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quinta-feira, 21 de março de 2019

Cineasta argelina defende que não existe democracia sem direitos das mulheres

ONU
12/03/2019
Em visita ao Rio de Janeiro para a estreia nacional de seu primeira longa-metragem ‘Os Afortunados’, a cineasta argelina Sofia Djama acredita que a luta pelos direitos das mulheres é uma pauta universal, independentemente do país ou da religião em que se vive. Para a diretora, não existe democracia sem direitos para a população do gênero feminino e sem respeito pelas minorias.
O filme ‘Os Afortunados’ é parte da programação da Mostra de Cinema Árabe Feminino, em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), na capital fluminense, até 25 de março. Festival reúne 37 produções de mais de dez países árabes. A entrada é franca.
Sofia Djama, cineasta argelina. Foto: Festival do Filme Histórico de Pessac de 2017
Sofia Djama, cineasta argelina. Foto: Festival do Filme Histórico de Pessac de 2017
Em visita ao Rio de Janeiro para a estreia nacional de seu primeira longa-metragem Os Afortunados, a cineasta argelina Sofia Djama acredita que a luta pelos direitos das mulheres é uma pauta universal, independentemente do país ou da religião em que se vive. Para a diretora, não existe democracia sem direitos para a população do gênero feminino e sem respeito pelas minorias.
“A condição pela qual uma sociedade pode pleitear a sua democracia é responder a todos. E a mulher faz parte integral da sociedade. Ela trabalha, ela é ativa, ela cria a sociedade do amanhã. Uma democracia precisa de todos esses atores: mulheres, homens, homossexuais”, disse a realizadora em entrevista ao Centro de Informação da ONU para o Brasil (UNIC Rio).
“Se a gente tolhe uma parte da sociedade da sua liberdade, não se pode falar em democracia.”
Sofia veio à capital fluminense para a Mostra de Cinema Árabe Feminino, que traz 37 produções audiovisuais de mais de dez países para o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) do Rio. Entres os filmes, estão oito longas-metragens inéditos em território brasileiro. O festival lança luz sobre obras dirigidas por cineastas mulheres de nações como Arábia Saudita, Líbia, Palestina, Marrocos e Argélia, entre outras. A mostra segue em cartaz até 25 de março, com entrada franca.
Na visão da diretora argelina, a iniciativa permite exibir a universalidade desse cinema e mostrar que existem lutas comuns, como o combate ao conservadorismo e à intolerância que, segundo Sofia, atacam a liberdade das pessoas na sua intimidade. Para a realizadora, o cinema também pode criar laços sociais e aproximar as pessoas — seu filme, por exemplo, utilizou atores profissionais e não atores que viviam em regiões pobres da Argélia, pessoas que não se conheceriam sem a produção da obra.
Em 2015, a diretora liderou uma mobilização virtual contra a proibição imposta a uma estudante de Direito na Argélia, que foi impedida de fazer uma prova porque sua saia foi considerada curta demais. A cineasta criou a página Minha dignidade não está no comprimento da minha saia, convidando mulheres a mandar fotos de suas pernas à mostra.
“A aquisição da independência das mulheres está altamente ligada à sua condição econômica, ao trabalho, ao acesso a trabalho”, afirma a diretora.
Em 2018, o Banco Mundial estimava que as mulheres na Argélia representavam apenas 15,3% da população economicamente ativa do país. “Elas ganhando uma independência econômica, seus filhos vão ganhar uma independência moral”, completa Sofia.

Traumas da história argelina

Premiado na Mostra de Veneza de 2017, Os Afortunados aborda as consequências de um turbulento período na história recente da Argélia.
Em 1988, manifestações da juventude contra a alta dos preços e a escassez de bens de consumo essenciais foram duramente reprimidas pelos militares. A agitação popular levaria ao fim do sistema de partido único, por meio de um referendo no mesmo ano. Em 1990, eleições testemunharam a popularidade de um novo partido, a Frente Islâmica de Salvação. Mas militares e forças de segurança impediriam que políticos eleitos assumissem, instituindo um novo governo e perseguindo lideranças e ativistas islâmicos.
A professora universitária Amal (à esquerda) conversa com Feriel, uma amiga de seu filho Fahim. Foto: Os Afortunados (Sofia Djama, 2017)
A professora universitária Amal (à esquerda) conversa com Feriel, uma amiga de seu filho Fahim. Foto: Os Afortunados (Sofia Djama, 2017)
O acirramento das tensões entre as autoridades e grupos de oposição levou a confrontos armados e disputas dentro do território argelino. Os anos 90 veem uma sucessão de episódios de bombardeios, ataques contra civis e chacinas, sendo o massacre de Bentalha, em 1997, um dos capítulos mais conhecidos desse período. Estima-se que 150 mil pessoas morreram em meio às hostilidades ao longo da década.
“Não há um argelino que não tenha sido tocado pelo que nos aconteceu. Dez anos de guerra civil, isso foi violento. Não há um argelino que não tenha perdido alguém”, afirma Sofia Djama.
Os protagonistas adultos de Os Afortunados — um casal formado pela professora universitária Amal e pelo ginecologista Samir — têm de lidar com a memória das mortes e dos fracassos políticos. Já os jovens do filme buscam uma nova liberdade, que não passa pelas desilusões do passado, mas se expressa em pequenos gestos — desafiar a autoridade da família no caso de Fahim, o filho do casal, tatuar um texto sagrado no corpo, que é o anseio de seu amigo Reda, e andar sozinha à noite, como deseja a personagem Feriel.
“Eu não queria criar super-heróis com os meus personagens. Eu não queria fazer uma super mãe ou um super pai. Os pais fazem o que podem. Com amor e sem jeito. É o que eu tinha vontade de mostrar”, explica a cineasta.
A diretora conta ainda que, ao conceber o filme, queria escapar de clichês de gênero e mostrar também “homens frágeis, arruinados”. O médico Samir, por exemplo, é um desses homens e tem “medo de admitir um fracasso”. “Eu queria mostrar um homem frágil, que é abalado pela situação de um país”, acrescenta Sofia.
A argelina aposta na criação de imagens e de histórias como forma de romper mitos arraigados na sociedade. “A cultura é uma consciência coletiva. É urgente reabilitar a cultura. É ela que nos libera, ela libera os homens e as mulheres”, completa a cineasta.

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