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terça-feira, 3 de junho de 2014

“Quando uma mulher erra, a culpa ainda recai sobre o gênero”, diz executiva da PepsiCo

por Amauri Arrais

Após abandonar o balé e se tornar a primeira mulher a assumir o posto mais alto da multinacional no país, Andrea Alvares conta como conseguiu conciliar carreira, família e superar dilemas femininos no mundo corporativo

A EXECUTIVA ANDREA ALVARES, QUE TROCOU A CARREIRA DE BAILARINA PELO MUNDO CORPORATIVO APÓS UM ACIDENTE (Foto: Divulgação)
A EXECUTIVA ANDREA ALVARES, QUE TROCOU A CARREIRA
 DE BAILARINA PELO MUNDO CORPORATIVO APÓS UM ACIDENTE
(FOTO: DIVULGAÇÃO)
Um acidente foi crucial na carreira de Andrea Alvares, primeira mulher a comandar uma divisão da PepsiCo Brasil e apontada entre as dez melhores executivas do país. Aos 17 anos, quando estava prestes a fazer um teste de admissão na Royal Academy, em Londres, ela machucou seriamente o pé. “Treinava 8, 9 horas por dia. Tive uma tendinite no tendão de aquiles uma semana antes do exame”, lembra a administradora, hoje com 41 anos. Com 13 anos de balé clássico no currículo, restou a ela ir para casa e repensar os próximos passos. Como não tinha a menor ideia de que curso prestar no vestibular, resolveu escolher um que fosse amplo o suficiente para ter mais opções na carreira. Escolheu administração de empresas na Fundação Getúlio Vargas (FGV), deixou a casa dos pais em Goiânia e mudou-se para São Paulo.

Na faculdade, sentiu uma atração diferente da que sentia pelos palcos. “Achei o ambiente estimulante, gostava muito do que eu estava aprendendo”, conta. Não que o balé estivesse totalmente esquecido. Sempre que assistia a um espetáculo, Andrea lembra que caía no choro na plateia. Resolveu calçar novamente as sapatilhas e se matriculou em uma escola, mas ao começar a trabalhar, no segundo ano, ficou impossível conciliar as duas atividades. “Queria matar minha vontade de dançar, mas começou a ficar incompatível com o trabalho e tive que deixar. Depois fiz as pazes com a decisão que tomei.”
A decisão entre a vida profissional e o antigo sonho foi só a primeira de muitas que surgiriam na carreira desta goiana de fala serena, sempre pontuada por risadas. Em 2000 entrou como diretora de marketing na PepsiCo. Neste meio tempo, casou e teve o primeiro de três filhos. Até chegar ao comando da divisão de bebidas da empresa, cargo mais alto à época, recusou alguns convites para morar fora. “Eu e meu ex-marido tivemos que acordar alguns sacrifícios dos dois lados. Do lado profissional, acho que nem eu nem ele abrimos mão de nada. Nas vezes em que eu declinei de convites, por exemplo, de expatriações, eu fiz porque o momento não era adequado pro contexto familiar que eu tinha”, lembra a executiva, hoje separada.
Sentava numa reunião e pensava: 'Será que vou conseguir fazer sinapses na velocidade de antes?"
A oportunidade veio em 2006, com o convite para se tornar a principal executiva de marketing de bebidas para a Argentina, o Uruguai e o Paraguai. Empresário, o ex-marido ficou em São Paulo e viajava todos os finais de semana a Buenos Aires para ficar com a família. A participação dele na divisão de tarefas da casa, lembra Andrea, foi fundamental, além do seu próprio amadurecimento profissional. “Meu ex-marido sempre foi incrível, um super parceiro na criação das crianças. Aonde ele não participava, descobri mais tarde, era porque eu não deixava. Trabalhar me ajudou a dividir, delegar, distribuir tarefas. Antes achava que tinha um jeito de fazer que era o meu e percebi que não é porque não era o meu que não era bom”, pondera.
Não que as escolhas da executiva tenham sido livres de dilemas comuns de qualquer mãe. Andrea conta com bom humor que, ao retornar da licença maternidade da primeira filha, ainda na Argentina, tinha dúvida se conseguiria racionar como antes. “Sentava numa reunião e pensava: 'Será que vou conseguir fazer sinapses na velocidade de antes?' Achava que tudo tinha ido embora com o leite...”, lembra, rindo.  Não só conseguiu, como alcançou resultados melhores –que ela credita, entre outras coisas, à maternidade. “Ser mãe me tornou mais paciente, me ensinou a ter mais empatia, a ser menos controladora, a aprender que certas coisas têm seu tempo. Coisas importantes que apliquei no trabalho inclusive”, conclui, não sem fazer questão de frisar que a experiência pessoal não se aplica a todas as mulheres.
A EXECUTIVA ANDREA ALVARES: "SER MÃE ME TORNOU MAIS PACIENTE, ME ENSINOU A TER MAIS EMPATIA, A SER MENOS CONTROLADORA" (Foto: Divulgação)
A EXECUTIVA ANDREA ALVARES: "SER MÃE ME TORNOU MAIS PACIENTE,
 ME ENSINOU A TER MAIS EMPATIA, A SER MENOS CONTROLADORA"
(FOTO: DIVULGAÇÃO)
Quando a mulher erra nas primeiras posições, a gente ainda culpa o gênero. Ainda tem uma percepção de que mulheres são ruins ou incompetentes e não aquela pessoa que falhou naquele contexto."
TIME SELETO


