos delas.
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