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quinta-feira, 30 de novembro de 2017

Suzana Pires | Venha conhecer o que te limita: seu #DNAHistórico

Na coluna #DonaDeSi dessa semana, Suzi Pires fala da cruz que todas as mulheres tem que carregar apenas por serem do sexo feminino

29.11.2017 | POR SUZI PIRES

Sim, hoje acordei toda “sujeito pensante” e consegui (tomara!) organizar nesta coluna o que quero dizer quando falo sobre #DNAHISTORICO. Achei importante tentar pensar este termo junto com vocês para que ele não seja somente uma reflexão minha com meus botões-de-madrepérola, mas uma reflexão coletiva, nossa, com nosso chopp e drink em punho!

Bora lá, então! Começando pela biologia e entendendo que DNA é um composto orgânico cujas moléculas contém as instruções genéticas que coordenam o desenvolvimento e o funcionamento de todos os seres vivos e que transmitem a hereditariedade de cada ser vivente. Hereditariedade é a condição de semelhança existente entre ascendentes e descendentes. Ou seja: cada uma de nós herdou uma série de características (desde estéticas a doenças possíveis) resultante do cruzamento dos nossos pais, sem, no entanto, heranças comportamentais. E é aqui que entro com o processo histórico, que é o conjunto de acontecimentos cujo encadeamento permite compreender a situação atual de um sujeito agente e sua projeção no futuro. Portanto, o que chamo de #DNAHistóricoFeminino é o conjunto de atitudes, crenças e comportamentos que herdamos das nossas mães e também de toda a sociedade ao nosso redor, forjando assim a nossa maneira de agir no mundo.


E como agimos no mundo? Hoje podemos pensar e agir, livremente. Ops. Livremente? Será? É aqui que entra o problema. A nossa conversa com nós mesmas sobre o que conquistamos e o que ainda desejamos conquistar precisa ser mais profunda e pensada para além dos muros do nosso #DNAHistórico.

O que são esses muros? Diversas crenças limitadoras como: uma mulher só encontra satisfação plena se for mãe e casada, jamais na sua profissão; uma mulher deve ganhar menos que homens na mesma posição que ela ocupa pois ela tem licença maternidade e sai mais cedo para pegar filho na escola com febre; uma mulher não pode ser boa líder porque é muito emocional; uma mulher não sabe administrar pressão; nós devemos nos masculinizar para conseguir se ouvida numa reunião; nós não devemos mostrar demais nosso corpo em ambiente de trabalho para não desconcentrar o coleguinha; nós somos, realmente, menos inteligentes, menos fortes fisicamente e empregar uma mulher é um risco. Tudo isso é o que precisamos colocar sempre em XEQUE! Xeque mesmo.

Parar e se perguntar: por que é assim?

Pensamento e ação. Não é o mundo que vai nos dar reconhecimento nem novos lugares, somos nós que devemos agarrá-los! Se para um homem, uma oportunidade profissional é um touro xucro que passa selado para que seja montado, para uma mulher, uma oportunidade é touro xucro sem sela que cabe a nós montar e domar.

Sim, DOMAR é um verbo bom para lidar com o mundo. Difícil, né? Mas, para quem? Para nós, em primeiro lugar. Movimentar moléculas, ainda que históricas, não é tarefa fácil. Há de se ter um movimento constante em direção a um objetivo, autogestão, autocontrole, autodescontrole e aquela dose de loucura que só uma mulher sabe ter. E uma das moléculas mais difíceis para nós mesmas lidarmos é a molécula do PODER!

Sim, caras amigas, numa época onde só se fala em emPODERamento feminino, eu tenho a cara de pau de vir aqui e dizer que é justamente PODER o nosso mais desafio comportamental. O que compõe o nosso DNA histórico como crença e ação? Não termos equiparação salarial; não termos direito a aborto; temos que estar perfeitas para gostarem de nós; temos que agradar; é necessário um homem mais velho, um mestre, para nos balizar; nosso consumo se transformou em compulsão por ser linda, fashion e original; continuarmos a viver num sistema que oprime mulheres, aceitar a tripla jornada de profissional, mãe e esposa; acreditar que feminismo é coisa de mulher chata; competir com as outras mulheres; roubar o marido da outra; se recusar a causar incômodos; achar que ser assediada é sinônimo de ser desejada; acreditar que é feio uma mulher sair para jantar sozinha; morar sozinha; escolher não ter um par constante; julgar as outras mulheres que não se comportam como você em vez de entendê-las e acolhê-las; não gritar e agir para mudar a estatística de que a cada 11 minutos uma de nós é estuprada no país... Acreditando, assim, que o espaço publico não nos pertence, que temos mais é que ficar em casa.