Andrea Alvares é hoje parte de um time crescente, mas ainda seleto, de executivas no comando de grandes empresas no Brasil. Recentemente, assumiu a unidade de negócios de snacks da PepsiCo (que inclui marcas como Ruffles e Doritos), maior negócio da companhia no Brasil. Com cerca de 90% do contingente de 13 mil funcionários no país, a área é responsável pela maior fatia do faturamento de R$ 3,8 bilhões. Embora na multinacional o cenário já fosse mais diverso desde que comandou a divisão de bebidas, ela afirma que só percebeu que era um caso raro nas estatísticas quando começou a participar de fóruns empresariais de CEOs.

“Nesses ambientes, você vê menos mulheres na paisagem. Somos bem poucas. Eu sentia que, nos primeiros encontros, havia uma expectativa de ouvir o que você ia falar e, provavelmente, com bastante julgamento latente”, diz. “Como você tem uma distribuição estatística mais abrangente de homens, eles podem errar. Quando a mulher erra, a culpa ainda recai sobre o gênero. A responsabilidade é maior.”


Sob sua gestão, a executiva disse ter dado continuidade à política da empresa de buscar a equivalência de gênero em cargos e salários –inclusive em áreas tradicionalmente masculinas. “Sempre penso [em contratar] mulheres quando tem pouca participação feminina. Não é buscar mulheres a qualquer preço, mas assegurar o mesmo número de candidatos e o melhor. A diversidade é rica.” Para Andrea, antigos paradigmas de comportamento de que mulheres mais firmes são vistas como “estressadas” ou “histéricas” vem mudando no mundo corporativo. “Acho que quando se erra a mão, sendo homem ou mulher, não é bem visto. As pessoas tendem a falar menos dos homens, mas acham equivocado igual”.


BATE-E-VOLTA EM NOVA YORK

Também a figura da executiva que não tem vida social ou tempo para dedicar à família vem sendo superada, na opinião de Andrea. Para resolver esses desafios, ela coloca reuniões, eventos corporativos e dos filhos na mesma agenda para evitar conflitos. A rotina inclui de 8 a 9 horas de trabalho por dia, exercícios com uma personal trainer duas vezes por semana, inúmeras viagens a trabalho, jantares com os amigos e finais de semana com os filhos, hoje com 14, 10 e 7 anos.

Como boa administradora de conflitos, a executiva garante que nunca faltou a nenhum compromisso importante dos filhos, seja festa junina, reunião de pais, apresentações musicais. Para tanto, alguma vezes teve que “rebolar” para dar conta da agenda. Ela conta que já teve de ir a uma reunião em Nova York às 7h da manhã e retornar às 20h do mesmo dia para assistir à apresentação de final de ano do filho. “As coisas conspiram a favor quando você está bem intencionado. Faz parte de ter três filhos e uma posição executiva. Não posso simplesmente dizer não vou aparecer em lugar nenhum. Você tem que se planejar mais”, ensina.

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