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domingo, 13 de julho de 2014

Quem contará os estupros na Copa do Mundo?

16 jun, 2014

Por Jarid Arraes,

No último dia 14, diversos portais noticiaram um caso de estupro envolvendo um chileno e uma brasileira. O chileno de 32 anos conheceu uma brasileira de 22 em uma boate em Cuiabá, onde ofereceu carona ao sair da festa acreditando que o sexo estava garantido. No entanto, a moça rejeitou as investidas do homem e resistiu fisicamente para impedir o ato. Ainda dentro do carro, a jovem teve sua roupa rasgada e foi agredida fisicamente, e só foi socorrida porque alguns passantes ouviram seus gritos e surpreenderam o chileno sem roupas.

Houve, no entanto, uma verdadeira confusão a respeito da informação divulgada. Em alguns sites há a afirmação de que houve penetração; em outros, o caso parece algo vago e sem gravidade alguma. Em algumas publicações, há até mesmo o uso repetido de eufemismos, afirmando que o chileno somente “manifestou vontade de fazer sexo”. De acordo com esse último noticiante, dá até para pensar que o homem pediu com educação e vocabulário rebuscado. No fim das contas, ninguém sabe em quem confiar e nem entende qual é a informação correta. A brasileira foi estuprada? Como isso aconteceu? E o exame de corpo de delito? O desfecho, não obstante, é direto ao ponto: o chileno foi liberado.

Há uma série de problemas nesse caso: o óbvio despreparo dos jornalistas brasileiros – que tratam a ocorrência com tanto descaso que se contradizem em notas feitas em poucas horas de distância -, os eufemismos e as insinuações de que a brasileira bebeu demais ou se “acovardou” por ter “desistido” do sexo são apenas alguns deles. Em uma matéria, inclusive, é dito que a moça resolveu não prestar queixa porque o chileno estava bêbado. A não ser que isso seja um fato devidamente apurado, a redação do jornal merece um escracho. E se for algo verídico, é motivo de lamentação. De uma forma ou de outra, fica evidente a falta de compromisso dos jornalistas para escrever algo responsável, que conte um fato coerente com a realidade.

Infelizmente, isso não é nenhuma surpresa para o movimento feminista: sabemos que estupros e tentativas de estupro são expostos sem qualquer cuidado ético. Cultura misógina é assim e o álcool vira justificativa para a violência sexual. Se a mulher bebeu, ela é uma irresponsável que não se cuidou, mas se o homem bebeu, ele não sabia o que estava fazendo e por isso o crime pode ser tratado com leviandade. Pouco se discute o fato de que os homens são socialmente ensinados e recompensados por beberem com o objetivo de “pegar” mulheres – sendo isso, inclusive, algo exaustivamente sugerido pelas propagandas de cerveja. Dessa forma, um homem que bebe e se torna um inconveniente que insiste, agarra o braço da mulher e fala coisas vulgares não é nada além do considerado normal por nossa cultura. E, pelo visto, não é exclusividade de brasileiros.

Ao contrário do que é constantemente sugerido, as mulheres podem sim desistir de fazer sexo e devem ter o desejo respeitado prontamente. A ideia de “ou dá ou desce” é coação e “conseguir” sexo através de uma ameaça como essa não se chama de conquista, mas sim de estupro. E o que torna o problema ainda maior é que a maioria das mulheres está amedrontada, desinformada, constrangida e alienada demais para denunciar quando esse tipo de crime acontece. Os casos que envolvem violência sexual dificilmente são registrados e isso não será diferente durante a Copa. Dá até pra imaginar quantos turistas de outros países e homens do nosso país não estão neste exato momento forçando avanços sexuais contra mulheres brasileiras e outras estrangeiras; quantas crianças estão sendo estupradas agora, vítimas de uma realidade de exploração sexual que muitos portais de notícia chamam desavergonhadamente de “prostituição infantil”. Caso fossem contados, os números seriam assustadores.

A triste realidade é que a população depende dos jornais brasileiros para ter acesso a informações verídicas e bem apuradas, mas os portais não estão entregando notícias com esse padrão de qualidade. Jornais do Brasil: exponham a realidade de violência sexual que a Copa do Mundo proporciona. Durante um evento tão impactante, onde tantos olhos estão voltados para o nosso país, há outras coisas mais importantes além de contar gols.

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