Sobre a arte de nunca fechar conversas (ou como transformar qualquer contato em uma relação).
Publicado em 01/10/2013
POR
Gustavo Gitti
Edição 136
Eu terminava e-mails com um "Abração!" e frequentemente com a sensação de que nunca mais falaria com aquela pessoa. Parecia normal me relacionar apenas com o que os outros eram para mim: leitores, clientes, colegas de trabalho, amigos da dança de salão, seguranças, estranhos. Se a relação é utilitária, se não acessa o ser livre que calhou de estar por ali, se não transcende os limites de uma empresa, por exemplo, tudo acaba quando a pessoa muda de emprego. Resultado: fui perdendo muita gente pelo caminho.
Quando deixamos de participar das vidas que uma vez tocamos, nosso mundo se estreita. Além das pessoas próximas, a grande maioria de nossos pequenos encontros diários (presenciais e online), ainda que polida, é pontual: ao nos despedirmos, matamos sutilmente o outro. Não o visualizamos, no próximo minuto, continuando sua vida, como parte da nossa. Sem querer, fechamos a janela e dificilmente ela abrirá novamente. Pense em quantas vezes já fizemos isso.
Uma grande amiga tinha o costume de deixar um "Seguimos!" ao fim de seus e-mails. E também a cada abraço de despedida. Por trás dessa expressão, havia uma paciência, uma sabedoria que enxerga qualquer situação como algo trabalhável, incessantemente aberto. De fato, se nos dispomos a acompanhar mais pessoas, logo percebemos que a vida nunca dá certo ou errado, nunca se restringe a um projeto ou a um casamento, a vida sempre segue. Então, um bom jeito de se relacionar com os outros é seguir junto, cruzando pelas várias experiências. Desse modo, muitas vezes apenas um primeiro e breve contato (um café, um e-mail) acaba criando uma relação satisfatória, uma confiança de que o outro torce pela nossa felicidade e, igualmente, poderia pedir nossa ajuda a qualquer momento.
Experimente terminar seus últimos e-mails com "Seguimos!" e veja como isso o lembra de incluir aquela pessoa, como se eventualmente vocês pudessem de fato andar juntas. Temos uma capacidade infinita, sempre expansível, de manter mais e mais vidas em nosso fluxo mental.
No documentário Happy (2011), de Roko Belic, as mulheres de Okinawa, no Japão (cidade famosa pela longevidade e pelo espírito comunitário), ensinam o significado da expressão "Ichariba chode": quando você encontra alguém mesmo que apenas uma vez, mesmo que por acaso, vocês se tornam parceiros para a vida inteira. Portanto, se calhou de nos esbarrarmos pela vida simples, pronto, somos irmãos e irmãs. Seguimos!
Gustavo Gitti é professor de TaKeTiNa e trabalha em espaços de transformação
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