15 Maio 2017
“Reconhecemos que vários membros da Igreja se manifestaram contra a violência de gênero. Mas também sabemos que, sobre o tema, há sérios problemas, não só nas nossas sociedades, mas também dentro das nossas próprias Igrejas. Conhecemos e experimentamos abusos dentro das nossas Igrejas. Clero masculino abusa do clero feminino, homens nas congregações abusam de mulheres e moças nas igrejas, e às vezes as lideranças dessas Igrejas se recusam a reconhecer o problema. Assédios e violências devem ser banidos das nossas Igrejas, de todas as Igrejas. Os seres humanos não estão à venda, um cargo não pode ser obtido apenas com favores sexuais. As tradições consolidadas ao longo dos séculos e até a teologia são utilizadas para frear o processo de paridade entre os sexos, para parar a voz das mulheres. Condenamos tudo isso, porque a Igreja deve ser lugar de paz, começando pelas suas lideranças, que devem ser formadas para reconhecer as violências e capazes de dizer ‘chega’ às violências de gênero.”
A reportagem é de Claudio Geymonat, publicado no sítio Riforma, 11-05-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O texto produzido pela pré-assembleia das mulheres luteranas, que se reuniram nos últimos dias, não deixa espaço para maus entendidos: um apelo apaixonado e indignado, ao mesmo tempo, que chama, sem possibilidade de réplica, às próprias responsabilidades até mesmo as comunidades de fé. Um documento fruto de intensas discussões, que leva em conta a particular condição sociocultural de muitas realidades, mas que, talvez, com tons e matizes diferentes, pode ser válido para todas as latitudes. A violência não é só a física, mas também se manifesta de várias formas, mais ou menos sutis, mais ou menos consolidadas.
Não por acaso, os próprios pré-sínodos regionais, particularmente os africanos e os asiáticos, ressaltaram que as mulheres são, de fato, excluídas dos papéis de liderança dentro do organograma das Igrejas, embora hoje 82% das Igrejas-membro da Federação Luterana Mundial reconheçam a ordenação de pastoras. Mas, para muitas, quando conseguem terminar seus estudos com dificuldade, não é, de fato, concedida a possibilidade de exercer o ministério.
O documento, aprovado por uma ampla maioria em meio a um rio de aplausos pela Assembleia Luterana Mundial, que ocorre nestes dias em Windhoek, capital da Namíbia, cita o texto de Martinho Lutero “O cativeiro babilônico da Igreja”: “Somos todos sacerdotes. Os sacerdotes são ministros escolhidos entre nós, e tudo o que fazem, o fazem em nosso nome”.
Os gritos são unissex, com a esperança de que não permaneçam como externações públicas voltadas para si mesmas, mas como tomada de consciência real em relação a uma chaga, vergonha não só das Igrejas, mas também das sociedades inteiras.
Nem tudo é obscuro no horizonte. As mulheres luteranas mostram que gostam, e muito, do documento sobre a justiça de gênero, disponível hoje em 22 línguas diferentes, fruto de anos de trabalho da Federação Luterana Mundial, que desembocou em um texto que está inspirando muitas comunidades de fé, mas exortando todos os líderes do movimento luterano a assumi-lo, sempre e em toda parte, encontrando recursos e energias para desenvolver grupos de trabalho sobre o assunto.
No seu amplo e, às vezes, tocante discurso de saudação no fim dos seus sete anos à frente da Federação Luterana Mundial, o bispo Munib Younan não dedicou nenhuma linha ao assunto. Sinal, talvez, de que o caminho a ser feito para uma real justiça de gênero ainda é longo.
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