por Djamila Ribeiro — publicado 31/07/2017
A esquerda, que tanto ovacionou a filósofa norte-americana, tem muito a aprender com ela e sua obra
Nunah Alle/Setorial Nacional de Mulheres do PSOL
"Tenho falado da liderança das mulheres negras, mas deveria estar me referindo à liderança feminista negra", afirmou Davis em seu discurso na UFBA
Angela Davis esteve no Brasil recentemente. Na Universidade Federal do Recôncavo Baiano, ministrou uma aula pública e um curso sobre feminismo negro decolonial. Em 25 de julho, Dia Latino-Americano e Caribenho da Mulher Negra, lotou a reitoria da Universidade Federal da Bahia para uma palestra emocionante. Organizado por instituições feministas negras de Salvador, a exemplo do Instituto Odara, o evento é simbólico para a luta antirracista e antimachista no País.
Em um dos trechos de seu discurso na UFBA, Davis diz: “Tenho falado da liderança das mulheres negras, mas deveria estar me referindo à liderança feminista negra. Enquanto for necessário enfatizar a categoria de mulheres negras pela perspectiva de gênero e raça, temos de nos dar conta das implicações de classe, raça, sexualidade, habilidade e gênero para além do binarismo convencional, e que nosso foco deve ser para as mulheres negras empobrecidas, incluindo as mulheres negras encarceradas".
A filósofa prossegue: "As mulheres negras queer, as mulheres negras trans, as mulheres negras com deficiência. Mas, também, sabemos que não estamos focando em mulheres negras de forma separatista, porque as mulheres negras sempre se engajaram nas lutas de outros grupos – por vezes, ao ponto de se excluírem (subjugando suas próprias lutas). As mulheres negras estão entre os grupos mais ignorados, subjugados e atacados do planeta. Estão entre os grupos mais não libertos do mundo. Mas, ao mesmo tempo, mulheres negras têm uma trajetória histórica que perpassa o tempo, as barreiras geográficas e fronteiras, sempre mantendo a esperança da liberdade viva”.
Num momento em que as militâncias negras ganham mais visibilidade no Brasil e com isso são covardemente atacadas – inclusive por integrantes de esquerda –, é fortalecedor termos Angela Davis no País ressaltando a importância da luta das mulheres negras, ainda à margem da sociedade em sua grande maioria. Essa citação acima mostra como é fundamental partirmos de outras perspectivas de análise na luta anticapitalista.
Enfatizar a categoria de mulheres negras é necessariamente pensar a partir de uma análise interseccional que dê conta de pensar as categorias de raça, classe e gênero de modo indissociável, pois agem de formas combinadas e entrecruzadas.
É pensar classe, evidentemente, mas não de forma ortodoxa e hierárquica, mas, sim, de forma interligada. O nome de sua palestra na UFBA, "Atravessando a Luta Contra o Racismo", é bem significativo das nossas demandas no Brasil.
Antenada com a realidade brasileira, Davis diz que os movimentos dos Estados Unidos têm muito a aprender com os do Brasil. “Carolina Maria de Jesus lembrou que a fome deveria nos levar a refletir sobre as crianças e sobre o futuro e muito antes que o conceito de interseccionalidade fosse utilizado pela primeira vez, Lélia Gonzalez nos conclamou a entender a complexa inter-relação entre raça, classe e gênero, mas também a compreender os nossos elos com as populações indígenas, entre os povos indígenas e negros. E essa é uma das lições que nós, nos EUA, precisamos aprender com a história do feminismo no Brasil.”
A esquerda, que tanto a ovacionou, tem muito a aprender com ela e sua obra. Como a filósofa diz no texto “Mulheres negras na construção de uma nova utopia”, que as organizações de esquerda entendam que não se pode criar primazia de uma opressão sobre outras, porque raça informa classe.
Viva o pensamento de Angela Davis!
Carta Capital
Em um dos trechos de seu discurso na UFBA, Davis diz: “Tenho falado da liderança das mulheres negras, mas deveria estar me referindo à liderança feminista negra. Enquanto for necessário enfatizar a categoria de mulheres negras pela perspectiva de gênero e raça, temos de nos dar conta das implicações de classe, raça, sexualidade, habilidade e gênero para além do binarismo convencional, e que nosso foco deve ser para as mulheres negras empobrecidas, incluindo as mulheres negras encarceradas".
A filósofa prossegue: "As mulheres negras queer, as mulheres negras trans, as mulheres negras com deficiência. Mas, também, sabemos que não estamos focando em mulheres negras de forma separatista, porque as mulheres negras sempre se engajaram nas lutas de outros grupos – por vezes, ao ponto de se excluírem (subjugando suas próprias lutas). As mulheres negras estão entre os grupos mais ignorados, subjugados e atacados do planeta. Estão entre os grupos mais não libertos do mundo. Mas, ao mesmo tempo, mulheres negras têm uma trajetória histórica que perpassa o tempo, as barreiras geográficas e fronteiras, sempre mantendo a esperança da liberdade viva”.
Num momento em que as militâncias negras ganham mais visibilidade no Brasil e com isso são covardemente atacadas – inclusive por integrantes de esquerda –, é fortalecedor termos Angela Davis no País ressaltando a importância da luta das mulheres negras, ainda à margem da sociedade em sua grande maioria. Essa citação acima mostra como é fundamental partirmos de outras perspectivas de análise na luta anticapitalista.
Enfatizar a categoria de mulheres negras é necessariamente pensar a partir de uma análise interseccional que dê conta de pensar as categorias de raça, classe e gênero de modo indissociável, pois agem de formas combinadas e entrecruzadas.
É pensar classe, evidentemente, mas não de forma ortodoxa e hierárquica, mas, sim, de forma interligada. O nome de sua palestra na UFBA, "Atravessando a Luta Contra o Racismo", é bem significativo das nossas demandas no Brasil.
Antenada com a realidade brasileira, Davis diz que os movimentos dos Estados Unidos têm muito a aprender com os do Brasil. “Carolina Maria de Jesus lembrou que a fome deveria nos levar a refletir sobre as crianças e sobre o futuro e muito antes que o conceito de interseccionalidade fosse utilizado pela primeira vez, Lélia Gonzalez nos conclamou a entender a complexa inter-relação entre raça, classe e gênero, mas também a compreender os nossos elos com as populações indígenas, entre os povos indígenas e negros. E essa é uma das lições que nós, nos EUA, precisamos aprender com a história do feminismo no Brasil.”
A esquerda, que tanto a ovacionou, tem muito a aprender com ela e sua obra. Como a filósofa diz no texto “Mulheres negras na construção de uma nova utopia”, que as organizações de esquerda entendam que não se pode criar primazia de uma opressão sobre outras, porque raça informa classe.
Viva o pensamento de Angela Davis!
Carta Capital
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