Contribua com o SOS Ação Mulher e Família na prevenção e no enfrentamento da violência doméstica e intrafamiliar

Banco Santander (033)

Agência 0632 / Conta Corrente 13000863-4

CNPJ 54.153.846/0001-90

terça-feira, 16 de outubro de 2012


Novo texto, polêmicas antigas

Pela proposta em tramitação, o aborto seria descriminalizado, e a eutanásia poderia não ser punida dependendo das circunstâncias de sua realização
DIEGO RIBEIRO
Aborto e eutanásia, dois temas que causam muitas polêmicas no Brasil, devem vir à tona novamente nos próximos meses, com a discussão da reforma do Código Penal (CP) no Congresso. Pelo novo texto em tramitação, o aborto seria descriminalizado, e a eutanásia poderia não ser punida dependendo das circunstâncias de sua realização. Para muitos especialistas, os temas são muito controversos para as proposições correrem a passos tão largos em Brasília. Durante sete meses de trabalhos, houve apenas quatro audiências públicas em Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre, além de dois seminários, em Aracaju e Cuiabá, para debater todas as propostas da reforma.
Todos os especialistas ouvidos pela reportagem concordam que esses dois temas precisam de mais debate. É o que acredita o professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR), José Antônio Peres Gediel. Segundo ele, seria preciso amadurecer o debate antes de levá-lo ao Legislativo e de chegar às questões penalistas.
Autonomia
Médico poderá se negar a fazer aborto mesmo se prática for aprovada
O presidente do Conselho Regional de Medicina do Paraná, Alexandre Gustavo Bley, defendeu a atitude médica nos casos de aborto e lembrou que a entidade não vê com bons olhos a eutanásia. Ele ressaltou que, caso a proposta de mudança do Código Penal seja aprovada, o médico não será obrigado a realizar um aborto. “Ele poderá avaliar [como explica o texto do documento]. Fazer um diagnóstico é diferente de proceder ao aborto”, afirma.
De acordo com ele, o aborto é uma questão multifatorial que envolve a educação da população e envolvimento da saúde pública. Sobre a liberação do aborto em fetos com anencefalia, ele lembra que o Supremo Tribunal Federal já definiu o caso, ressaltando que isto passa por uma avaliação de foro íntimo da mãe.
A eutanásia, que abrevia o curso da história do paciente, não é aceita pelo CRM. “A proposta de flexibilização é vedada pelos conselhos regionais de medicina”, afirma.
Religião
Igreja Católica não se opõe à ortotanásia, mas rechaça outras práticas
O coordenador do Núcleo Arquidiocesano de Bioética de Curitiba, padre Juarez Rangel, diz que a Igreja Católica não se opõe à ortotanásia, que é a morte natural, sem a interferência da ciência ou tecnologia para abreviar a vida ou prolongá-la – mesma posição defendida pelo Conselho Regional de Medicina. Na reforma do Código Penal, a ortotanásia deixaria de ser crime.
Porém, em relação ao aborto e eutanásia, a Igreja se coloca “a favor da vida” e rechaça a possibilidade de descriminalizar o aborto. “A Igreja é a favor da vida, em especial quando há fragilidades em questão”, ressalta Rangel, sobre ambos os casos.
Rangel explica que a Conferên­cia Nacional dos Bispos do Brasil está recolhendo assinaturas para mostrar que a população é contrária a essas propostas. “O Legislativo deveria ouvir mais a população, e me parece que isso não tem ocorrido de maneira satisfatória”, diz.
O padre ressalta que pensar na morte como solução é preocupante em qualquer sociedade. “Há uma banalização em curso: não estamos olhando para vida com o devido valor”.
13 mil
manifestações de cidadãos para alterações e contribuições em todas as matérias que envolvem a reforma do Código Penal foram recebidas até a semana passada pelo serviço “Alô Senado”. O projeto poderá sofrer alterações, mediante emendas e, inclusive, ser rejeitado no plenário do Senado ou na Câmara dos Deputados, em próxima etapa. A comissão de juristas fez mais de vinte reuniões para debater a reforma.