Pausa para você me xingar, pegar um ar e continuar comigo, amiga!

EmPODERar é quando alguém dá o poder a alguém e TER PODER é a capacidade de deliberar, agir e mandar, exercendo autoridade e soberania.

Sim, amiga, ganhar seu próprio dinheiro significa ter poder.

Numa sociedade capitalista é isso o que significa. E nós não temos, pelo nosso #DNAHistórico, a ação de conquistar algo ou de construir e escolher o que fazer com nossas próprias vidas. Nossa “terra a ser conquistada” eram as salas onde exercitávamos um poder privado, tecendo manipulações, seduções e toalhas. Nossa construção se resumia a fabricação dos utensílios de cozinha, para armazenar a caça trazida pelo macho e não escolhíamos nosso próprio caminho.

Não estou falando do poder de escolher em que rua virar, que comida comer, que roupa comprar, de adquirir, de escolher uma profissão, um caminho, uma conduta.

Estou falando do poder de se arriscar a pegar a vida nas nossas mãos.

Pra quem passou a infância andando de balanço e não sendo instigada a se jogar do muro, o poder de se arriscar é pesado. Mas, sem esse domínio, não sairemos do lugar de panfletárias, defendendo lugares na sociedade, sempre reclamando do nosso lugar. Para se ter um lugar, há de se ter a disponibilidade em se estrepar, de cair, quebrar a cara, não ser perfeita e então se levantar e renascer ainda melhor! É do poder de construir uma vida que estou falando. Essa é a atual questão feminina. É esse o poder que, como PROTAGONISTAS da nossa própria história devemos desenvolver, cada uma vencendo seus desafios, construindo suas vidas, desconstruindo, reconstruindo ou destruindo.

Acho que nosso #DNAHistórico em relação ao PODER traz nossas entranhas pós-feministas, tudo o que a maquiagem, exuberância e emPODERamento social esconde. Nossos medos em não sermos perfeitas em qualquer tarefa a executar, da decadência do corpo, do envelhecimento, da falta de homem, de não darmos conta do lugar que ocupamos, de não sermos casadas, magras, lindas, mães, bem-sucedidas e a miss-simpatia de onde estivermos! (algo bem difícil para seres que carregam infinitos hormônios em si.) A questão hoje é nos libertarmos da preocupação em darmos satisfações sociais e deixarmos que esse “dever social” impeça a realização dos nossos projetos de vida. Se alguns anos atrás era feio uma mulher trabalhar, hoje é feio ela não trabalhar - e se ela trabalhar e não for casada e tiver sucesso é considerada uma mulher solitária e triste. Se ela for mãe e trabalhar muito, ela é relapsa com os filhos. Se ela for casada, mãe e profissional e se deixar engordar, ela será considerada um grande fracasso, afinal de contas não se cuidou. Se ela for descasada aos 60, de bem com a vida e se apaixonar por um homem mais jovem, ela é uma velha periguete que não sabe seu lugar. Se ela usar aplicativo de paquera, ela é uma desesperada... E por aí vai... O feminismo nos deu terreno, mas é o metro quadrado mais caro a se pagar!

Mas, não podemos deixar que nossas asas parem de bater se quebrando nas paredes que cada uma de nós herdou.

Que a gente siga nossa caminhada sempre questionando nosso #DNAHistórico e propondo uma transformação na crença do PODER do dinheiro, atribuindo PROPÓSITO à essa conquista. Afinal, de que vai te adiantar seu contracheque sem que você esteja entusiasmada pelo seu trabalho? Não, nós não vamos contribuir para uma sociedade doente, começando a tratar da nossa “saúde profissional” desde já.

Essa sim, nossa verdadeira independência.

Sororidade Sempre.

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