As instituições de ensino e pesquisa deveriam orientar mais explicitamente suas ações e políticas, de modo a gerar benefícios tangíveis
por Thomaz Wood Jr.
Instituições de ensino orientam-se a ações sociais Rodrigo_Soldon/Flickr |
No dia 26 de dezembro de 2013, o médico Marco Antonio Zago foi escolhido pelo governador de São Paulo, a partir de uma lista tríplice, para o cargo de reitor da USP. Durante a campanha, Zago disse à imprensa que “a USP precisa fazer mais. Isso porque, além de centro produtor de conhecimento e de formação, a USP tem de ser instrumento de mudança da sociedade”.
A declaração de Zago é significativa. De fato, existe no mundo acadêmico crescente preocupação com o impacto social, ou seja, em gerar conhecimento e realizar atividades capazes de trazer melhorias para a sociedade. A ambição é ir além do ensino, das pesquisas e da publicação de livros e artigos. O objetivo é prover benefícios tangíveis.
O tema do impacto social não é novo. O marco inicial das preocupações atuais é frequentemente atribuído ao trabalho pioneiro do americano Wannevar Bush. Seu relatório: “Science: The endless frontier”, divulgado em 1945, advogava que a ciência deveria satisfazer as necessidades da população; e os motores da prosperidade seriam o conhecimento científico e o desenvolvimento tecnológico. Portanto, quanto mais recursos forem aplicados na ciência, maior seria o benefício social.
A partir dos anos 2000, percebeu-se que o avanço do conhecimento não implica, inexoravelmente, a criação de riqueza, e que bem-estar social é mais que crescimento econômico. Isso levou à busca de indicadores de impacto mais sensíveis às demandas sociais.
No entanto, medir o impacto social do conhecimento gerado em universidades e instituições de pesquisa não é tarefa trivial. Para desvendar o enigma, diversos países desenvolveram e testaram sistemas para avaliação do impacto social. Um relatório da Comissão Europeia, de 2010, documenta os casos da Finlândia, da Alemanha e da Holanda. Os processos de geração, disseminação e apropriação do conhecimento variam significativamente entre disciplinas. Em cada campo do conhecimento existem mecanismos específicos que podem transformar os resultados da pesquisa ou do processo de geração do conhecimento em impacto social. Por isso, o modelo de avaliação deve ser multidimensional. Para cada dimensão, deve-se responder a questões práticas e objetivas.
A primeira dimensão refere-se às atividades de ensino e aprendizado. Estamos formando profissionais nas especializações corretas e com as competências necessárias para atender a sociedade? Ou mantemos cursos e conteúdos anacrônicos, defasados dos interesses e das necessidades do País?
A segunda dimensão relaciona-se à utilização do conhecimento gerado para desenvolvimento da ciência. As pesquisas que estamos realizado são relevantes, e estão sendo utilizadas e citadas por outros pesquisadores, levando ao avanço da ciência em seus diversos campos? Ou produzimos artigos científicos apenas para satisfazer interesses próprios, melhorar os indicadores da instituição e atender à burocracia estatal de controle da educação?
A terceira dimensão refere-se à disseminação científica, envolvendo os processos de difusão do conhecimento além da academia. Divulgamos os resultados de pesquisas para os atores sociais interessados, “traduzindo” as descobertas mais relevantes por meio da mídia geral ou especializada? Ou esperamos que nos procurem e decifrem nossos livros e artigos?
A quarta dimensão relaciona-se à geração de inovações, orientadas para o mercado. Geramos patentes e contribuímos para o crescimento econômico? Ou as pesquisas raramente têm aplicação e pouco contribuem para a inovação empresarial?
A quinta dimensão refere-se à influência sobre diretrizes e políticas públicas. Realizamos estudos que avaliam as políticas públicas e contribuem para o seu aperfeiçoamento? Ou apenas produzimos fragmentos críticos inconsequentes, cheios de opiniões e pobres em consistência?
Na última década, muitas instituições de ensino e pesquisa orientaram-se para o chamado “produtivismo” acadêmico, para aumentar o número de artigos publicados. Na luta para polir os indicadores, sofreu a qualidade, perderam a alma.
Estabelecer, ou recuperar, o norte do impacto social pode ser boa medida para construir uma utopia menos instrumental e mais saudável.
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