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domingo, 14 de agosto de 2016

Mulheres paquistanesas tiram lições de sustentabilidade da seca

Karachi, Paquistão, 24/3/2015 – Quando foi perguntado a um grupo de mulheres da remota aldeia de Sadhuraks, no deserto de Thar, no Paquistão, se em uma próxima vida voltariam a ser mulheres, todas responderam com um sonoro não. “O trabalho de uma mulher nunca acaba”, disse uma delas ao explicar a desigualdade entre homens e mulheres no deserto localizado a 800 quilômetros desta cidade portuária, fronteira natural entre Índia e Paquistão.
A desigualdade se sente especialmente em Tharparkar, um dos 23 distritos da província de Sindh, listado pelo Programa Mundial de Alimentos (PMA) como a zona mais insegura do país. Cerca de 500 meninas e meninos morreram em 2014, terceiro ano seguido de seca na região. A má nutrição e a fome se generalizaram e milhares de famílias não conseguem encontrar água.
Em seu estudo Estado da Segurança Alimentar, de 2013, o Instituto de Políticas de Desenvolvimento Sustentável aponta Tharparkar como a zona com o maior déficit calórico, devido a uma crise alimentar qualificada de “crônica” e causada pela mudança climática. Entre o 1,5 milhão de pessoas distribuídas em 2.300 aldeias e povoados em uma área de 22 mil quilômetros quadrados, as mulheres sofrem a pior parte de um recorrente e gradual desastre.
Tanveer Arif, diretora da Sociedade para a Conservação e a Proteção Ambiental (Scope), disse à IPS que as mulheres devem cuidar das crianças, mas também são obrigadas a trabalhar para cobrir a ausência dos homens, que emigram para as cidades em busca de melhores oportunidades.
Além disso, devem se ocupar dos animais, de buscar água em fontes distantes quando seus poços secam, cuidar dos idosos e manter a tradicional agricultura de subsistência, um trabalho quase impossível em uma região seca, que segue no caminho de se converter na mais quente e árida do país até 2030, segundo o Departamento de Meteorologia do Paquistão.
As mulheres são conscientes de que precisam aprender a armazenar alimentos, identificar os cultivos resistentes à falta de água e romper o cordão umbilical com a agricultura como único meio de subsistência, o que vários estudos corroboram.
A resposta está no pequeno arbusto espinhoso Balsamodendron mukul (Commiphora wightii), também conhecido como mirra de mukul, que produz uma resina muito utilizada na produção de cosméticos e medicamentos, que no Paquistão é conhecida como “guggal”. Até há pouco tempo esse tipo de arbusto estava em perigo de extinção, o que motivou esforços de conservação para manter viva a espécie e salvá-la da brutal extração – 40 quilos de resina geram entre US$ 196 e US$ 392.
Os esforços redobraram graças às estratégias de adaptação e resiliência das mulheres de Tharparkar. Tudo começou em 2013, quando a Scope lançou um projeto, apoiado pelo governo escocês, para envolver as mulheres em atividades de conservação. Atualmente, duas mil já cultivam guggal, o que lhes permite melhorar a renda e garantir a segurança alimentar de todas as famílias.
“Pela primeira vez em muitos anos não tivemos que emigrar para ganhar a vida”, contou à IPS por telefone, de Sadhuraks, Resham Wirdho, uma mulher de 35 anos e sete filhos. A organização paga a cada família cerca de cem rúpias para cada planta. Com 500 em seu terreno de 0,40 hectare, ela ganha em torno de US$ 49 por mês. Somado ao salário de peão rural de seu marido, de aproximadamente US$ 68 mensais, ela já não precisa se preocupar com sua próxima refeição.
Com o excedente compram sementes para sua horta. “Este ano, pela primeira vez, dei aos meus filhos verduras frescas, em lugar de secas”, contou Wirdho entusiasmada. No ano passado, tampouco tiveram que comprar a crédito na loja local e puderam mandar o filho mais velho à escola secundária.
É um presente inesgotável, destacou Wirdho. Nos próximos três anos, cada arbusto vai gerar pelo menos US$ 5, o que representa ganho líquido de US$ 2,45 ao mês, uma quantia principesca para as famílias da região, que costumam ganhar entre US$ 78 e US$ 98 por mês. Além disso, a relação entre ela e seu marido também muda. “Ele me respeita mais, ajudar a regar e cuidar das plantas, e também colabora nas tarefas domésticas, algo que nunca havia feito”, contou.
Com 2015 se apresentando como ano crucial, com várias conferências internacionais previstas sobre mudança climática, muitos especialistas acreditam que é o momento de reduzir a vulnerabilidade das mulheres mediante sua inclusão no planejamento e nas políticas. Iniciativas como essa são muito necessárias em toda a região da Ásia meridional, onde vivem cerca de 1,6 bilhão de habitantes e as mulheres são a maioria dos 660 milhões de pessoas que vivem com menos de US$ 1,25 por dia.
Também representam a maior parte da mão de obra agrícola, por isso são suscetíveis à variabilidade climática e às mudanças nos ecossistemas. A região também é propensa a sofrer desastres naturais e, com a estimativa de que em 2050 haverá 2,2 bilhões de habitantes, os especialistas temem as consequências que podem ser causadas por um incidente menor nos setores mais vulneráveis, como as mulheres.
Um informe da Unidade de Inteligência da The EconomistÍndice de Resiliência das Mulheres na Ásia Meridional, concluiu que “os países (dessa região) não conseguem considerar a inclusão dos direitos das mulheres nos esforços de redução do risco de desastres nem na construção de resiliência”. Usando a referência do Japão, com orçamento para assistência 200 vezes maior do que o de Bangladesh, Índia ou Paquistão, o Índice mede a vulnerabilidade das mulheres a calamidades naturais, mudanças econômicas e conflitos.
Em uma crítica contundente de como são ignoradas as vozes femininas, o informe coloca o Paquistão no último lugar do Índice, abaixo de Bangladesh, Butão, Índia, Maldivas, Nepal e Sri Lanka. Nas quatro categorias consideradas para medir a resiliência das mulheres – economia, infraestrutura, institucional e social – o Paquistão figura em último lugar. Em indicadores como orçamento para assistência e acesso das mulheres a emprego e recursos econômicos, esse país fica abaixo de seus vizinhos.
O editor-responsável da Unidade de Inteligência da The Economist, David Line, destacou que “os países da Ásia meridional devem se dar conta da tremenda capacidade de liderança das mulheres no planejamento e na resposta aos desastres. Se situam na frente de luta e têm um conhecimento íntimo de suas comunidades. Um reconhecimento maior disto poderia ajudar muito a reduzir o risco de desastres e melhorar a resiliência das comunidades”.

Envolverde/IPS

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