27.07.2017 - POR FERNANDA MOURA GUIMARÃES
Cidades como Paris, Madri e Nova York vêm fazendo campanhas de conscientização sobre ocupação desproporcional do assento por homens nos transportes públicos. Mas mais que um incômodo cotidiano, o menspreading reflete muito sobre o compartilhamento de espaços coletivos. Explicamos
Horário de pico, ônibus ou metrô cheio e, enquanto você se espreme no assento, o seu colega de viagem ao lado está sentado com todo conforto, pernas abertas e braços relaxados. Quem nunca viu (ou viveu) essa situação? Pois o fenômeno já tem nome: menspreading. A palavra - que significa literalmente, em inglês, “a expansão do sexo masculino” - designa a atitude de homens que tomam um espaço desproporcional em locais coletivos, especialmente nos assentos de transportes públicos, abrindo as pernas e deixando menos espaço para seus vizinhos. No início deste mês a prefeitura de Paris iniciou uma iniciativa nos metrôs da cidade para sensibilizar a população ao ocorrido. A campanha parisiense segue a de Madri, que instalou sinais que proíbem esta prática no metrô na capital espanhola em junho. Mas os madrilenhos também não foram os primeiros a falar no fenômeno.
Uma palavra popularizada em Nova York
Segundo Oxford Dictionary, a primeira ocorrência da palavra foi em 2008, na internet, e o termo ganhou popularidade em 2013 com a criação do Tumblr "Men taking too much space on the train" ( "Os homens que tomam muito espaço no metrô"). Em 2014, o metrô de Nova York iniciou uma campanha contra o menspreading que diz "Dude, stop the spread" (algo como "Cara, pare de se espalhar") e o menspreading entrou definitivamente para o vocabulário da agenda feminista. Mas, apesar de o termo ser relativamente recente, o fenômeno é um assunto já antigo. “Qual mulher já não se sentiu constrangida com um homem que senta ostensivamente de pernas abertas em um espaço limitado como um banco de ônibus ou um sofá de sala de espera?”, questiona a Cristina Scheibe Wolff, professora titular do Departamento de História da UFSC e especialista em estudos de gênero. “Creio que agora, com o crescimento de movimentos feministas e um engajamento grande de mulheres jovens nestes movimentos, o tema ganha maior notoriedade e importância, especialmente porque não se trata apenas de um lugar no banco, mas também uma questão de ocupação de espaços e territórios, de direitos”, acrescenta.
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Para a professora do Instituto de Psicologia/UERJ e coordenadora do DEGENERA – Núcleo de Pesquisa e Desconstrução de Gêneros, Amana Matos, manspreading é um reflexo da vigilância pública exercida sobre o corpo das mulheres e suas sexualidades. “A ideia de que as mulheres precisam ser contidas e recatadas está associada a essa questão”, afirma. O ato de abrir as pernas enquanto as mulheres fecham abre espaço para um debate sobre a posição inferiorizada da mulher. O homem de pernas abertas, seja de pé ou sentado, evoca uma imagem de virilidade. “Também é uma forma de dizer: Eu sou um homem, um macho, eu sou o dono desse espaço, se você quiser estar aqui terá que me pedir licença”, afirma Cristina. “Já para mulheres e meninas ensina-se que devem ficar com as pernas fechadas, que devem ter pudor, que devem se encolher, que não devem aparecer”, continua.
Manspreading fora do metrô
A priorização ou dominação masculina dos espaços públicos não só fica evidente no transporte público, mas em outras situações e contextos cotidianos. “Nas escolas, por exemplo, é comum que se privilegiem os espaços coletivos para a prática de esportes por meninos e rapazes; que eles sejam estimulados a ficar mais à vontade em relação à sua aparência do que meninas e garotas, que são muito mais cobradas esteticamente. Na política institucional, as mulheres são muito poucas e são frequentemente colocadas em dúvida em relação a sua competência apenas pelo fato de serem mulheres”, explica Amana. A solução para o menspreading? Para as duas especialista, a conscientização como vêm fazendo as prefeituras internacionais funciona, mas é necessário abrir o debate em outras esferas. “Falar sobre a questão abertamente é importante, pois acredito que muitos homens sequer percebam o quanto incomodam com essa postura”, sugere Amana. “A educação precisa pensar sobre gênero, etnia, sexualidade, deficiência, geração, diversidade. É necessário que estes conteúdos sejam incorporados nos currículos, nos programas de televisão, na comunicação social do governo, nas políticas públicas e também nas famílias”, finaliza Cristina.
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