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quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Tutela Penal da Intimidade


Poderia nos conceituar a Tutela Penal da Intimidade?
Resolvi escrever sobre o tema quando percebi que dificilmente poderia estar sozinho sem ser observado por olhos estranhos. Constatei que para algumas condutas violadoras da intimidade não existe norma penal que as puna. Não há tutela penal específica e genérica para a intimidade e a vida privada. Os operadores do Direito podem empregar dispositivos previstos na legislação penal, mas não de forma direta e específica. Mesmo com inúmeros casos de violação da intimidade perpetrados em diversos setores da sociedade, ainda não existe previsão legal para o crime de violação da intimidade ou privacidade. Como exemplo, temos a clássica e comum situação da divulgação na internet de cenas íntimas de pessoas notórias, como os artistas. É possível, nesse caso, pleitear indenização por dano moral, mas a conduta não é típica penalmente. A tutela penal da intimidade nada mais é do que a proteção que esse bem jurídico de vital importância recebe do direito penal.

Quais são os princípios constitucionais atinentes ao tema?
Os princípios são normas dotadas de alto grau de generalidade que servem de base para a formação do ordenamento jurídico. A partir dos princípios a legislação deve ser criada e interpretada. Eles podem ser empregados para orientar a interpretação das leis de teor obscuro ou para suprir-lhe o silêncio. Não há como estudar a tutela penal de qualquer bem jurídico sem analisar os princípios constitucionais penais que a fundamenta.

Quais são as limitações aos Direitos à Intimidade e à Vida Privada?
Por mais importante que seja nenhum direito constitucional é absoluto. E isso também ocorre com a intimidade e a vida privada. Sem esses direitos, a personalidade das pessoas correrá risco. Entretanto, outros direitos também são protegidos pelo ordenamento jurídico. Por isso, é comum o embate entre direitos constitucionais e um deles deverá prevalecer. De tal modo, há limites para a proteção da intimidade e da vida privada, que muitas vezes devem ceder quando colidirem com outros direitos tão ou mais importantes. É a aplicação do princípio da proporcionalidade em que direitos constitucionais são sopesados para saber qual deles preponderará em determinado caso concreto.

Que corpo ganha o tema com os meios tecnológicos hoje presentes?
Em razão do avanço dos meios tecnológicos, a intimidade e a vida privada estão em constante perigo. Dificilmente alguém sai de casa sem estar portando um aparelho de telefone celular ou um smartphone. Com esses instrumentos tecnológicos não raras vezes são captadas e veiculadas imagens de pessoas, que podem violar a intimidade.

Como o senhor vê a questão das filmagens íntimas?
Nem mesmo dentro de nossas residências, que é o que temos de mais íntimo, estamos a salvo de intromissões indevidas. Há quem se deleite em observar a vida alheia por meio de potentes lunetas e binóculos. E o pior é que cenas de nossa vida cotidiana, mesmo as mais íntimas, podem ser captadas e divulgadas para que milhares ou mesmo milhões de pessoas tenham conhecimento. Diante do dano causado, pode ser pleiteada indenização no âmbito civil, mas, na seara penal, o fato é atípico. Isso é um grande perigo.

De que  forma questão é tratada no caso de pessoas famosas?
As pessoas famosas, ou notórias, são as que mais sofrem com as constantes invasões de sua intimidade. Quando abraçam sua função ou profissão já sabem de antemão que parcela da sua vida virá a público. Elas acabam abrindo mão de parte de sua vida íntima em prol do interesse à informação. Mas mesmo essas pessoas possuem uma parcela mais reservada de sua vida que merece proteção do direito.

Como o preso tem sua intimidade resguardada?
A pessoa que cumpre pena privativa de liberdade perde ou tem restringida parte de seus direitos constitucionais, dentre eles a intimidade. Não há como o detento querer exercer todos os direitos próprios do homem livre. Sua condição pessoal deve ser analisada à luz da sua situação e dos demais sentenciados, sempre tendo em vista a segurança pública e a preservação da ordem e da disciplina do estabelecimento prisional. Permanece incólume, pelo menos em uma oportunidade, a proteção de sua intimidade. Isso ocorre por ocasião da entrevista com seu advogado. Também é possível pensarmos na proteção da intimidade do preso por ocasião da chamada “visita íntima”.

O que vem a ser o direito ao segredo à desonra?
 Mesmos os desonrados merecem proteção do direito para que sua intimidade não seja violada. Os fatos verdadeiros poderão muitas vezes não ferir a honra, mas podem ter reflexo na intimidade. Por isso, no resguardo da intimidade só deveriam ser noticiados pela imprensa os fatos que contivessem interesse público. Acontecimentos sem nenhuma consequência para a coletividade, a não ser para saciar a mórbida curiosidade de alguns, não deveriam ser veiculados. No sopesamento entre o direito à intimidade e o direito à informação, não advindo da revelação de um fato qualquer benesse para a coletividade, prevalece o primeiro.

O sigilo também é tutelado?
O sigilo visa preservar do conhecimento público fatos secretos ou reservados que, se revelados, têm o potencial de causar dano a alguém. O sigilo pode ser considerado como o instrumento empregado para a proteção do segredo. Tanto o sigilo quanto o segredo podem ser utilizados para a proteção de fatos que interessem ao particular, pessoa física ou jurídica, ou ao Estado. O sigilo e o segredo, de forma genérica, encontram seu fundamento no direito à intimidade (art. 5º, X, da CF).  Vários outros dispositivos contidos no art. 5º da Constituição Federal também protegem o sigilo. O inc. XI trata da inviolabilidade da casa; o inc. XII tutela o sigilo das comunicações; o inc. XIV consagra o sigilo da fonte e o inc. LVI proíbe o emprego das provas obtidas por meios ilícitos, que são consideradas inadmissíveis. O sigilo e o segredo visam a dar efetividade ao mandamento constitucional que determina a inviolabilidade da vida privada e da intimidade.

Como a jurisprudência trata do tema?
Há inúmeras decisões judiciais a respeito da tutela da intimidade e da vida privada. Nossos Tribunais constantemente julgam casos envolvendo colisão entre o direito à intimidade e outros direitos, como o de produção de provas e de liberdade de imprensa. Esse assunto ainda é muito controvertido em praticamente todo o mundo. A discussão é quase sempre a mesma: Qual o limite da proteção da intimidade? É o que tentamos solucionar no livro.

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