Governo indiano é acusado de elevar a medicina alternativa ao mesmo patamar da tradicional com nova proposta para as leis de aborto
3 de agosto, 2015
Nos Estados Unidos, o governo tenta restringir o número de abortos impondo severas restrições ao procedimento, sob o pretexto de proteger a saúde da mulher. Essa abordagem é criticada pela Associação Americana de Medicina e por ativistas de direitos da mulher, que afirmam que dificultar o acesso ao procedimento eleva o número de abortos clandestinos e dos problemas de saúde gerados por eles.
Na Índia, porém, o problema é exatamente o inverso. O governo indiano tenta afrouxar as regras para o acesso ao aborto para que mulheres de baixa renda possam realizar o procedimento, enquanto a comunidade médica local é contra a medida.
O aborto na Índia é permitido sob condições bastante liberais, como em casos de falha do método contraceptivo. Mas o assunto ainda é um tabu para a sociedade conservadora e religiosa do país. Na maioria das vezes, as mulheres têm de lidar com gravidez indesejada em segredo, um problema agravado pela escassez de contraceptivos e uma cultura de subjugação de gênero.
A falta de atendimento médico em áreas rurais e nas favelas urbanas obriga mulheres a dar fim à gravidez por conta própria ou a buscar ajuda de charlatões e parteiras inexperientes.
Segundo o Ipas, organização internacional dedicada aos direitos reprodutivos da mulher, cerca de 5 milhões de abortos foram realizados na Índia em 2013, sendo mais da metade feitos de forma inadequada. Em média, uma indiana morre a cada duas horas por conta de abortos mal feitos e milhares que sobrevivem a eles ficam com sequelas temporárias ou permanentes.
Em outubro do ano passado, o governo indiano propôs uma emenda à Constituição do país que, entre outras coisas, autorizava que o aborto fosse feito por enfermeiras treinadas e profissionais de saúde tradicional e alternativa, como a Ayush, medicina indiana milenar.
Estudos de viabilidade mostraram que tais profissionais são aptos a fazer o procedimento nos primeiros três meses da gestação de forma tão eficaz quanto os médicos.
Embora a proposta tenha sido elogiada por grupos de defesa da mulher, ela foi duramente rechaçada pela Associação de Medicina Indiana, que iniciou uma forte campanha de oposição à medida.
O motivo alegado para a oposição é tão incoerente quanto as afirmações americanas. Segundo a comunidade médica indiana, afrouxar as regras pode aumentar o número de abortos e problemas de saúde causados por ele. A pressão para ter um bebê do sexo masculino também elevaria o número de procedimentos, já que estariam mais disponíveis.
Mas a verdadeira raiz da tensão é o fato de o governo indiano elevar a medicina alternativa ao mesmo patamar da tradicional, porém mais barata. Essa tendência ficou clara no ano passado, quando o departamento da Ayush foi elevado ao nível de ministério. Uma das metas do governo indiano, que tem o respaldo da Organização Mundial de Saúde (OMS), é integrar as duas medicinas.
Infelizmente a emenda sobre a questão do aborto, com seu grande potencial de salvar vidas, ficou retida na guerra entre as medicinas tradicional e alternativa do país.
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