Ortotanásia
Pelas propostas de mudança, não haverá crime quando o agente deixa de fazer uso de meios artificiais para manter a vida do paciente em caso de doença grave irreversível, e desde que essa circunstância esteja previamente atestada por dois médicos e haja consentimento do paciente, ou, na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge, companheiro ou irmão.
A Universidade de Brasília chegou a estimar em uma pesquisa feita dois anos atrás que uma em cada sete brasileiras entre 18 e 39 anos já havia realizado ao menos um aborto. Na avaliação de Gediel, a discussão ideal sobre o tema teria de ser dividida em subtemas, como saúde da mulher, perspectivas do direito à personalidade e dos direitos fundamentais e, só então, partir para o direito penal. “As entidades que estão pensando o Código Penal devem abrir o debate para tentar entender os interesses em jogo. Trata-se de ver a questão inteira, com toda a sua complexidade”, diz ele, afirmando que o Brasil deve criar a cultura do debate.
Causa
Para o coordenador do curso de Bioética da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Mário San­­chez, é preciso discutir porque as mulheres fazem aborto no Brasil. “Pessoalmente, a questão jurídica não é relevante. É preciso criar condições para que as pessoas não precisem abortar”, observa. Segundo ele, a cada 100 partos no mundo, 30 são abortos. “O problema não é se há crime ou não. Aborto é um pacote de dor para a criança, a mulher e o sistema de saúde. A questão deve ser sobre o porquê de haver aborto no Brasil”, destaca.
O texto do documento que tramita no Senado insere uma nova possibilidade de não aplicação de pena no caso do aborto – que se soma aos casos em que a mulher for vítima de violência sexual ou quando houver risco à vida da gestante: quando a gestante, até a 12.ª semana de gravidez, quiser e um médico ou psicólogo atestar falta de condições psicológicas para ela arcar com a maternidade. O anteprojeto de reforma também prevê a possibilidade de não aplicação de pena em casos de aborto de feto anencéfalo.
Debate sobre eutanásia foca em limites da ciência e possíveis abusos
Sobre a eutanásia, o debate ainda suscita muitos questionamentos. De acordo com o professor José Antônio Peres Gediel, da UFPR, é necessário ampliar a discussão sobre o papel da tecnologia para prolongar a vida. “Por que a vida é prolongada cada vez mais?”, questiona. Outra questão fundamental antes de entrar no direito penal, para Gediel, é tratar sobre quem efetivamente decide pela eutanásia. “O debate sobre o poder médico não é feito com a profundidade necessária na sociedade brasileira. É como se os familiares pudessem tomar as decisões [sobre eutanásia] sem a presença desse profissional”, comenta.
O professor Mário San­­chez, da PUCPR, defende que no caso da eutanásia, do ponto de vista teórico, pode haver certa flexibilidade, mas, quando se parte para a prática, abrem-se brechas para abusos. “Em países como a Holanda, que é pequeno e homogêneo, a eutanásia é liberada, em 60% dos casos o protocolo não é seguido. Seria uma loucura [permitir a eutanásia]. Haveria manipulação do processo”, diz.
O promotor Paulo Sérgio Markovicz de Lima, da Va­­ra do Tribunal do Júri de Curitiba, também critica a proposta de mudança no anteprojeto sobre eutanásia, cuja prática não seria mais punida. “Vai haver um estímulo à eutanásia. O fato de pessoas mais próximas autorizarem o procedimento deveria ser até um agravante, já que pode acabar ocorrendo por dinheiro”, diz.

http://www.gazetadopovo.com.br/vidaecidadania/conteudo.phtml?tl=1&id=1308468&tit=Novo-texto-polemicas-antigas

Nenhum comentário:

Postar um comentário